"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 4 de maio de 2014

PARA SEMPRE, LACERDA

Artigos - Cultura 
Carlos Lacerda foi expulso pelos comunistas e cassado pelo militares, mas seu espírito incontrolável e sua oratória demolidora marcaram a política brasileira por décadas.

Há 100 anos, no dia 30 de abril de 1914, nascia no Rio de Janeiro (registrado em Vassouras, no interior do estado) o jornalista, escritor e político Carlos Frederico Werneck de Lacerda, um dos principais personagens da história do Brasil, que morreu prematuramente, aos 63 anos, em 1977.
 
Seu nome foi uma homenagem da família comunista à Karl Marx (Carlos) e Friedrich Engels (Frederico), por mais surpreendente que possa parecer, já que é o mais notório anticomunista do país.
Ele também se opôs ao nacionalismo “desenvolvimentista” do getulismo, de inspiração fascista, que com o comunismo fazem as duas nefastas correntes de pensamento ideológicas majoritárias do Brasil até hoje, um país incapaz de conceber uma terceira via liberal-conservadora.
 
Carlos Lacerda surgiu no cenário político nacional em 1935, aos 21 anos, já um orador brilhante, carismático e arrebatador, no evento de lançamento da ANL (Aliança Nacional Libertadora), entidade ligada ao PCB (Partido Comunista Brasileiro) e obediente aos ditames de Moscou via Comintern. Nesse dia, o estudante Carlos Lacerda foi escolhido para ler o manifesto e pedir que Luís Carlos Prestes, que estava na URSS, fosse aclamado como presidente de honra da ANL.
 
Seu rompimento com o movimento comunista viria em 1939, expurgado do partido por um texto escrito por ele sob encomenda tratando da “vitória” do getulismo sobre o comunismo. Ele trabalhava numa revista que publicou uma série de artigos comemorativos do primeiro aniversário do Estado Novo de 1937 por encomenda do DNP, depois batizado de DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), e a Lacerda foi pedido o texto sobre o comunismo.
 
Obediente e precavido, consultou oficialmente o partido e, por tabela, Moscou, para saber se aceitava a tarefa e como deveria proceder. Foi orientado a escrever a matéria passando a idéia de que a Intentona Comunista foi algo isolado, de um punhado de doidos conspiradores, a maioria já cassados e presos, e sem qualquer articulação com o comunismo internacional.
Cumpriu as ordens mas foi demonizado pelos comunistas brasileiros e chutado para fora do movimento, um choque do qual demorou anos para superar.
 
Nos anos 40 entra para a UDN. Em 1947 é eleito vereador e começa oficialmente a carreira como político. Lacerda se tornaria o maior opositor à volta de Getúlio Vargas ao cargo de presidente e começava o caminho que depois viria a associar seu nome ao “derrubador de presidentes”.
 
Sua oposição a Getúlio Vargas terminou, numa série estonteante de eventos em três semanas de agosto de 1954, com o suicídio do presidente, o que fez com que se refugiasse, ironicamente e por alguns dias, em Cuba – pouco antes de virar o zoológico dos irmãos Castro, claro.
 
De volta ao Brasil, foi a principal pedra no sapato de Juscelino Kubitschek e o grande cabo eleitoral de Jânio Quadros em 1960. No final dos anos 60, ao se tornar amigo e correligionário de Juscelino na Frente Ampla, perguntou ao ex-presidente porque nunca permitiu que tivesse uma concessão de TV e JK respondeu: “se eu te desse um canal de TV você me derrubaria”.
 
Conspirou contra Jango, apoiou a revolução de 1964 e depois foi cassado por ela, quando era o político mais popular do Brasil e o mais provável vencedor numa eleição presidencial prometida por Castello Branco que nunca aconteceu, quando os militares deram o golpe dentro do golpe e se encastelaram no poder até 1985, manchando para sempre a imagem do regime que livrou o país do caos instaurado pelo errático, incompetente, inconsequente e radical governo de João Goulart.
 
Como governador da Guanabara (1960-1965), foi um revolucionário em métodos de gestão, no estabelecimento de metas e em resultados que transformaram para sempre a atual cidade do Rio de Janeiro.
Difícil imaginar um administrador público republicano com uma história de tamanha competência, trabalho duro e um legado de realizações no Brasil como ele.
 
Quem é do Rio de Janeiro ou vive na cidade deveria agradecer todos os dias a quem fez a adutora do Rio Guandú, que acabou com o crônico problema de falta d’água da cidade, mas não só: o governo Lacerda está em quase todo lugar, como na criação do túnel Rebouças, no alargamento da praia de Copacabana e no plano diretor que idealizou a Linha Vernelha e a Linha Amarela, esta última merecidamente batizada com seu nome.
 
Além de todas essas facetas, era também um intelectual de primeiro time, tendo criado a Editora Nova Fronteira, uma das mais conhecidas do mercado editorial do país até hoje. É também tio-avô de Marcio Lacerda, atual prefeito de Belo Horizonte (antes que me perguntem, não estou nem aí para os boatos sobre seu bissexualismo, seu caso com a atriz Shirley MacLaine, irmã de Warren Beatty, entre outras fofocas de alcova).
 
Carlos Lacerda foi expulso pelos comunistas e cassado pelo militares, mas seu espírito incontrolável e sua oratória demolidora marcaram a política brasileira por décadas. Sua intolerância com a corrupção, com a mediocridade, sua recusa em negociar princípios por cálculos políticos e arranjos fisiológicos, sua coragem e seu carisma tornaram Carlos Lacerda uma das figuras mais hipnotizantes da história do Brasil.

04 de maio de 2014
Alexandre Borges é diretor do Instituto Liberal.
in Reacionaria

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