"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 13 de dezembro de 2015

DOIS PRA LÁ, DOIS PRA CÁ

Nesta semana, em Buenos Aires, Cristina Kirchner deixou de ser presidente, fazendo um papelão na saída. Em Caracas, a oposição ganhou a eleição legislativa e passou a controlar dois terços da Assembleia. O kirchnerismo e o chavismo sempre se definiram como esquerda e rotularam seus adversários como a direita. A verdade é que os dois foram incompetentes, e por isso estão sendo derrotados.

É uma simplificação definir o que se passa na Argentina e na Venezuela como a disputa entre os dois polos políticos tradicionais, esquerda e direita. Os dois governos cometeram os mesmos erros, em intensidade maior na Venezuela, e isso levou os dois países a terem hoje um quadro de inflação alta, crise cambial, recessão. Na política, houve pressão contra meios de comunicação e alteração de regras para favorecer os governantes.

Tudo foi muito mais longe na Venezuela. O governo chavista interferiu nas regras eleitorais, controlou o Conselho Nacional Eleitoral, aprovou mudança constitucional para se perpetuar no poder, nomeou militantes para a Suprema Corte, fechou rádios, televisões, jornais, prendeu opositores. Montou um sistema em que delegou poderes à Assembleia porque ela sempre referendava os atos do governo. O chavismo montou um sistema para ganhar sempre. Mesmo assim, a oposição ganhou depois de 16 anos, e o governo se vê agora ameaçado pelas próprias regras que criou. A dúvida é se um governo de índole autoritária conseguirá lidar com o poder conquistado nas urnas pela oposição. Na economia, o governo chavista foi um desastre, e o país está, neste momento, com inflação de 190%, segundo o FMI, e sofrendo uma profunda recessão de 10% do PIB.

A Argentina não foi tão longe na quebra das regras democráticas, mas também demonstrou a mesma incompetência econômica. O governo manipulou os dados econômicos, interferiu na economia, deixou a inflação subir. O presidente, Maurício Macri, assumiu na quinta-feira numa cerimônia marcada pela patética ausência da ex-presidente que se negou a entregar a faixa. Isso certamente é a menor das preocupações de Macri, que recebe o governo com uma lista de tarefas difíceis.

A consultoria inglesa Capital Economics listou 10 medidas que precisam ser adotadas pelo novo governo argentino. O Banco Central perdeu independência no combate à inflação e precisa novamente ter autonomia para subir os juros; há uma lista de 500 produtos com preços congelados; subsídios na energia elétrica e no setor de transportes. O gasto público com despesas sociais cresceu muito acima da capacidade de arrecadação e produziu um forte déficit no Orçamento.

A cotação do peso em relação ao dólar passou a ser controlada. Há, na verdade, várias cotações, e os economistas calculam que será necessária uma desvalorização de 40% da moeda, o que pressionará ainda mais a inflação.

O novo governo precisa entrar em acordo com os credores da dívida, para voltar a acessar os mercados de crédito internacionais. Sem isso, a atual crise cambial não será superada. O governo kirchner tributou exportação e acabou atingindo o setor mais dinâmico da economia. A venda externa de soja, por exemplo, tem 30% de imposto, a de milho, 25%, e a de trigo, 20%.

A crise cambial também levou o governo a aumentar as barreiras de importação. Empresários perderam competitividade porque passaram a ter mais dificuldade de conseguir peças e outros insumos para a produção. A confiança na economia caiu, e os investimentos encolheram. Tanto as empresas quanto os consumidores precisam de autorização para comprar dólares e importar.

Por fim, terá que restaurar os indicadores divulgados pelo Indec, que sofreu intervenção no governo Kirchner. Voltar a ter números oficiais confiáveis é essencial para que os argentinos sejam respeitados nos mercados. Macri, no discurso de posse, falou sobre a necessidade da busca da verdade estatística.

A derrota eleitoral do kirchnerismo e do chavismo não se deve às suas políticas sociais, mas sim à incompetência administrativa. Além disso, a Argentina quis se livrar do personalismo da ex-presidente; a Venezuela mostrou rejeição ao caudilhismo chavista. Em outros países da região há a mesma tendência de recobrir com um discurso de esquerda o que é simplesmente a adoção de políticas equivocadas.

13 de dezembro de 2015
Miriam Leitão

Nenhum comentário:

Postar um comentário