O projeto de lei que proíbe a compra de publicações estrangeiras por órgãos públicos atrasaria o desenvolvimento cultural e tecnocientífico do país; felizmente seu arquivamento já foi solicitado
O líder do PT da Câmara Federal, deputado Vicentinho, apresentou no fim de março deste ano um projeto que impediria a compra de livros e outras publicações estrangeiras por órgãos públicos brasileiros. Pela proposta, universidades e institutos de pesquisa públicos, que sabidamente usam uma vasta produção acadêmica estrangeira, teriam seu trabalho, em grande parte, inviabilizado.
O projeto polêmico veio a público dias atrás, quando especialistas passaram a discutir a conveniência e a oportunidade da proposta, fato que foi levantado pela Gazeta do Povo em reportagem do dia 1.º de junho. O projeto estava apenas em estágio inicial de tramitação – em discussão na Comissão de Serviço Público (CSP). Mas a repercussão negativa foi tão grande que o próprio Vicentinho tomou a iniciativa, na quinta-feira, de solicitar o arquivamento de seu projeto antes mesmo de ele ser votado na CSP.
Embora tivesse sido procurado pela reportagem da Gazeta quando da reportagem sobre o projeto, Vicentinho preferiu não se pronunciar. A assessoria da liderança do PT na Câmara dos Deputados alegou que tinha havido um “mal-entendido” e que o deputado pretendia era proibir a compra de publicações produzidas no Brasil, mas impressas em outros países, como a China, por questões de redução de custo. A proposta, então, serviria como uma forma de proteção e fomento da indústria gráfica nacional. De acordo com a justificativa do projeto, “Objetivando minimizar a constante evasão de divisas, este projeto vem contribuir para que haja o compromisso do poder público para com a economia nacional. Necessitamos de adoção de restrições à importação de livros e demais publicações gráficas comumente adquiridas”.
Ainda segundo a assessoria, o projeto jamais impossibilitaria a assinatura de periódicos acadêmicos. Esse argumento, contudo, não aparecia na justificativa da proposta, nem no texto do projeto de lei. Na verdade, o art. 1.º do PL 7.299 era muito claro: “É vedada aos órgãos públicos federais, estaduais e municipais, a aquisição de publicações gráficas de procedência estrangeira para utilização de qualquer espécie e natureza da administração pública”.
Da forma como estava escrito, havia diversas razões para considerar o projeto absurdo. A primeira delas é que universidades, autarquias, fundações e institutos de pesquisa teriam de cancelar assinaturas de periódicos e bases de dados imprescindíveis para o desenvolvimento tecnológico e científico brasileiro. A segunda é que se tratava meramente de proteção de uma parcela do mercado, em detrimento de todo o resto da economia nacional. Em vez de proteger a economia nacional a única contribuição do projeto seria atrasar o desenvolvimento cultural e tecnocientífico do país.
Menos mal que Vicentinho tenha desistido da proposta; lamentável é que esse recuo tenha sido motivado exclusivamente pela repercussão negativa, e que projetos dessa natureza ainda sejam propostos em pleno século 21, em que a troca, o compartilhamento e a construção de conhecimento ocorrem na velocidade da luz, trafegando por fibras ópticas e cruzando fronteiras nacionais a todo momento. O que o Brasil precisa é de estímulos para ampliar o intercâmbio intelectual e científico, de iniciativas que abram o Estado para a inovação. Não de iniciativas anacrônicas completamente sem qualidades para levar o país a uma condição de país desenvolvido.
10 de junho de 2014
Editorial Gazeta do Povo, PR
O líder do PT da Câmara Federal, deputado Vicentinho, apresentou no fim de março deste ano um projeto que impediria a compra de livros e outras publicações estrangeiras por órgãos públicos brasileiros. Pela proposta, universidades e institutos de pesquisa públicos, que sabidamente usam uma vasta produção acadêmica estrangeira, teriam seu trabalho, em grande parte, inviabilizado.
O projeto polêmico veio a público dias atrás, quando especialistas passaram a discutir a conveniência e a oportunidade da proposta, fato que foi levantado pela Gazeta do Povo em reportagem do dia 1.º de junho. O projeto estava apenas em estágio inicial de tramitação – em discussão na Comissão de Serviço Público (CSP). Mas a repercussão negativa foi tão grande que o próprio Vicentinho tomou a iniciativa, na quinta-feira, de solicitar o arquivamento de seu projeto antes mesmo de ele ser votado na CSP.
Embora tivesse sido procurado pela reportagem da Gazeta quando da reportagem sobre o projeto, Vicentinho preferiu não se pronunciar. A assessoria da liderança do PT na Câmara dos Deputados alegou que tinha havido um “mal-entendido” e que o deputado pretendia era proibir a compra de publicações produzidas no Brasil, mas impressas em outros países, como a China, por questões de redução de custo. A proposta, então, serviria como uma forma de proteção e fomento da indústria gráfica nacional. De acordo com a justificativa do projeto, “Objetivando minimizar a constante evasão de divisas, este projeto vem contribuir para que haja o compromisso do poder público para com a economia nacional. Necessitamos de adoção de restrições à importação de livros e demais publicações gráficas comumente adquiridas”.
Ainda segundo a assessoria, o projeto jamais impossibilitaria a assinatura de periódicos acadêmicos. Esse argumento, contudo, não aparecia na justificativa da proposta, nem no texto do projeto de lei. Na verdade, o art. 1.º do PL 7.299 era muito claro: “É vedada aos órgãos públicos federais, estaduais e municipais, a aquisição de publicações gráficas de procedência estrangeira para utilização de qualquer espécie e natureza da administração pública”.
Da forma como estava escrito, havia diversas razões para considerar o projeto absurdo. A primeira delas é que universidades, autarquias, fundações e institutos de pesquisa teriam de cancelar assinaturas de periódicos e bases de dados imprescindíveis para o desenvolvimento tecnológico e científico brasileiro. A segunda é que se tratava meramente de proteção de uma parcela do mercado, em detrimento de todo o resto da economia nacional. Em vez de proteger a economia nacional a única contribuição do projeto seria atrasar o desenvolvimento cultural e tecnocientífico do país.
Menos mal que Vicentinho tenha desistido da proposta; lamentável é que esse recuo tenha sido motivado exclusivamente pela repercussão negativa, e que projetos dessa natureza ainda sejam propostos em pleno século 21, em que a troca, o compartilhamento e a construção de conhecimento ocorrem na velocidade da luz, trafegando por fibras ópticas e cruzando fronteiras nacionais a todo momento. O que o Brasil precisa é de estímulos para ampliar o intercâmbio intelectual e científico, de iniciativas que abram o Estado para a inovação. Não de iniciativas anacrônicas completamente sem qualidades para levar o país a uma condição de país desenvolvido.
10 de junho de 2014
Editorial Gazeta do Povo, PR
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