Era diversão, virou protesto e acabou em palhaçadas, estimuladas por uma visão policial da ordem pública
Na sua origem, os rolês podiam ser chamados de divertimento. No século passado os Mamonas Assassinas já cantavam:
"Esse tal Chópis Cêntis
É muicho legalzinho
Pra levar as namoradas
E dar uns rolezinhos"
No último fim de semana dois deles foram claramente instrumentalizados. Em São Paulo, 150 pessoas mobilizadas pelo Uneafro levaram o shopping JK Iguatemi a fechar suas portas. Uneafro é o nome da "União de Núcleos de Educação Popular para Negros". Em Niterói, um rolê de 50 pessoas, liderado por um ex-candidato a vereador do PSOL, zoou o Plaza Shopping. No Leblon, um evento foi enfeitado por dois cidadãos que se vestiram de Batman e Coringa.
Quem vai aos shoppings é o povo e quem atende nas lojas são trabalhadores, quase sempre remunerados por comissões sobre suas vendas. Um domingo de shopping fechado custa milhões de reais aos comerciantes e aos seus vendedores.
Se de um lado há manifestações em torno do nada, do outro, o da liderança da guilda dos shoppings, há uma postura tonitruante, inútil. Primeiro chamaram a polícia. Deu em pancadaria. Depois foram à Justiça buscar liminares e ameaças de multa. Deu em nada. O doutor Nabil Sahyoun, presidente da Alshop, pediu uma reunião com a doutora Dilma para "proibir que façam esse tipo de convocação, caso sejam menores, responsabilizar os pais". Faltou explicar como. Talvez, chamando o companheiro Xi Jinping, que tem brigadas de chineses vigiando a internet, prende quem quer e solta quando quer.
Nesse diálogo de canibais com antropófagos, veio de Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, uma palavra de sensatez, numa entrevista ao repórter Marcelo de Moraes. Ele diz que é preciso conversar, procurar entender: "Se eu falar que tem uma resposta é bobagem".
Enquanto rolavam rolês, um grupo de trabalhadores foi barrado num centro comercial da Barra da Tijuca porque traziam "poluição visual e mau cheiro". Isso na cidade onde o Réveillon da praia teve tenda VIP para convidados e, uma passeata, cercadinho para celebridades. Nos últimos anos pelo menos três correntistas de banco foram assassinados por seguranças. A maior rede de lojas de varejo do país classificou de "incidente" o assassinato de um freguês. No Rio, uma rede de supermercados tinha convênio com a quadrilha do tráfico da Cidade de Deus. Em Campinas e Salvador, cidadãos foram mortos por seguranças de shoppings depois de atritos banais. Nenhuma guilda empresarial pronunciou-se.
O melhor ponto de partida para lidar com os rolês é o descarte das soluções que agravam o problema. Em junho passado a polícia de São Paulo jogou gasolina no fogo durante uma passeata e incendiou o país. Pode-se pensar numa solução policial, afinal, a ordem precisa ser mantida. Tudo bem, troca-se o rolezinho pelo rolão.
22 de janeiro de 2014
Elio Gaspari, Folha de São Paulo
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