Há 48 horas Lula e Dilma exterminam sofás e mensageiros
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez, com entrevista por ele armada, uma intervenção geral no governo, no PT e na campanha eleitoral, acertada no sábado com a presidente Dilma Rousseff. Uma tentativa de redirecionar os fatos negativos que solapam a popularidade da candidata à reeleição, do partido e a sua própria, dificultando-lhe a vida quando vier a assumir a troca de posição.
Seus recados principais: O candidato do PT a presidente não é ele, é ela (diz-se que Dilma está a cada dia mais resistente à ideia da renúncia, poderia ter dito Lula); é preciso enterrar a CPI da Petrobras, pois quem gosta de CPI é oposição (e esta pegaria os negócios da Petrobras em seus dois governos, inclusive os feitos com Hugo Chávez, poderia também ter dito); o governo tem que retomar com vigor o projeto de controle da mídia (já histórica pressão do PT sobre a imprensa, campanha antes liderada pelo defenestrado deputado André Vargas, que ganha peso na voz de Lula).
Com outras palavras, Dilma vocalizou o combinado em discurso em Minas Gerais, na véspera. Teve, pelo menos, a precedência. A estratégia toda ao melhor estilo dos ditos populares, de matar o mensageiro da má notícia, de tirar o sofá da sala.
Uma ação orquestrada pelo marketing, uma reação à crise grave, que se amplia a cada dia, por intermédio do discurso. Tudo o que os manuais políticos diriam que não funciona na instabilidade política provocada por fatos, principalmente fatos. E pela reação a eles dentro do próprio governo e dos partidos divididos sobre como sair do impasse.
A última pesquisa de intenção de voto e aprovação do governo, do Datafolha, acusou queda dos índices da presidente candidata à reeleição e foi isso que fez soar o alarme que moveu criador e criatura. A pesquisa revelou que os adversários da presidente não ganharam o que ela perdeu, mas 72% dos eleitores consultados disseram querer mudanças. Só a primeira parte foi considerada por Lula, Dilma e o PT. A segunda constatação, aparentemente contraditória com a primeira, não mereceu conveniente atenção.
O cientista político e sociólogo Antonio Lavareda, especialista em leitura de pesquisas de opinião, recorre a uma comparação didática entre produtos de consumo e mercado eleitoral para explicar sobre o que falam os três quartos do eleitorado que desejam mudança e porque não sobem os índices dos que a representam.
Diz que, no mercado, quem comanda o processo é a demanda. Faz um paralelo: na abertura econômica dos anos 90, os consumidores brasileiros estavam em absoluta maioria insatisfeitos com os automóveis disponíveis, os tradicionais de todos conhecidos, chamados de "carroças" nos palanques. Queriam mudança do padrão.
A demanda, portanto, era por mudança, e não por uma marca específica de automóvel, que o consumidor sequer conhecia ainda. O mercado se abriu, as marcas novas se apresentaram, o mercado percebeu a nova oferta e passou a consumi-la.
Voltando ao outro segmento do paralelo, retoma-se o Datafolha. Ou o sentimento de mudança, expresso por 72% do eleitorado, cede lugar ao de continuidade (é difícil, mas não impossível) ou a cada pesquisa as intenções de voto nos oponentes de Dilma marcharão ao encontro da demanda por mudança (mais lentamente agora, mais rapidamente na campanha eleitoral aguda).
Voltando às carroças: as marcas tradicionais continuaram a existir, algumas permaneceram na liderança, mas tiveram que fazer alterações objetivas nos seus produtos.
Para Dilma, não resolve mudar o marketing, é preciso mudar o governo. Para Lula, também, não basta retomar o discurso de outras campanhas, é preciso conseguir que Dilma faça a mudança que três quartos do eleitorado pedem. Senão, nem sua própria candidatura, quando se apresentar, se a avaliação em junho mostrar que Dilma continua mal na aceitação do eleitorado, ficará incólume. Lula, portanto, esta cuidando da própria pele quando executa um script como o de ontem.
Da mesma maneira que Lula afirma que CPI serve apenas à oposição e não a governos (esquecendo-se que foi ele próprio quem acionou a turbina da inútil CPI do Cachoeira para concorrer com o julgamento do mensalão), cartas aos brasileiros também se prestam a quem está na oposição, não em governo. O que Lula e Dilma estão fazendo, há 48 horas, é declaração de intenção, é transferência de culpa, é marketing.
Resta à presidente mudar o governo para diminuir a demanda por mudança na eleição. Em algum momento, se não o fizer, seus adversários, quando conhecidos, passarão a ser alternativa.
Também se pode constatar alguns mitos permitidos por leitura superficial dos números: a troca de Eduardo Campos por Marina, na chapa do PSB, é um desejo do PT, para instalar também entre os adversários o desconforto da divisão e da indefinição do candidato. Como fato, porém, está fora de cogitação. Marina cresceu mais, Campos menos, mas cresceu. Entretanto, não há dúvida que ela está batendo no teto do recall e do eleitorado cativo, e ele tem campo indefinido para crescer. Na perspectiva da política, acredita-se que a inversão só fará a chapa estacionar definitivamente nos índices obtidos por Marina, uma candidata que restringe seu eleitorado, não o contrário.
E os dois cresceram à revelia do breve contra a luxúria eleitoral representado pela cena da propaganda do partido, em que ambos conversam em um cenário pastel, tensos e de cara amarrada, sobre o tema do desenvolvimento sustentável.
Ideia do marqueteiro argentino dos socialistas, amigo do marqueteiro argentino do candidato do PSDB, Aécio Neves? Talvez, eles trocam figurinhas, dizem no interior das campanhas. Mas seguramente, até pelo perfil do personagem principal, as inserções de Aécio, proximamente no ar, terão mais cor e apelo eleitoral.
Uma razão de a presidente Dilma ter puxado para si a crise dos negócios mal feitos da Petrobras, ao redigir nota em que justifica ter assinado a proposta com desconhecimento de suas cláusulas, pode estar no andamento do processo no Tribunal de Contas da União. Culpar apenas um diretor e livrar a si e ao Conselho Diretor da responsabilidade é antídoto à tomada de depoimento e punições que podem vir do TCU no momento em que declarar o negócio lesivo aos cofres públicos. Como apontou o dedo da presidente, na mira só pode ficar Nestor Cerveró. No máximo coadjuvado por Sérgio Gabrielli.
Seus recados principais: O candidato do PT a presidente não é ele, é ela (diz-se que Dilma está a cada dia mais resistente à ideia da renúncia, poderia ter dito Lula); é preciso enterrar a CPI da Petrobras, pois quem gosta de CPI é oposição (e esta pegaria os negócios da Petrobras em seus dois governos, inclusive os feitos com Hugo Chávez, poderia também ter dito); o governo tem que retomar com vigor o projeto de controle da mídia (já histórica pressão do PT sobre a imprensa, campanha antes liderada pelo defenestrado deputado André Vargas, que ganha peso na voz de Lula).
Com outras palavras, Dilma vocalizou o combinado em discurso em Minas Gerais, na véspera. Teve, pelo menos, a precedência. A estratégia toda ao melhor estilo dos ditos populares, de matar o mensageiro da má notícia, de tirar o sofá da sala.
Uma ação orquestrada pelo marketing, uma reação à crise grave, que se amplia a cada dia, por intermédio do discurso. Tudo o que os manuais políticos diriam que não funciona na instabilidade política provocada por fatos, principalmente fatos. E pela reação a eles dentro do próprio governo e dos partidos divididos sobre como sair do impasse.
A última pesquisa de intenção de voto e aprovação do governo, do Datafolha, acusou queda dos índices da presidente candidata à reeleição e foi isso que fez soar o alarme que moveu criador e criatura. A pesquisa revelou que os adversários da presidente não ganharam o que ela perdeu, mas 72% dos eleitores consultados disseram querer mudanças. Só a primeira parte foi considerada por Lula, Dilma e o PT. A segunda constatação, aparentemente contraditória com a primeira, não mereceu conveniente atenção.
O cientista político e sociólogo Antonio Lavareda, especialista em leitura de pesquisas de opinião, recorre a uma comparação didática entre produtos de consumo e mercado eleitoral para explicar sobre o que falam os três quartos do eleitorado que desejam mudança e porque não sobem os índices dos que a representam.
Diz que, no mercado, quem comanda o processo é a demanda. Faz um paralelo: na abertura econômica dos anos 90, os consumidores brasileiros estavam em absoluta maioria insatisfeitos com os automóveis disponíveis, os tradicionais de todos conhecidos, chamados de "carroças" nos palanques. Queriam mudança do padrão.
A demanda, portanto, era por mudança, e não por uma marca específica de automóvel, que o consumidor sequer conhecia ainda. O mercado se abriu, as marcas novas se apresentaram, o mercado percebeu a nova oferta e passou a consumi-la.
Voltando ao outro segmento do paralelo, retoma-se o Datafolha. Ou o sentimento de mudança, expresso por 72% do eleitorado, cede lugar ao de continuidade (é difícil, mas não impossível) ou a cada pesquisa as intenções de voto nos oponentes de Dilma marcharão ao encontro da demanda por mudança (mais lentamente agora, mais rapidamente na campanha eleitoral aguda).
Voltando às carroças: as marcas tradicionais continuaram a existir, algumas permaneceram na liderança, mas tiveram que fazer alterações objetivas nos seus produtos.
Para Dilma, não resolve mudar o marketing, é preciso mudar o governo. Para Lula, também, não basta retomar o discurso de outras campanhas, é preciso conseguir que Dilma faça a mudança que três quartos do eleitorado pedem. Senão, nem sua própria candidatura, quando se apresentar, se a avaliação em junho mostrar que Dilma continua mal na aceitação do eleitorado, ficará incólume. Lula, portanto, esta cuidando da própria pele quando executa um script como o de ontem.
Da mesma maneira que Lula afirma que CPI serve apenas à oposição e não a governos (esquecendo-se que foi ele próprio quem acionou a turbina da inútil CPI do Cachoeira para concorrer com o julgamento do mensalão), cartas aos brasileiros também se prestam a quem está na oposição, não em governo. O que Lula e Dilma estão fazendo, há 48 horas, é declaração de intenção, é transferência de culpa, é marketing.
Resta à presidente mudar o governo para diminuir a demanda por mudança na eleição. Em algum momento, se não o fizer, seus adversários, quando conhecidos, passarão a ser alternativa.
Também se pode constatar alguns mitos permitidos por leitura superficial dos números: a troca de Eduardo Campos por Marina, na chapa do PSB, é um desejo do PT, para instalar também entre os adversários o desconforto da divisão e da indefinição do candidato. Como fato, porém, está fora de cogitação. Marina cresceu mais, Campos menos, mas cresceu. Entretanto, não há dúvida que ela está batendo no teto do recall e do eleitorado cativo, e ele tem campo indefinido para crescer. Na perspectiva da política, acredita-se que a inversão só fará a chapa estacionar definitivamente nos índices obtidos por Marina, uma candidata que restringe seu eleitorado, não o contrário.
E os dois cresceram à revelia do breve contra a luxúria eleitoral representado pela cena da propaganda do partido, em que ambos conversam em um cenário pastel, tensos e de cara amarrada, sobre o tema do desenvolvimento sustentável.
Ideia do marqueteiro argentino dos socialistas, amigo do marqueteiro argentino do candidato do PSDB, Aécio Neves? Talvez, eles trocam figurinhas, dizem no interior das campanhas. Mas seguramente, até pelo perfil do personagem principal, as inserções de Aécio, proximamente no ar, terão mais cor e apelo eleitoral.
Uma razão de a presidente Dilma ter puxado para si a crise dos negócios mal feitos da Petrobras, ao redigir nota em que justifica ter assinado a proposta com desconhecimento de suas cláusulas, pode estar no andamento do processo no Tribunal de Contas da União. Culpar apenas um diretor e livrar a si e ao Conselho Diretor da responsabilidade é antídoto à tomada de depoimento e punições que podem vir do TCU no momento em que declarar o negócio lesivo aos cofres públicos. Como apontou o dedo da presidente, na mira só pode ficar Nestor Cerveró. No máximo coadjuvado por Sérgio Gabrielli.
12 de abril de 2014
Rosângela Bittar, Valor Econômico
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