Medidas de crédito tentam ativar o consumo, quando o melhor caminho são os investimentos. Mas a baixa confiabilidade do governo afugenta empresários
As turbulências econômicas mundiais aos poucos deixaram de servir de álibi para os problemas da economia brasileira, num dos ciclos de crescimento médio mais baixos da história. Tanto que, se o PIB evoluir próximo do 1,5%, a gestão da presidente Dilma estará, sob este critério, entre as piores da República, na companhia dos governos Floriano Peixoto e Collor.
A expectativa atual dos analistas do mercado financeiro é de um índice mais baixo, pouco acima de 1%. O próprio governo, em relatório do Ministério do Planejamento, reduziu de 2,5% para 1,8% a estimativa de expansão do PIB este ano.
Enquanto isso, a economia americana continua em trajetória de recuperação, e deve obter em 2014 um resultado melhor que a brasileira, mais próximo dos 2%. Já a economia europeia apresenta um cenário diversificado, com alguns países melhores e outros piores, mas num quadro diferente daquele de terra arrasada de há dois anos.
Confirma-se o que já se sabia: as causas das dificuldades da economia brasileira são internas. Na manhã de ontem, o Banco Central desembrulhou um minipacote para tentar ativar o crédito. Estabelecido em ata do Copom que não se cortam os juros neste momento de inflação nas alturas (pouco acima de 6,5%, limite superior da meta), o governo tenta induzir o mercado financeiro a elevar a oferta de crédito. Com alterações na remuneração dos depósitos compulsórios de bancos e redução de exigências para a cessão de empréstimos, o governo espera colocar mais R$ 45 bilhões disponíveis para créditos.
O principal objetivo é reativar as vendas de veículos, afetadas pela crise argentina e pela retração mesmo do mercado interno: em junho, a produção do setor automobilístico caiu 23%; e estima-se uma queda de 10% este ano, mesmo mantido o IPI reduzido.
Não há muito otimismo com as medidas. Afinal, a via do consumo tem sido tentada sem maiores êxitos, para relançar a economia. A fórmula se esgotou, diz-se há tempos, mas o Planalto persiste. Talvez devido à proximidade das eleições, para as quais todas as cartas parecem já ter sido dadas no que se refere à economia.
No caso dos veículos, a redução do IPI teria funcionado como grande indutor de antecipação de consumo: proprietários se aproveitaram do incentivo e anteciparam trocas. Assim, com o tempo, o corte do imposto tende a perder a eficácia.
Há, ainda, a baixa confiabilidade na política econômica, causa da retração de investimentos, fator que precisa substituir o consumo como força de tração do crescimento. E a inflação, o efeito do baixo crescimento no mercado de trabalho e o próprio nível de endividamento das famílias reduzem o ímpeto da ida às compras. Não são risonhas as perspectivas.
29 de julho de 2014
Editorial O Globo
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