O Brasil derrapa enquanto o mundo se recupera. Com a melhora das condições no mundo rico, a economia global deve crescer 3,7% neste ano e 3,9% no próximo, bem mais que a brasileira, de acordo com as novas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI). Grande parte do impulso virá, como nos anos anteriores, dos países emergentes e em desenvolvimento, apesar do ajuste na China. Para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro a previsão é de um modesto crescimento de 2,3% em 2014 e de 2,8% em 2015. Detalhe significativo: a nova estimativa geral é pouco melhor que a de outubro, enquanto a do Brasil foi reduzida. O diagnóstico tem sido feito por analistas privados e por especialistas de instituições multilaterais.
O Brasil foi muito menos prejudicado pela crise internacional do que pelos erros políticos acumulados em muitos anos. Foram menos perceptíveis no segundo governo Lula, embora graves, e tornaram-se indisfarçáveis nos três primeiros anos da presidente Dilma Rousseff.
Antes do FMI, o Banco Mundial já havia divulgado projeções piores para o Brasil do que para a economia global. Segundo o banco, a produção brasileira aumentará 2,4% neste ano e 2,7% em 2015, enquanto o crescimento mundial poderá chegar a 3,2% e 3,4%. Há diferenças entre os dois conjuntos de números, mas existe uma notável coincidência quanto à incapacidade do Brasil de acompanhar o ritmo geral de atividade.
Durante anos, o presidente Lula, a presidente Dilma Rousseff e o ministro Guido Mantega fizeram bravatas, comparando o estado da economia nacional com a dos países mais desenvolvidos. Além de bravatear, deram conselhos aos governos do mundo rico a respeito de como enfrentar a crise e promover o crescimento. Teriam feito melhor se cuidassem mais de suas tarefas.
A recuperação no mundo rico foi dificultada pelo duro ajuste das contas públicas. Os governos poderiam, segundo alguns críticos, ter obtido resultados melhores se invertessem a ordem da política. Adotando compromissos críveis de arrumação fiscal, poderiam ter deixado o ajuste mais duro para depois, dando mais espaço para o crescimento na fase inicial. Esta recomendação foi repetida muitas vezes pelos economistas do FMI. Nos Estados Unidos a oposição republicana dificultou a política econômica, mas o recente acordo sobre os limites do orçamento deve produzir benefícios neste ano. Em síntese: os políticos do mundo rico podem ter errado no enfrentamento da crise, mas erraram tentando corrigir outros erros e omissões. No Brasil, os erros e omissões apenas se acumularam.
Nos países desenvolvidos, a política monetária expansionista compensou, embora apenas parcialmente, o aperto excessivo da gestão orçamentária. Como a inflação continua muito baixa, os bancos centrais poderão manter políticas mais ou menos frouxas por algum tempo, para ajudar no esforço de recuperação. A situação brasileira é muito diferente.
Não há, no caso do Brasil, espaço para afrouxamento monetário, porque a inflação já é muito alta. Também há pouco espaço para estímulos fiscais, por causa do crescimento da dívida bruta do setor público. Além do mais, o uso da contabilidade criativa desmoralizou a política fiscal e reduziu a confiança nas decisões do governo brasileiro. Esses problemas têm sido apontados por instituições oficiais, entidades privadas e agências de classificação de risco.
Sem espaço para mais estímulos monetários e fiscais, o governo brasileiro deve ainda cuidar da retomada dos investimentos. O problema dos gargalos econômicos - na infraestrutura, por exemplo - também tem sido apontado nas análises feitas por entidades multilaterais e instituições privadas. O governo demorou, em parte por inépcia gerencial, em parte por limitações ideológicas, a se esforçar seriamente para atrair capitais privados para investimentos em logística e em energia. O atraso nos enormes investimentos da Copa do Mundo e o consequente aumento de custo complicam esse quadro.
Para usar a linguagem da moda: é um caso emblemático de país perdedor na competição econômica mundial.
22 de janeiro de 2014
Editorial O Estado de S.Paulo
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