Imprensa não pode se limitar ao mero registro; tem o compromisso com a verdade
O espetáculo de desinformação continua. Os respectivos presidentes de duas associações de juízes vieram a público para, claro!, atacar Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal.
Virou moda. Isso demonstra, diga-se desde logo, o poder que tem o PT de pautar não apenas a imprensa, mas também as entidades profissionais e corporações.
Estão descontentes com o ministro porque ele decidiu trocar o juiz da execução das penas dos mensaleiros. Ademar Vasconcelos foi substituído por Bruno André da Silva Ribeiro. Pois é…
Nesta manhã escrevi um post afirmando que era impossível debater com os cronistas que chamei de “babás de mensaleiros” porque argumentam com exclamações, não com fatos e leis. É grave? É grave porque isso concorre para a desinformação do leitor comum e porque atuam como militantes de uma causa, não como analistas.
Mas há coisa pior: quando juízes vêm a público para acusar o presidente do STF de desrespeitar a lei e a independência do Judiciário sem, no entanto, apontar onde está essa agressão legal, aí, no que concerne ao direito, estamos no pior dos mundos. Afinal de contas, jornalistas têm, no máximo, opiniões; já os juízes têm um amplo poder de decisão sobre a vida de terceiros. Vamos ver.
João Ricardo dos Santos Costa, presidente eleito da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), mandou ver, tentando recorrer à ironia: “Pelo menos na Constituição que eu tenho aqui em casa, não diz que o presidente do Supremo pode trocar juiz, em qualquer momento, num canetaço”. Pois é… Se o doutor me enviar o endereço, eu lhe mando de presente um exemplar da Constituição. Pode ser que alguém tenha arrancado uma página do seu livrinho para anotar um número de telefone ou, sei lá, fazer a lista do supermercado.
Também não poderia faltar ao equívoco a organização de ultraesquerda chamada “Juízes para a Democracia”. Sua “presidenta” (assim ela se assina), Kenarik Boujikian, também emitiu uma nota sobre o assunto.
O texto é escandaloso, digno de uma associação que já declarou com todas as letras que existem, sim, homens que estão acima da lei. A excelentíssima manifesta a sua “preocupação com noticias que veiculam que o Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, estaria fazendo pressão para a troca de juízes de execução criminal”.
Notem: ela não acusa Barbosa de ter feito isso; ela só está preocupada com “com as notícias” de que ele o teria feito. Notícias? Não! Essa é uma acusação feita pelo PT e por seus vândalos da reputação alheia nas redes sociais. E Kenarik quer o quê?
Ela esclarece: “O presidente do STF tem a obrigação de prestar imediato esclarecimento à população sobre o ocorrido, negando o fato, espera-se, sob pena de estar sujeito à sanção equivalente ao abuso que tal ação representa.”
ENTENDI: A PRESIDENTE DE UMA ASSOCIAÇÃO DE JUÍZES EXIGE QUE O PRESIDENTE DO STF PROVE SER INOCENTE, EMBORA ELA SEJA INCAPAZ DE APONTAR QUE TRANSGRESSÃO ELE TERIA COMETIDO.
Vergonha
Vergonha alheia, é o que sinto — e ela se estende, em certa medida, à imprensa. O leitor, o telespectador, o ouvinte e o internauta não poderiam fica expostos a esse tipo de guerra suja da informação. Entendo que é obrigação profissional e moral dos jornalistas informar os fatos.
Da Constituição que tenho em casa — e que você tem aí ao alcance de sua tela, leitor amigo, consta, atenção, as Alínea b e m do Inciso I do Artigo 102 da Constituição — aquele que foi rasgado do exemplar da Carta que o presidente da AMB tem em casa. Lá está escrito:
“Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I – processar e julgar, originariamente:
(…)b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;
m) a execução de sentença nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atribuições para a prática de atos processuais;
Atenção!
A competência para a execução das penas dos condenados pelo Supremo é do… próprio Supremo. O tribunal delega isso a outro juiz, por meio de um ato chamado “ordinatório”, se ele quiser — e só se ele quiser. Barbosa poderia ter tomado para si tal função porque é dele desde sempre. O juiz que atua no caso age por sua delegação.
O presidente do Supremo não poderia estar a solapar a autoridade, a independência ou a competência de juiz nenhum porque estas lhe pertencem, nesse caso, “ad nutum”. Portanto, ele as atribui a um outro juiz se e quando quiser. E também substitui aquele que atua por sua exclusiva delegação quando quiser.
Não, senhores! Nem o presidente da AMB nem a “presidenta” da AJD dizem qual dispositivo legal Barbosa violou. Não são bestas nem nada, não é? Ficam no simples proselitismo. Isso alimenta a gritaria nas redes sociais.
É interessante como a AMB e a AJD, que não rezam exatamente pela mesma cartilha, se unem nesse caso, não é? A segunda atua movida por uma pauta que é de caráter ideológico. O grupo tem uma visão bastante heterodoxa do que seja “direito”.
A AJD já defendeu vários movimentos que afrontam claramente a legalidade na suposição de que a “democracia real” (a pauta dos chamados “movimentos sociais”) entra mesmo em choque com o que chamam por lá de “democracia formal”.
Em suma: a AJD não vê mal nenhum em que se atropelem leis democraticamente instituídas se o motivo for “justo”. Só para vocês terem uma ideia, essa associação é contra a aprovação no Brasil de uma lei de combate ao terrorismo.
O problema da AMB com Barbosa é de outra natureza. O ministro de opôs, e por bons motivos, à criação de cinco novos Tribunais Regionais Federais, uma reivindicação de caráter puramente corporativo.
Ainda que eu possa achar estranho que juízes pertençam a sindicatos — afinal, como ser independente e integrar uma grei corporativa? —, vá lá que protestem contra isso e aquilo. O que é inaceitável, acho eu, é que venham a público acusar o ministro do Supremo de ter transgredido a lei quando resta evidente que isso não aconteceu.
No fim das contas, o que muita gente está a recusar no Brasil é mesmo o estado de direito — a menos que me provem que a execução da pena não é de competência do próprio Supremo, podendo ou não ser delegada. Que os partidários do PT estejam nessa, dá para compreender, embora não dê para endossar. Que juízes participem dessa pantomima, aí é demais.
Mas o blog está aqui: se o doutor Santos Costa e a doutora Kenarik quiserem provar que estou errado, lerei a argumentação com todo cuidado. Se não conseguirem, então acho que é o caso de ambos pedirem desculpas. Os brasileiros merecem a verdade, não?
25 de novembro de 2013
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