Em seu voto, cuja leitura encerrou no início desta tarde, o relator Herman Benjamin pediu a cassação da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer: “Entendo comprovado abuso de poder econômico com uso de caixa 2”, disse, acrescentando: “Aqui, tudo começa com caixa 1. E termina com caixa 2”. E assinalou que o empresário Marcelo Odebrecht sequer controlava com precisão as propinas que distribuía. “Ele nunca sabia se havia uma diferença de R$ 3 milhões ou de R$ 4 milhões”.
Além de Marcelo, Herman citou Fernando Reis seguiu seu voto citando depoimentos de outros executivos da Odebrecht. Disse também que os pagamentos de propinas foram feitos em hotéis e tinham codinomes. “Tudo documentado”, afirmou.
DOIS TESOUREIROS – Depois, Herman leu trecho de depoimento que ex-ministro petista Edinho Silva fez ao TSE, assinalando que os argumentos de defesa não resistem às provas do processo. “Os autos indicam que, a rigor, havia dois tesoureiros: um oficial, que era ele (Edinho Silva), e um tesoureiro informal, em contato direto com Marcelo Odebrecht, para fins, aí sim, de utilização desses recursos de R$ 150 milhões.”
“Eu tive a melhor das impressões dos depoimentos do ministro Edinho Silva, eu não o conhecia”, diz Herman, em uma pausa no seu voto.
Ele citou também o depoimento do marqueteiro João Santana, que reconheceu que o tempo de TV que os partidos tinham direito era “negociado em um verdadeiro leilão”.
BILHETINHO – Herman segue seu voto após quase 2h de sessão, mas é interrompido por um “bilhetinho” de algum ministro. Apesar de não revelar o conteúdo da mensagem, ele afirmou: “Eu estou tentando ao máximo simplificar”. Disse que Fux fez um cálculo matemático que o voto levaria 14 horas, após ser interrompido sobre o tempo que demoraria até terminar seu voto.
A seguir, defendeu novamente que sua votação é sustentada por depoimentos e documentos. Enquanto o relator lia os depoimentos que embasaram seu voto, Gilmar interrompeu com uma alfinetada: “Agora, até fita sem perícia vale”, em referência à gravação feita por Joesley Batista, da JBS, com o presidente Michel Temer, que foi divulgada antes de ser periciada pela Polícia Federal.
“Vocês vejam que ele estava quieto até agora”, rebate Herman.
RECURSOS ILÍCITOS – Herman afirmou que “investigar as profundezas do pedido (do processo), esta destinação, é “desnecessário”. E destacou que não importa qual foi a finalidade dos recursos ilícitos. “Aqui não importa se os recursos foram efetivamente para a compra do tempo de rádio e televisão. O que importa é que esses recursos foram pedidos e recebidos de forma ilícita.”
Disse também que não há dúvidas de que “o trabalho do (marqueteiro João) Santana à chapa vencedora contou com aportes de recursos da Odebrecht”.
“Confusão absoluta de caixa 1 e caixa 2: era um abraço de siameses”, afirmou Herman. E depois, destaca o relator, veio o caixa 3. “Podemos até tirar essas provas (depoimentos) dos autos, mas não há dúvidas sobre tudo isso que está sendo mencionando no meu voto”, acentuou.
TRIÂNGULO FINANCEIRO – Governo, casal de marqueteiros e Odebrecht formavam um “triângulo financeiro”, segundo Herman Benjamin, e o casal de marqueteiros, diz Herman, levou um “calote” da empreiteira.
A forma distribuição de recursos era “automatizada”, afirmou Herman, citando os sistemas de contas no exterior. E seguiu falando de relação entre governo, marqueteiros e Odebrecht, que definiu como de continuidade e confiança. “Tratava-se, nas palavras de (João) Santana, de fundo rotativo de dívidas e créditos.”
“Jamais poderia se exigir um recibo de tal transação”, disse o relator, ao justificar a inexistência de comprovantes de pagamento. “A entrega de dinheiro sempre foi em espécie.”
A sessão se encaminhava para quase três horas de duração nesta sexta-feira. Herman tentou acalmar os outros ministros, dizendo que estava “perto do fim”.
CAIXA 2 COMPROVADO – Com apresentação de slides, Herman lê trechos de depoimentos de Mônica Moura, que disse que os R$ 70 milhões entregues por doações legais da Odebrecht não eram suficientes, por isso o caixa 2.
O relator afirmou que poderia fazer uso dos seus poderes de juiz com base no artigo 23, “que já foi tão debatido”, mas que não vai acrescentar fatos novos, referentes a Angra 3 e Belo Monte. “Não é por falta de provas, é por falta de uma vinculação mais direta com a petição inicial e com as causas de pedido”.
O advogado de Temer, Gustavo Guedes, pede a palavra para esclarecimentos sobre recursos provenientes da Odebrecht. E recebeu resposta do relator:
SEM CREDIBILIDADE – “Para fins de contabilidade, convenhamos, hoje os partidos políticos brasileiros não gozam da maior credibilidade”, disse-lhe Herman. “Nós não estamos aqui discutindo ficções”, e afirmou que “muito da contabilidade partidária é baseada em ficções”.
Herman focou seu voto, agora, nos gastos referentes às gráficas durante a campanha presidencial. O relator prometeu que estava próximo ao fim do voto. São analisadas por ele as empresas Rede Seg, Focal e VTPB. “Eu não estou fazendo a vinculação entre essas irregularidades e a campanha, apenas descrevendo”, ressalvou.
Ainda em referência às gráficas contratadas pela chapa, Herman disse: “As terceirizadas não tinham condição de entregar o que fizeram”. O relator então alegou que as empresas eram “de fachada”.
FALSA EMPRESA – “O que se está discutindo aqui não é o financiamento, mas a saída com liberação de grandes volumes para outros fins que não aqueles admitidos pela legislação eleitoral”, continuou.
“A empresa não existia”, disse, Herman em referência à VTPB. “Não há movimentação financeira em anos anteriores”, assinalou, após afirmar que a empresa não possuía capacidade operacional.
“Sequer as defesas trouxeram argumentos para afastar as incongruências sobre as empresas contratadas”, disse o relator.
“Não é possível entregar R$25 milhões a uma empresa que não existe”. Para o relator, esses valores “não são ínfimos” e seriam “capazes de mudar uma campanha presidencial”. Herman repetiu que as empresas contratadas pela campanha não tinham capacidade operacional para o serviço e eram “de fachada”, nas suas palavras.
O DIA INTEIRO – Fux, que presidia a sessão na ausência de Gilmar, que saíra do plenário com Napoleão Maia, disse a Herman que ele “teria o dia inteiro para concluir” (após um alarme soar na mesa, indicando o fim do tempo de Herman).
“Vossa Excelência está sendo profundamente insincero”, retrucou Herman, em tom de brincadeira.
O relator afirmou que “essas três empresas (Rede Seg, VTPB e Focal) receberam aproximadamente R$ 56 milhões pelos pedidos, parcialmente prestados”. E isso seria apenas R$ 14 milhões a menos do que receberam João Santana e Mônica Moura.
Herman então ressalvou que parte dos serviços das gráficas foi efetivamente prestada, “afinal, esses recursos são amplamente utilizados nas campanhas”.
ABUSO DE PODER – “Houve candidatos de presidente da República que foram profundamente afetados (pelo abuso de poder econômico)”, disse o relator, que no final do voto listou fatos que retirou da conclusão do parecer, como a suposta propina em Belo Monte, preferindo não se apropriar do uso amplamente discutido artigo 23 da Lei Complementar 64.
Além de Belo Monte, o relator descartou as acusações referentes à caixa 3 por meio da cervejaria Petrópolis; a usina de Angra 3; pagamento a gráfica pela Toyo Setal; e recursos ao casal de marqueteiros entregues por Eike Batista.
Herman enfim concluiu seu voto, após 4 horas de sessão: “Meu voto é pela cassação da chapa presidencial eleita em 2014, pelos abusos que foram apurados nesses 4 processos”.
CHAPA UNIDA – O relator defendeu a indivisibilidade da chapa. “Ninguém elege vice-presidente da República, no Brasil nós elegemos uma chapa, unida para o bem e para o mal.”
“Eu não vou votar em relação à inelegibilidade porque seria prematuro”, acrescentou o relator, advertindo: “Eu recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar de velório, mas não carrego o caixão”.
Exercendo interinamente a presidência, Luiz Fux encerrou a sessão após elogiar e agradecer o trabalho do ministro-relator, Herman Benjamin: “Magnífico magistrado” e “grande brasileiro”, disse Fux.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – O ministro Herman Benjamin compôs uma página grandiosa em sua biografia de jurista e homem público. Quanto à tropa de choque de Gilmar Mendes, os mosqueteiros parecem mesmo dispostos a trocar suas biografias por folhas corridas, como se diz na linguagem policial. É vergonhoso e lamentável. Porém, na vida, cada um faz o papel que lhe cabe. (C.N.)
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – O ministro Herman Benjamin compôs uma página grandiosa em sua biografia de jurista e homem público. Quanto à tropa de choque de Gilmar Mendes, os mosqueteiros parecem mesmo dispostos a trocar suas biografias por folhas corridas, como se diz na linguagem policial. É vergonhoso e lamentável. Porém, na vida, cada um faz o papel que lhe cabe. (C.N.)
10 de junho de 2017
Deu no Estadão
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