"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 24 de abril de 2016

PALÁCIO DESERTO


O Brasil é um país pacífico, despreocupado e alienado de seus perigos. Nos últimos dias, o poder está vazio, a presidente viajou para Nova York com o objetivo de criticar seu próprio grupo político, apontar traidores e se colocar no papel de vítima da conspiração. O vice-presidente, Michel Temer, retornou de São Paulo para o Palácio do Jaburu. Nove ministérios não têm titulares.

Um espanto. Mas o Brasil funciona. Ninguém está muito preocupado porque esse ou aquele ministro deixou de aparecer nos jornais. Eles não fazem falta. E a presidente, que nos últimos dias promoveu comícios fechados dentro do Palácio, aproveita a que possivelmente será sua última viagem internacional para desfrutar das vantagens do cargo. Avião privado, cartão de despesas sem limite, e bons jantares. O pessoal do Itamaraty em Nova York entrou em pânico.

Nos Estados Unidos, o poder não fica vago nem um único minuto. São famosas as imagens do vice-presidente Lyndon Johnson, em 1963, jurando sobre a Bíblia para assumir o cargo de presidente dos Estados Unidos dentro do avião. A seu lado estava o cadáver ainda quente de John Kennedy assassinado no Texas. Jaqueline Kennedy assistiu à cena com o vestido manchado pelo sangue do marido. O poder não pode ficar vago. Alguém, sempre, tem que estar no comando. Não há vacância. Aqui, ao contrário, a presidente Dilma se transformou numa espécie de fantasma da política.

Ela não manda, não nomeia e poucos se dispõem a cumprir suas ordens. Ao contrário, os assessores arrumam gavetas e se preparam para o desembarque que, cedo ou tarde, vai acontecer. Os argumentos do poder são frágeis. Aliás, seu governo fez uma tortuosa política externa. Nunca tentou se aproximar do governo norte-americano. Mas no momento do perigo maior, ela correu para Nova York. Normal e natural seria ir para Caracas ou La Paz. Havana já não está disponível. Barack Obama chegou lá antes sob a proteção do papa Francisco, que é argentino. Se Evo Morales pretende invadir o Brasil para garantir o poder a Dilma Rousseff, o momento é agora. O país está sem governo.

Os argumentos que a presidente esgrime não apagam a realidade. O debate sobre o crime de responsabilidade durou quatro meses. As emissoras de televisão franquearam suas câmeras para acusação e defesa. Deputados foram chamados pelo Planalto, que deu todas as suas razões. O ministro José Eduardo Cardozo explicou na comissão e no plenário usando o tempo que quis. Concedeu seguidas entrevistas. Políticos, parlamentares, cidadãos, todos sabiam do que se tratava. As famosas pedaladas cometidas pela presidente Dilma.

O Supremo Tribunal Federal definiu o rito a ser percorrido pelo processo de impeachment. Determinou que o voto fosse aberto, como queria o governo federal. A Comissão Especial se formou. Presidente e relator foram escolhidos pelo voto. Todos os membros da Comissão avaliaram o relatório com ampla disponibilidade de tempo. Foi aprovado por 58,4% dos deputados. No plenário, os deputados aprovaram o documento com 71,5% dos votos.

Dilma realizou comícios no Palácio do Planalto exibidos pelos noticiários de televisão. Os líderes dos partidos do governo pediram 10 segundos para declarar o voto. Isso ajudaria a defesa do governo. Depois de 45 horas de discursos dos deputados, a votação foi precedida pela fala dos líderes para encaminhar a votação. A imprensa teve livre acesso a todos os capítulos dessa história. O contraditório foi garantido no plenário e nas ruas. Até a Esplanada dos Ministérios foi dividida em duas áreas distintas.

As citações de pais, mães, filhos, netos e outros parentes demonstram que a lembrança de familiares não era assunto sentimental no momento do voto. Os parlamentares se obrigaram a demonstrar para sua casa, e a seu eleitor, como estavam procedendo em Brasília. Telões foram colocados nas praças em todo o país, além de televisores nos bares e restaurantes. A audiência da TV Câmara explodiu.

A maioria dos deputados não estava falando para o plenário, mas para seus eleitores em suas cidades, bairros, ruas e residências. As eleições municipais serão realizadas em outubro próximo. E o prestígio do PT está abaixo do volume morto, na expressão do ex-presidente Lula. É esse é o ponto. Protestar em Nova York não muda em nada o andamento do processo. Exceto, é claro, no caso de uma eventual invasão do território nacional pelo exército boliviano.


24 de abril de 2016
Andre Gustavo Stumpf, Correio Braziliense

Nenhum comentário:

Postar um comentário