Desde sua criação, em 1941, o Código de Processo Penal sofreu muitas e muitas alterações. Uma das mais recentes (Lei 13.257, de 8.3.2016) introduziu no artigo 318 não o direito, mas a possibilidade, da mulher que tenha filho com idade de até 12 anos incompletos, cumprir prisão preventiva em casa. É a chamada “prisão domiciliar”, que beneficiou Adriana Ancelmo, esposa do ex-governador Sérgio Cabral, preso preventivamente em Bangu 8 e que tem filho com idade inferior a 12 anos.
O benefício que a ex-primeira dama ganhou causou celeuma e inconformismo do povo. Seja porque ela e o marido se apropriaram de fortunas do Estado do Rio de Janeiro, hoje falido e por causa disso foram presos preventivamente, e do cárcere Adriana não deveria ter ido para sua luxuosa residência, no requintado bairro do Leblon. Seja porque milhares de detentas por este Brasil a fora (só no Rio são 326), sem prestígio, poder e fama, continuam a cumprir prisão preventiva nas penitenciárias, mesmo sendo mães com filhos menores de 12 anos para criar. Seja porque, ora o benefício foi negado e depois dado de ofício pelo mesmo juiz federal do Rio que antes negou. Seja porque um desembargador cassou a decisão do juiz e manteve Adriana Ancelmo presa em Bangú. Seja porque ministra do Superior Tribunal de Justiça, em decisão pessoal e, segundo noticiado, assinada da cidade de Paris, resolveu conceder o benefício a Adriana Ancelmo.
O ERRO ESTÁ NA LEI – Os juízes erraram? Não, não erraram. Nenhum deles errou. O erro está na lei, que não é precisa, imperativa e cogente. Mas dúbia. Tudo por causa do verbo que inicia o artigo: “Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for….mulher com filho de até 12 anos de idade incompletos”.
Aquele “poderá” é o culpado de tudo isso que vem acontecendo. O preciso e seguro seria o legislador usar o verbo dever, no tempo futuro: “deverá”. Ou não usar verbo algum. Nesse caso seria suficiente esta redação: “O juiz substituirá a prisão preventiva pela domiciliar…”. Quando a lei diz que o juiz “poderá” fazer ou deixar de fazer isto ou aquilo, a lei está dando ao magistrado uma faculdade, um poder discricionário de enorme responsabilidade e que depende de múltiplos fatores e condições, exigíveis do magistrado e das circunstâncias de cada caso.
Do magistrado, exige experiência, visão social, muita tarimba e conhecimentos outros, multidisciplinares, seus e de seus experts. Da prisioneira, a gravidade do crime que cometeu (imaginem mulher com prisão preventiva decretada por crime de infanticídio ir cumprir a prisão domiciliar em casa para cuidar do outro filho que sobreviveu!), das condições sócio-econômicas, psiquiátricas e psicológicas da detenta, seu comportamento no cárcere, seu relacionamento com os filhos menores… Enfim, é um pesado fardo que o legislador deixou ao arbítrio do juiz. E cada caso é um caso. Nesse universo não existem situações iguais, a demandar decisões uniformes.
NENHUM JUIZ ERROU – E no caso Adriana Ancelmo, aqui tratado, cada juiz teve sua sensibilidade, suas convicções, seus motivos. O juiz Bretas, que inicialmente decretou a preventiva da ex-primeira dama, depois decidiu conceder-lhe o benefício da nova lei, com as restrições que a decisão impôs. O desembargador federal Abel Gomes, ao decidir recurso da Procuradoria Geral da República (PGR), cassou a decisão do juiz Bretas, pelas razões que fez constar da própria decisão revogatória e manteve Adriana Ancelmo em Bangu.
Já a ministra Maria Thereza de Assis Moura, da 6a. Turma do Superior Tribunal de Justiça, revogou a decisão do desembargador e restabeleceu a do juiz Bretas. Nenhum deles errou. Todos acertaram. Cada um teve e tem suas visões sobre o caso Adriana Ancelmo.
DIVERGIR É NATURAL – Nem todas ãs decisões judiciais são as mesmas e nem todas convergem num mesmo sentido. A divergência é natural. Vamos aguardar os próximos dias. A PGR já pediu à ministra a reconsideração da decisão que tirou Adriana Alcelmo de Bangu e requereu sua volta para a penitenciária. E caso a ministra mantenha sua decisão, a PGR pediu que a mesma seja, então, submetida aos demais ministros da 6a. Turma.
Isso é necessário e de suma importância. Porque haveremos de conhecer os votos dos demais ministros, mantendo ou não a decisão individual da ministra. E com isso, o caso Adriana Ancelmo, se acabar no STJ, terminará com a visão de sete juízes, desde a 7a. Vara Federal do Rio até à composição plena da 6a Turma do STJ.
MALDADE E PATIFARIA – Mas respeitemos todos os magistrados. Mesmo em seu espinhoso ofício, eles são gente como a gente. Têm honra, brio, sentimento, dignidade, família, reputação… Andou (ou ainda anda) circulando na internet uma foto em que aparece a ministra Maria Thereza e o ex-governador Sérgio Cabral juntos, sorrindo, e os dois expondo e segurando um livro. E tem lá um curto texto ou legenda ligando a ministra ao ex-governador, induzindo que são amigos e que a ministra agiu por amizade. Que maldade! Que patifaria!
Ainda bem que nosso editor, o experiente jornalista Carlos Newton, descobriu que se tratava de uma montagem, criminosa e maldita montagem para envenenar e submeter ao descrédito público a senhora ministra.
A VERDADE, NA TRIBUNA DA INTERNET – E Carlos Newton não perdeu tempo. Na edição desta quinta-feita (30/3) redigiu e publicou o artigo intitulado “Advinhem quem é esta mulher que aparece na foto, abraçada com Cabral”. No texto, Carlos Newton mostra e comprova que se trata de fotomontagem (photoshop). E Carlos Newton, como sempre, publicou a foto verdadeira. E a mulher que aparece sorrindo e colada a Cabral é a própria Adriana Ancelmo, no lançamento do livro “O Xis da Questão” (ed. Sextante) e que se reporta ao empresário Eike Batista. Trocaram o rosto de Adriana pelo rosto da ministra sorrindo. E espalharam por todo o Brasil.
Mais do que ato de incivilidade, quem fez isso e espalhou cometeu grave crime contra a honra da senhora ministra. Podemos discordar da sua decisão, pois cada um de nós não deixa de ser também “juiz”. E registre-se que também o site G1 apontou que se trava de fotomontagem.
DISCORDAR, SIM – Podemos debater e censurar o fato, — se foi mesmo verdadeiro –, da ministra ter assinado, lá de Paris, a ordem de transferência de Adriana Ancelmo de Bangu para sua casa no Leblon. Da mesma Paris que o casal Cabral e seus comparsas fizeram de palco para exibições de luxo, luxúria e gastança do dinheiro do povo do Rio.
Os jornais publicaram que a ministra assinou a ordem lá de Paris, onde estava em reunião de cooperação internacional. E o STJ divulgou que a assinatura eletrônica é de Direito, mesmo estabelecendo o artigo 52, I, do Regimento Interno do STJ que ministro ausente deve passar seus processos para o revisor, ou para colega seu que lhe segue na ordem de antiguidade, caso o processo não exija revisor. Tudo isso pode e deve ser abordado, com altivez e respeito.
PARIS OU BRASÍLIA? – E ainda o fato da senhora ministra, se assinou a ordem de Paris, como confirmado pelo próprio STJ, poderia ter nela escrito, como nela escreveu “Brasília (DF”), seguindo-se data e assinatura. O certo e exato não seria “Paris (“França”), seguindo-se data e assinatura? Sim, porque gerações futuras,ao estudar História e quando forem pesquisar, nunca ficarão sabendo a verdade, ou seja, de onde a ordem foi assinada.
Para os livros e registros vai constar, para todo e sempre, Brasilia. Tudo isso pode ser debatido. Ofender e falsificar foto, não.
02 de abril de 2017
Jorge Béja
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