Os doleiros Vinicius Claret e Cláudio Barbosa firmaram um acordo com a força tarefa da Lava Jato do Rio de Janeiro, através do qual vão dar aulas sobre suas técnicas que asseguraram fraudes cambiais em série por vários anos. Reportagem de Chico Otávio e Daniel Biasetto, edição de ontem de O Globo, destaca tanto o conteúdo quanto a essência do acordo. Através desse acordo, os doleiros vão transmitir seus conhecimentos a integrantes da Procuradoria Geral da República. Serão seis anos de 200 aulas por período, o que totaliza 1.200 sessões. A informação pode parecer parte de uma comédia, mas não é nada disso. É inspirada em experiências internacionais.
Só que no caso brasileiro, a meu ver, as aulas não devem se limitar a procuradores e integrantes do Ministério Público: devem se estender aos técnicos do Ministério da Fazenda e do Banco Central.
NECESSIDADE – É claro que as aulas são necessárias. Se o governo, através do Banco Central, pode interferir nas taxas de câmbio, como ocorreu na semana que passou, para frear uma disparada do dólar, como não poderia exercer o controle e fiscalização sobre remessas fraudulentas de divisas para o exterior?
As aulas, dizem Chico Otávio e Daniel Biasetto, incluirão ensinamentos a respeito de como foram instaladas empresas de fachada no exterior , off shore, para transferir reais em dólares e dólares em reais assegurando assim o movimento fraudulento de mão dupla.
Integrantes da Procuradoria Geral da República acreditam que no último quinquênio as transferências para empresas de faxada atingiram em torno de 1 bilhão e 200 milhões de dólares.
SOFISTICAÇÃO – Nessas transferências operavam sofisticadas técnicas de lavagem de dinheiro e sonegação de impostos, uma vez que empresas de fachada operavam em paraísos fiscais. A pergunta que faço é como tal processo se tornou possível sem que técnicos da Fazenda e do Banco Central percebessem.
É surpreendente que doleiros que atuam à margem da lei possam ter iludido durante tanto tempo especialistas em finanças, muitos deles com curso de Doutorado até em Harvard.
A sonegação foi enorme, inclusive porque os repasses e recebimentos efetuados por intermédio de empresas fantasmas, evidentemente, não foram declarados ao Imposto de Renda. Se declarados fossem, teriam de ser tributados, como tributadas são as pessoas físicas e jurídicas que exercem atividades plenamente integradas à lei brasileira.
AULAS DE MESTRES – Seis anos de aulas, como parte da negociação para que os doleiros não ingressem nas celas do sistema penitenciário. Mas falta alguma coisa. Como poderão ser ressarcidos os prejuízos causados direta ou indiretamente à administração pública? E como poderão ser ressarcidas milhares de pessoas que ficaram sem atendimento público por causa da corrupção?
À medida em que se aprofundam essas indagações, maior se torna a exigência também mais profunda da investigação. Creio que, durante as aulas, os doleiros possam ser acompanhados pela imprensa nas explicações sobre os tuneis econômicos implantados com apoio da rede bancária.
Será um ensinamento para o presente e para o futuro do país. A história registrará as nuvens que os doleiros utilizaram para o transporte ilegal de dinheiro. Alguns doleiros são colecionadores de obras de arte. Tais obras vão servir de referência para iluminar caminhos que levaram à corrupção.
06 de maio de 2018
Carlos Newton
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