Ainda há pouco, eu escrevia sobre a migração dos leitores de jornais e livros para a Internet. Nesta segunda-feira, José Roberto de Toledo fez ontem algumas considerações interessantes no Estadão sobre Internet e imprensa, no artigo “Origem e destino do leitor”.
Se você está lendo este artigo em um jornal impresso, você faz parte de uma minoria. Ou melhor, de uma minoria da minoria. E não é só por causa da qualidade duvidável deste texto. A leitura de jornais em papel no Brasil limita-se a 25% da população. Descontados os leitores ocasionais, que dão uma lida só um dia ou outro, sobram apenas 10% que leem quatro vezes ou mais por semana.
Não, não é uma questão educacional. Nunca houve tantos alfabetizados, nem nunca tantos brasileiros completaram o ciclo escolar, inclusive o nível superior. Um dos desafios do jornal em papel é que mesmo entre os diplomados a sua leitura é rara: 56% nunca leem, e só 14% o fazem diariamente. É uma questão de tempo. Quem lê jornal passa uma hora lendo. E no resto do dia?
Isso é verdade. Vivemos dias televisivos e da predominância da imagem. A televisão roubou muitos leitores de jornais e agora a Internet está abocanhando o resto. Constata Toledo:
Cerca de 3 horas e 40 minutos, em média, são gastas na internet. A proporção é essa, um internauta dedica 3,5 vezes mais tempo à tela do que um leitor passa folheando seu jornal. E ele já não é mais a minoria. Metade dos brasileiros de 16 anos ou mais costuma usar a internet intensamente: 36% da população usa-a quatro vezes ou mais por semana; 26%, diariamente.
Até eu, que desde jovem fui leitor de jornais, hoje tenho quase todos em minha telinha, sem restrição de leitura. Alguns pedem assinatura, outros não. Mas não consegui largar o vício. Ainda assino o Estadão e só recentemente deixei de comprar a Folha. Mais ainda: finalmente entrei no século XXI e comprei um desses objetos do desejo, um iPhone. Nos dias de estaleiro, leio a imprensa diária no aparelhinho. Aliás, eu o uso praticamente só para isso e ler e-mails. Mas só respondo por computador.
Assim, se um internauta dedica 3,5 vezes mais tempo à tela do que um leitor passa folheando seu jornal, não é menos verdade que os internautas continuam folhando o jornal na telinha. Mais ainda: a Internet está migrando do computador para os tablets e celulares. Como constata o articulista. Ou seja, até computador está assumindo ares de obsoleto.
Com uma outra vantagem: na internet não há a censura que, bem ou mal, todo jornal preserva. Em um não se pode denunciar as falcatruas do PSDB. Em outras, o PT é sagrado. Na Internet, pelo menos por enquanto, pau que bate em Chico bate em Francisco.
Há muita besteira, é verdade. Se disser que 95% (cálculo no olhometro) é abobrinha, acho que até estou sendo otimista. Mas as redes sociais têm milhões de leitores, que sempre trazem à tona notícias que escaparam dos leitores ou foram propositadamente omitidas pela imprensa. Sem ir muito longe: boa parte de minhas crônicas não teriam acolhida em jornal. Por outro lado, gora o leitor tem voz. Antes, sempre dispunha das colunas do leitor nos jornais. Mas essas colunas sempre resumem as cartas e acolhem pequena parte das cartas ou mails. Nem poderia ser diferente. Papel custa grana e todo espaço de jornal é limitado.
Sem falar que, para quem lê jornais todos os dias, as manchetes são capítulos previsíveis de um mesmo romance. O Estadão, por exemplo, não me toma mais de 15 minutos. Para começar, cadernos de esportes, economia, negócios, vou logo jogando fora. Ainda leio o Caderno B. Mas cada dia menos. O que se pretende dedicado à cultura, não passa de propaganda gratuita – ou talvez não – do show business. Um título bem feito, para bom leitor, dispensa até memo o texto. Vejamos a primeira página da edição de segunda-feira.
Ucrânia reage e planeja adesão à União Européia
Previsibilíssimo. Não há nada mais a ler.
Para vice dos EUA, situação na Venezuela é “alarmante”
No mínimo.
Dilma busca aliança com PMDB
Óbvio. Quem duvida?
Corinthians se complica
Que se complique. Nada tenho a ver c0m futebol.
Impulso a empresas inovadoras.
Muito bem. Mas não leio sobre negócios. Salvo maracutaias, que me divertem, não me interessam.
Busca por avião é ampliada
Normal. Afinal, ainda não foi achado.
Marcola não terá prisão mais rígida
Até merece uma olhadela, para constatar a leniência com o crime de nosso Judiciário. O que nada tem de novo. A decisão foi revertida na mesma noite.
Presidência vai apurar atraso em pagamentos
Que apure.
Unesp e Unicamp fazem corte de gastos
Que façam.
Aceleradoras de startups ganham força no país
Quando se dignarem a traduzir startup, talvez de uma vista d’olhos para saber do que se trata.
Nó apertado
Artigo sobre o crescimento do PIB. Não me diz nada.
A Ucrãnia sem maniqueísmos
Por Roberto Romano. Prefiro um analista mais próximo do conflito.
Relativismo moral
Por Lúcia Guimarães. A moça é chata e parece estar escrevendo para americanos. Depois dos vômitos de Aiatolavo e papistas sobre o assunto, tomo distância do assunto. Qual moral não é relativa?
Tempo em São Paulo
Isto interessa. Mas meu PC já me dá quando o aciono. Isto é, da vitrine do jornal, que anuncia os melhores conteúdos, pouco sobrou. Resta algum editorial interessante, sempre raros, porque editorial é digressão sobre o óbvio.
No miolo do jornal, até pode se encontrar alimento digerível, alguma crônica, algum fait divers, tipo pai mata três filhos, se suicida e leva o cachorro junto. Aí tem matéria boa. Senso de humanidade está aí. Não quis deixar o cachorrinho desamparado. Eu, que sempre condenei os leitores de títulos, estou virando um deles. Com a diferença que já li há muito a novela.
E está lido o jornal. No Face Book, posso encontrar matérias mais legíveis, posso comentá-las ou não, e de inhapa converso com meus interlocutores. Sem falar que encontrei parentes, amigos e namoradas que não via há mais de quarenta anos. É inteligível que a que a Internet esteja comendo a imprensa em papel pelas beiradas. E até mesmo a televisão. Hoje um leitor passa mais tempo frente ao computador que frente à TV.
Continua Toledo: Enquanto o leitor de papel passa uma hora lendo um ou dois jornais, o internauta pulveriza seus 220 minutos diários entre dezenas de sites, checando suas redes sociais prediletas, e lendo e respondendo mensagens de e-mail. Num, a leitura é concentrada e contínua. No outro, dispersa e fragmentada.
Quando se trata de informação, essa diferença tem consequências. No papel, quando a edição é bem feita, há história e contexto. Uma foto remete a uma reportagem, que é explicada por um texto analítico. Uma informação puxa a outra, formando uma narrativa. O leitor tem um roteiro entre seções e assuntos. Na internet, o internauta ricocheteia num eterno entra e sai dos sites.
Tem toda razão. Jornal tem síntese, planejamento e espaço rigidamente limitado para um texto. Num jornal-papel, seriam inviáveis as tripas sem fim do recórter tucanopapista hdrófobo e grafônamo da Veja. Só a Internet permite tais linguiças. Além disso, o jornalista amador dos blogs, se não passou por uma redação, desconhece recursos gráficos e de redação – como o lead, a linha fina, a estrutura em pirâmide invertida – que facilitam a leitua do texto.
Nada impede que, em futuro próximo, os jornais migrem totalmente de mala e cuia para a rede, isto é, com corpo de editores, repórteres e redatores. Nesse dia, poder-se-á escrever um R.I.P. para a imprensa escrita. Toledo não deixou passar despercebido isto:
Um dos motivos que acentua essa mudança radical de comportamento é que o papel da primeira página está sendo substituído progressivamente pelas redes sociais. Em vez de passar pela capa de um portal, é grande a chance de você ter chegado a este texto através de uma rede social - e voltar para lá depois de lê-lo.
Isso sem falar no universo blogueiro, que tem melhores redatores que muito jornal. Acho que meus leitores concordam com isso.
12 de março de 2014
janer cristaldo
Se você está lendo este artigo em um jornal impresso, você faz parte de uma minoria. Ou melhor, de uma minoria da minoria. E não é só por causa da qualidade duvidável deste texto. A leitura de jornais em papel no Brasil limita-se a 25% da população. Descontados os leitores ocasionais, que dão uma lida só um dia ou outro, sobram apenas 10% que leem quatro vezes ou mais por semana.
Não, não é uma questão educacional. Nunca houve tantos alfabetizados, nem nunca tantos brasileiros completaram o ciclo escolar, inclusive o nível superior. Um dos desafios do jornal em papel é que mesmo entre os diplomados a sua leitura é rara: 56% nunca leem, e só 14% o fazem diariamente. É uma questão de tempo. Quem lê jornal passa uma hora lendo. E no resto do dia?
Isso é verdade. Vivemos dias televisivos e da predominância da imagem. A televisão roubou muitos leitores de jornais e agora a Internet está abocanhando o resto. Constata Toledo:
Cerca de 3 horas e 40 minutos, em média, são gastas na internet. A proporção é essa, um internauta dedica 3,5 vezes mais tempo à tela do que um leitor passa folheando seu jornal. E ele já não é mais a minoria. Metade dos brasileiros de 16 anos ou mais costuma usar a internet intensamente: 36% da população usa-a quatro vezes ou mais por semana; 26%, diariamente.
Até eu, que desde jovem fui leitor de jornais, hoje tenho quase todos em minha telinha, sem restrição de leitura. Alguns pedem assinatura, outros não. Mas não consegui largar o vício. Ainda assino o Estadão e só recentemente deixei de comprar a Folha. Mais ainda: finalmente entrei no século XXI e comprei um desses objetos do desejo, um iPhone. Nos dias de estaleiro, leio a imprensa diária no aparelhinho. Aliás, eu o uso praticamente só para isso e ler e-mails. Mas só respondo por computador.
Assim, se um internauta dedica 3,5 vezes mais tempo à tela do que um leitor passa folheando seu jornal, não é menos verdade que os internautas continuam folhando o jornal na telinha. Mais ainda: a Internet está migrando do computador para os tablets e celulares. Como constata o articulista. Ou seja, até computador está assumindo ares de obsoleto.
Com uma outra vantagem: na internet não há a censura que, bem ou mal, todo jornal preserva. Em um não se pode denunciar as falcatruas do PSDB. Em outras, o PT é sagrado. Na Internet, pelo menos por enquanto, pau que bate em Chico bate em Francisco.
Há muita besteira, é verdade. Se disser que 95% (cálculo no olhometro) é abobrinha, acho que até estou sendo otimista. Mas as redes sociais têm milhões de leitores, que sempre trazem à tona notícias que escaparam dos leitores ou foram propositadamente omitidas pela imprensa. Sem ir muito longe: boa parte de minhas crônicas não teriam acolhida em jornal. Por outro lado, gora o leitor tem voz. Antes, sempre dispunha das colunas do leitor nos jornais. Mas essas colunas sempre resumem as cartas e acolhem pequena parte das cartas ou mails. Nem poderia ser diferente. Papel custa grana e todo espaço de jornal é limitado.
Sem falar que, para quem lê jornais todos os dias, as manchetes são capítulos previsíveis de um mesmo romance. O Estadão, por exemplo, não me toma mais de 15 minutos. Para começar, cadernos de esportes, economia, negócios, vou logo jogando fora. Ainda leio o Caderno B. Mas cada dia menos. O que se pretende dedicado à cultura, não passa de propaganda gratuita – ou talvez não – do show business. Um título bem feito, para bom leitor, dispensa até memo o texto. Vejamos a primeira página da edição de segunda-feira.
Ucrânia reage e planeja adesão à União Européia
Previsibilíssimo. Não há nada mais a ler.
Para vice dos EUA, situação na Venezuela é “alarmante”
No mínimo.
Dilma busca aliança com PMDB
Óbvio. Quem duvida?
Corinthians se complica
Que se complique. Nada tenho a ver c0m futebol.
Impulso a empresas inovadoras.
Muito bem. Mas não leio sobre negócios. Salvo maracutaias, que me divertem, não me interessam.
Busca por avião é ampliada
Normal. Afinal, ainda não foi achado.
Marcola não terá prisão mais rígida
Até merece uma olhadela, para constatar a leniência com o crime de nosso Judiciário. O que nada tem de novo. A decisão foi revertida na mesma noite.
Presidência vai apurar atraso em pagamentos
Que apure.
Unesp e Unicamp fazem corte de gastos
Que façam.
Aceleradoras de startups ganham força no país
Quando se dignarem a traduzir startup, talvez de uma vista d’olhos para saber do que se trata.
Nó apertado
Artigo sobre o crescimento do PIB. Não me diz nada.
A Ucrãnia sem maniqueísmos
Por Roberto Romano. Prefiro um analista mais próximo do conflito.
Relativismo moral
Por Lúcia Guimarães. A moça é chata e parece estar escrevendo para americanos. Depois dos vômitos de Aiatolavo e papistas sobre o assunto, tomo distância do assunto. Qual moral não é relativa?
Tempo em São Paulo
Isto interessa. Mas meu PC já me dá quando o aciono. Isto é, da vitrine do jornal, que anuncia os melhores conteúdos, pouco sobrou. Resta algum editorial interessante, sempre raros, porque editorial é digressão sobre o óbvio.
No miolo do jornal, até pode se encontrar alimento digerível, alguma crônica, algum fait divers, tipo pai mata três filhos, se suicida e leva o cachorro junto. Aí tem matéria boa. Senso de humanidade está aí. Não quis deixar o cachorrinho desamparado. Eu, que sempre condenei os leitores de títulos, estou virando um deles. Com a diferença que já li há muito a novela.
E está lido o jornal. No Face Book, posso encontrar matérias mais legíveis, posso comentá-las ou não, e de inhapa converso com meus interlocutores. Sem falar que encontrei parentes, amigos e namoradas que não via há mais de quarenta anos. É inteligível que a que a Internet esteja comendo a imprensa em papel pelas beiradas. E até mesmo a televisão. Hoje um leitor passa mais tempo frente ao computador que frente à TV.
Continua Toledo: Enquanto o leitor de papel passa uma hora lendo um ou dois jornais, o internauta pulveriza seus 220 minutos diários entre dezenas de sites, checando suas redes sociais prediletas, e lendo e respondendo mensagens de e-mail. Num, a leitura é concentrada e contínua. No outro, dispersa e fragmentada.
Quando se trata de informação, essa diferença tem consequências. No papel, quando a edição é bem feita, há história e contexto. Uma foto remete a uma reportagem, que é explicada por um texto analítico. Uma informação puxa a outra, formando uma narrativa. O leitor tem um roteiro entre seções e assuntos. Na internet, o internauta ricocheteia num eterno entra e sai dos sites.
Tem toda razão. Jornal tem síntese, planejamento e espaço rigidamente limitado para um texto. Num jornal-papel, seriam inviáveis as tripas sem fim do recórter tucanopapista hdrófobo e grafônamo da Veja. Só a Internet permite tais linguiças. Além disso, o jornalista amador dos blogs, se não passou por uma redação, desconhece recursos gráficos e de redação – como o lead, a linha fina, a estrutura em pirâmide invertida – que facilitam a leitua do texto.
Nada impede que, em futuro próximo, os jornais migrem totalmente de mala e cuia para a rede, isto é, com corpo de editores, repórteres e redatores. Nesse dia, poder-se-á escrever um R.I.P. para a imprensa escrita. Toledo não deixou passar despercebido isto:
Um dos motivos que acentua essa mudança radical de comportamento é que o papel da primeira página está sendo substituído progressivamente pelas redes sociais. Em vez de passar pela capa de um portal, é grande a chance de você ter chegado a este texto através de uma rede social - e voltar para lá depois de lê-lo.
Isso sem falar no universo blogueiro, que tem melhores redatores que muito jornal. Acho que meus leitores concordam com isso.
12 de março de 2014
janer cristaldo
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