Na política, frequentemente o que importa, mais do que a ação, é a reação. É a capacidade de corrigir os erros, impedindo ou reduzindo os seus efeitos deletérios. Neste sentido, a reação do Congresso ao Decreto 8.243, da presidente Dilma Rousseff, trouxe esperanças de que ainda existem instituições no Brasil não enfeitiçadas pelo lulismo. Dez partidos - DEM, PPS, PSDB, SDD, PV, PSB, PRB, PSD, Pros e PR, sendo que os últimos três integram a base aliada do governo - assinaram requerimento de urgência para que a Câmara dos Deputados vote um decreto legislativo revogando o ato presidencial. Esses partidos decidiram que não querem assistir passivamente ao solapamento das instituições democráticas pelo PT.
Foi uma reação imediata e proporcional a um decreto que fere a democracia representativa consagrada na Constituição, criando canais paralelos de poder, não legitimados pelas urnas, com o consequente aparelhamento do Estado. Conforme já dissemos em editorial, a mensagem subliminar em toda essa história é a de que o Poder Legislativo é dispensável.
A tomada de posição dos dez partidos foi suficientemente forte para que o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, viesse a público defender o decreto, o que também fez, no dia seguinte, a presidente Dilma Rousseff. É compreensível a atitude de ambos. A dela, por ter assinado um ato que, se pode asfixiar o sistema representativo, está perfeitamente de acordo com suas convicções ideológicas. E a dele, porque o tal ato presidencial só aumenta o seu poder, ao subordinar a Política Nacional de Participação Social à sua pasta.
Mas o que diz o sr. Gilberto Carvalho não tem propósito. Afirma ele que o decreto apenas regulamenta o que existe. Ora, a existência de Conselhos não provocou a oposição dos políticos e também de influentes setores da sociedade civil. A reação ocorreu por força da manipulação expressa no Decreto 8.243, que não se limita a regulamentar o que já existe. O que o decreto visa é criar um complexo sistema de "participação popular" e instituir uma verdadeira política de participação ideologicamente orientada, que se sobrepõe ao Poder Legislativo. Tenta-se fazer, sem a incômoda convocação de uma Constituinte e nem mesmo por meio de uma emenda constitucional, a substituição do sistema representativo por uma "democracia direta e participativa".
Até mesmo os brasileiros mais jovens, que felizmente não tiveram a experiência de viver sob um regime que não sabe respeitar nem conviver com um Congresso livre, podem ter uma ideia do que se pretende com essa "sutil" mudança de regime. Basta observar o que acontece em alguns países latino-americanos, cujos líderes chegaram ao poder prometendo governar ouvindo o povo, sem a intermediação de partidos carcomidos. Fizeram o seu próprio partido, organizaram a sua corriola e governam com poderes extraordinários - embora convoquem eleições regularmente. É a essas ditaduras disfarçadas que o governo do PT continua fiel e orgulhosamente envia sinais de simpatia.
E, se ainda pairasse alguma dúvida sobre o que significa o decreto, o próprio ministro Gilberto Carvalho ofereceu um didático exemplo. Em defesa do ato que lhe conferia tão sonhados poderes, disse que o decreto foi construído em parceria com os movimentos sociais e com a sociedade civil. Ora, como pode ter havido ampla discussão sobre o conteúdo de um decreto que, ao ser publicado, surpreendeu a todos - deputados e senadores, juristas, lideranças civis, etc.? Evidentemente, os movimentos sociais e a sociedade civil a que o ministro se refere são predominantemente as militâncias, encabrestadas ou não, que se iludem achando que serão protagonistas da tal "democracia direta e participativa". Mas a história mostra que esse tipo de regime, uma vez instalado, produz ditaduras ferozes.
E essas coisas são contagiosas. Na quarta-feira passada, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou a quem quis ouvir que não colocaria na pauta de votação da Casa o pedido de urgência dos dez partidos. Indagado sobre suas razões, respondeu, imperioso: "Porque não quero!".
Foi uma reação imediata e proporcional a um decreto que fere a democracia representativa consagrada na Constituição, criando canais paralelos de poder, não legitimados pelas urnas, com o consequente aparelhamento do Estado. Conforme já dissemos em editorial, a mensagem subliminar em toda essa história é a de que o Poder Legislativo é dispensável.
A tomada de posição dos dez partidos foi suficientemente forte para que o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, viesse a público defender o decreto, o que também fez, no dia seguinte, a presidente Dilma Rousseff. É compreensível a atitude de ambos. A dela, por ter assinado um ato que, se pode asfixiar o sistema representativo, está perfeitamente de acordo com suas convicções ideológicas. E a dele, porque o tal ato presidencial só aumenta o seu poder, ao subordinar a Política Nacional de Participação Social à sua pasta.
Mas o que diz o sr. Gilberto Carvalho não tem propósito. Afirma ele que o decreto apenas regulamenta o que existe. Ora, a existência de Conselhos não provocou a oposição dos políticos e também de influentes setores da sociedade civil. A reação ocorreu por força da manipulação expressa no Decreto 8.243, que não se limita a regulamentar o que já existe. O que o decreto visa é criar um complexo sistema de "participação popular" e instituir uma verdadeira política de participação ideologicamente orientada, que se sobrepõe ao Poder Legislativo. Tenta-se fazer, sem a incômoda convocação de uma Constituinte e nem mesmo por meio de uma emenda constitucional, a substituição do sistema representativo por uma "democracia direta e participativa".
Até mesmo os brasileiros mais jovens, que felizmente não tiveram a experiência de viver sob um regime que não sabe respeitar nem conviver com um Congresso livre, podem ter uma ideia do que se pretende com essa "sutil" mudança de regime. Basta observar o que acontece em alguns países latino-americanos, cujos líderes chegaram ao poder prometendo governar ouvindo o povo, sem a intermediação de partidos carcomidos. Fizeram o seu próprio partido, organizaram a sua corriola e governam com poderes extraordinários - embora convoquem eleições regularmente. É a essas ditaduras disfarçadas que o governo do PT continua fiel e orgulhosamente envia sinais de simpatia.
E, se ainda pairasse alguma dúvida sobre o que significa o decreto, o próprio ministro Gilberto Carvalho ofereceu um didático exemplo. Em defesa do ato que lhe conferia tão sonhados poderes, disse que o decreto foi construído em parceria com os movimentos sociais e com a sociedade civil. Ora, como pode ter havido ampla discussão sobre o conteúdo de um decreto que, ao ser publicado, surpreendeu a todos - deputados e senadores, juristas, lideranças civis, etc.? Evidentemente, os movimentos sociais e a sociedade civil a que o ministro se refere são predominantemente as militâncias, encabrestadas ou não, que se iludem achando que serão protagonistas da tal "democracia direta e participativa". Mas a história mostra que esse tipo de regime, uma vez instalado, produz ditaduras ferozes.
E essas coisas são contagiosas. Na quarta-feira passada, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou a quem quis ouvir que não colocaria na pauta de votação da Casa o pedido de urgência dos dez partidos. Indagado sobre suas razões, respondeu, imperioso: "Porque não quero!".
10 de junho de 2014
Editorial O Estadão
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