"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

O INIMIGO NÃO MORA AO LADO: MORA E DORME NA MESMA CASA PARTIDÁRIA

Certa vez, escrevi que a derrota de 2002 era a batalha de Stalingrado do PSDB. Marcaria o início de um longo período que resultaria em sucessivas derrotas. Nas eleições de 2006, 2010 e 2014 perdeu para o PT. Entre outros motivos, por suas incongruências e fragilidades.

Mais uma vez, o PSDB começa a se atrapalhar. E a reafirmar que o inimigo não mora ao lado: mora e dorme na mesma casa partidária.

O programa partidário do PSDB na semana passada marcou o início da campanha eleitoral. Tasso Jereissati e Geraldo Alckmin, respectivamente senador e governador de São Paulo, entenderam que o afastamento do partido é essencial para viabilizar a candidatura do segundo à Presidência.

Sem o afastamento, entendem que Alckmin estaria contaminado pelos problemas do governo Temer. É uma decisão pragmática. Ambos pensam que o afastamento deve ocorrer o mais rápido possível para que a contaminação seja também a menor possível.

No entanto, o movimento não é fácil. Parte expressiva do PSDB defende a permanência no governo. Alguns tucanos consideram que é tarde para desistir do governo e que a contaminação é irreversível. Pensam que o melhor é apostar que a economia pode melhorar um pouco e dar um gás ao governo.

Mesmo reconhecendo que o governo Temer é um fardo pesado de carregar, creem que, em sobrevivendo às novas denúncias, ele poderia chegar a bom termo em 2018. Ou, pelo menos, construir uma coalizão competitiva.

A complexidade do movimento está também na incerteza de quem tem a maioria para decidir para onde o PSDB vai. Há quem pense que Jereissati pode ser afastado do partido por conta de suas atitudes, consideradas independentes demais. Aécio Neves, por seu lado, articula a volta ao comando e, para tal, pode recompor o diálogo com o governo.

Outros acreditam que Jereissati e Alckmin teriam força para impor um novo rumo. Porém, o que fazer com os ministros do PSDB no governo? Ficam ou saem? Imaginem a situação: o partido rompe com o governo, mas os ministros ficam. A lógica que move Jereissati e Alckmin ficará muito prejudicada. Como sempre, o PSDB é um partido confuso.

Outra questão relaciona-se ao apoio do partido à agenda das reformas. Declarações de Jereissati são simpáticas à agenda. Mas quem terá a disposição de apoiar uma agenda impopular sem o bônus de ser governo?

A tradicional dificuldade de o PSDB posicionar-se continua pesando sobre os ombros de sua direção. O certo é reconhecer que o programa veiculado abriu uma ferida grande na base governista e dentro do próprio partido.

No final das contas, o movimento de Jereissati e Alckmin foi um erro. Primeiro, porque a decisão de abandonar ou não o governo deveria ter sido adotada há mais tempo. Segundo, porque as acusações que fazem ao governo Temer cabem muito bem no figurino tucano quando governo. Terceiro: ao acusar o governo, o programa ataca – indiretamente – Aécio Neves.

Se agir com cabeça e unidade, o PSDB poderá ganhar as eleições de 2018. Porém, ao permitir que o açodamento tome conta do processo decisório e que as mensagens não expressem a maioria do partido, corre sério risco e volta a cometer os erros que reduziram suas chances nas últimas corridas eleitorais.

Outra questão é a de que o PSDB deve, acima de tudo, entender que a velha prática da preferência por antiguidade na fila de candidaturas não vale nada em tempos de eleições digitais. Os tempos são outros, e o eleitor quer outra narrativa e, obviamente, outra prática política.


23 de agosto de 2017
Murillo de Aragão

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