Enquanto alguns candidatos declaram pobreza absoluta à Justiça Eleitoral, outros informam a posse de recursos que não existem
O contribuinte meticuloso, que nada tem a esconder do fisco, além de eventuais patrimônios imobiliários, veículo ou mesmo títulos de clubes, anota também até mesmo centavos que tinha depositados em conta bancária na declaração anual de bens para fins do Imposto de Renda. Supõe-se, portanto, que há algo de estranho quando contribuintes não dão conhecimento à Receita de que guardam patrimônio monetário – isto é, dinheiro – debaixo do colchão ou atrás do armário. Ou, ao contrário, confessam à Receita ter um dinheiro que de fato não possuem.
O tema vem à discussão quando se descobre – conforme reportagens que a Gazeta do Povo publicou nesta semana – que não poucos candidatos às eleições de outubro informaram à Justiça Eleitoral que dispõem de dinheiro vivo, em casa. As informações enviadas pelo candidato ao TRE se baseiam nas declarações de bens e renda que entregaram à Receita Federal no último exercício. Fossem pequenas as importâncias escondidas debaixo do colchão, nada a estranhar – mas alguns candidatos chegaram a mencionar valores em espécie de até R$ 800 mil.
No mundo atual, em que os bancos são o lugar mais seguro para guardar as economias e as casas certamente não são fortalezas invulneráveis a assaltos, não parece ser uma medida sensata mantê-las no quarto ou na sala de visitas. Mas uma declaração dada ao jornal permite levantar a suspeita de que alguns outros candidatos escondem mais do que dinheiro – escondem também uma esperteza que lhes servirá, na futura prestação de contas à Justiça Eleitoral, para burlar a lei que lhes proíbe fazer uso de “caixa dois”. Procurado pela reportagem deste jornal, um dos candidatos que revelaram ter dinheiro vivo em casa apresentou uma singela explicação: de fato, ele não tem o dinheiro; trata-se de uma ficção que servirá para justificar os gastos de campanha. Em outras palavras, ele não precisará informar à Justiça Eleitoral os nomes de quem lhe fez doações. E isso é bom para os dois lados.
Não é crime guardar dinheiro na gaveta em vez de levá-lo ao banco ou de aplicá-lo numa (não tão rentável, nos dias que correm) poupança. Não se comete também nenhum delito ao declarar a existência de valores monetários ao Imposto de Renda, desde que se comprove que a origem do dinheiro é lícita e compatível com seus ganhos. O problema está – conforme confessado por um dos entrevistados pela Gazeta – em declarar à Receita um dinheiro de ficção com propósitos indeclaráveis.
O contrário também é preocupante. Há candidatos que apresentam atestados de pobreza que dariam inveja a um São Francisco de Assis, muito embora na vida cotidiana mostrem sinais de levá-la com conforto – certamente porque, previdentes, seus bens e rendas encontram-se em nome de outras pessoas.
A quem esses candidatos pretendem enganar fazendo de suas declarações de bens peças de ficção, seja atestando uma pobreza absoluta que não vivem, seja declarando dinheiro que não têm? Se já de saída alguns postulantes a cargos públicos eleitorais recorrem a possíveis engodos contábeis, o que esperar deles no exercício do mandato? Seria o caso de pedir mais fiscalização? Mais rigor da Justiça Eleitoral? Leis ainda mais restritivas do que as que já existem? Nada disso seria totalmente eficaz, como já deixou entrever a Lei da Ficha Limpa, tida por um instante como a panaceia milagrosa que nos livraria dos maus políticos.
O meio eficaz para restaurar a ética (ou, no mínimo, a sinceridade dos candidatos) repousa talvez numa utopia: que todos sejam honestos. Mas também numa verdadeira reforma político-eleitoral que torne as campanhas menos dispendiosas e mais transparentes, de modo que o voto reproduza os valores éticos pelos quais anseia a maioria do eleitorado.
O contribuinte meticuloso, que nada tem a esconder do fisco, além de eventuais patrimônios imobiliários, veículo ou mesmo títulos de clubes, anota também até mesmo centavos que tinha depositados em conta bancária na declaração anual de bens para fins do Imposto de Renda. Supõe-se, portanto, que há algo de estranho quando contribuintes não dão conhecimento à Receita de que guardam patrimônio monetário – isto é, dinheiro – debaixo do colchão ou atrás do armário. Ou, ao contrário, confessam à Receita ter um dinheiro que de fato não possuem.
O tema vem à discussão quando se descobre – conforme reportagens que a Gazeta do Povo publicou nesta semana – que não poucos candidatos às eleições de outubro informaram à Justiça Eleitoral que dispõem de dinheiro vivo, em casa. As informações enviadas pelo candidato ao TRE se baseiam nas declarações de bens e renda que entregaram à Receita Federal no último exercício. Fossem pequenas as importâncias escondidas debaixo do colchão, nada a estranhar – mas alguns candidatos chegaram a mencionar valores em espécie de até R$ 800 mil.
No mundo atual, em que os bancos são o lugar mais seguro para guardar as economias e as casas certamente não são fortalezas invulneráveis a assaltos, não parece ser uma medida sensata mantê-las no quarto ou na sala de visitas. Mas uma declaração dada ao jornal permite levantar a suspeita de que alguns outros candidatos escondem mais do que dinheiro – escondem também uma esperteza que lhes servirá, na futura prestação de contas à Justiça Eleitoral, para burlar a lei que lhes proíbe fazer uso de “caixa dois”. Procurado pela reportagem deste jornal, um dos candidatos que revelaram ter dinheiro vivo em casa apresentou uma singela explicação: de fato, ele não tem o dinheiro; trata-se de uma ficção que servirá para justificar os gastos de campanha. Em outras palavras, ele não precisará informar à Justiça Eleitoral os nomes de quem lhe fez doações. E isso é bom para os dois lados.
Não é crime guardar dinheiro na gaveta em vez de levá-lo ao banco ou de aplicá-lo numa (não tão rentável, nos dias que correm) poupança. Não se comete também nenhum delito ao declarar a existência de valores monetários ao Imposto de Renda, desde que se comprove que a origem do dinheiro é lícita e compatível com seus ganhos. O problema está – conforme confessado por um dos entrevistados pela Gazeta – em declarar à Receita um dinheiro de ficção com propósitos indeclaráveis.
O contrário também é preocupante. Há candidatos que apresentam atestados de pobreza que dariam inveja a um São Francisco de Assis, muito embora na vida cotidiana mostrem sinais de levá-la com conforto – certamente porque, previdentes, seus bens e rendas encontram-se em nome de outras pessoas.
A quem esses candidatos pretendem enganar fazendo de suas declarações de bens peças de ficção, seja atestando uma pobreza absoluta que não vivem, seja declarando dinheiro que não têm? Se já de saída alguns postulantes a cargos públicos eleitorais recorrem a possíveis engodos contábeis, o que esperar deles no exercício do mandato? Seria o caso de pedir mais fiscalização? Mais rigor da Justiça Eleitoral? Leis ainda mais restritivas do que as que já existem? Nada disso seria totalmente eficaz, como já deixou entrever a Lei da Ficha Limpa, tida por um instante como a panaceia milagrosa que nos livraria dos maus políticos.
O meio eficaz para restaurar a ética (ou, no mínimo, a sinceridade dos candidatos) repousa talvez numa utopia: que todos sejam honestos. Mas também numa verdadeira reforma político-eleitoral que torne as campanhas menos dispendiosas e mais transparentes, de modo que o voto reproduza os valores éticos pelos quais anseia a maioria do eleitorado.
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