A data de quatro de julho assinala o dia da independência dos EUA. Há uma grande controvérsia acerca dessa data ser realmente a data em que as 13 colônias se separaram, visto que dois dias antes já tinha havido a declaração de separação. Além disso, somente um mês depois os signatários efetivamente assinaram o documento, o que faz dele válido somente a partir de agosto de 1776.
Mas nada disso é importante, pois convencionou-se que a independência ocorreu com a aprovação, pelo Congresso, da Declaração de Independência. documento rascunhado por Thomas Jefferson, com revisão de John Adams, Benjamim Franklin, Roger Sherman e Ronald Livingston.
A Declaração de Independência acabou por se tornar esse marco, e não a aprovação da separação em si, por dois motivos: primeiro porque a aprovação da declaração foi em sessão pública, enquanto a separação foi em sessão privada; segundo porque o documento da separação de dois de julho não trazia as ideias que permeariam a grande nação americana nos anos vindouros.
E que ideias são essas?
Todo o documento é um banho de intelectualidade, mas se tivéssemos que separar um resumo, seria este:
“Nós consideramos essas verdades auto-evidentes: que todos os homens são criados em equidade, e que receberam de seu Criador (Deus) certos direitos inalienáveis, dentre os quais estão a vida, a liberdade e a busca da felicidade”. (tradução minha)
Para os pais fundadores dos EUA, todos os homens são criados em equidade. Na prática, isso significa que Deus garantiu a cada homem uma série de direitos naturais, indisponíveis, que estão ligados à própria ideia de humanidade, e que o novo Estado a ser criado não poderia dispor. Seria um caso de isonomia formal extrema, ou seja, os EUA não poderiam conceder privilégios a nenhum indivíduo ou classe.
Isonomia formal não se confunde com isonomia material. Enquanto a primeira trata de igualdade perante a lei, a segunda fala em igualdade econômica plena, o que só é possível com grande carga de intervenção estatal e fim da igualdade perante a lei, visto que seria necessário privilegiar formalmente pessoas que possuem menor capacidade de produção para atingir tal finalidade.
Os direitos naturais listados são a vida, a liberdade e a busca da felicidade. Nota-se que essa lista não é exaustiva, pois é usada a expressão “dentre os quais”, interpretando-se, portanto, que outros direitos naturais podem se somar a esses, mas sempre derivados deles e no mesmo espírito.
O direito à vida é a mãe de todos os demais direitos. Mas como direito natural e individual, está ligado a uma atitude passiva dos demais cidadãos. É o direito de não ter sua vida atacada ou tomada. Uma interpretação ativa desse direito, como estar intitulado a receber produtos e serviços para manutenção dessa vida de maneira agressiva, resulta na quebra do direito de liberdade dos demais membros da sociedade.
O direito à liberdade também tem suas peculiaridades. O ser humano tem o direito de fazer o que quiser, desde que sua liberdade não fira a liberdade dos demais. Isso ocorre através do exercício pleno da sua potestade dentro da sua propriedade privada. Na propriedade pública, que deve sempre ser restrita ao máximo, o exercício do seu uso é regulado de forma democrática, com direitos mínimos para cada um.
O direito à busca da felicidade é poder viver como bem quiser, inclusive exercendo vícios, desde que tais atos também não afetem terceiros. É poder planejar a vida, seus recursos, seus relacionamentos e seus projetos econômicos a partir dos seus valores, gostos e vontades, sem restrições irrazoáveis.
Enquanto os EUA tiveram esse documento como seu real norte, experimentaram uma prosperidade nunca antes vista na história, ainda que falhasse pontualmente em certos casos, como na lamentável escravidão abolida em meados do séc. XIX.
Nos últimos cem anos, mas em especial na última década, o que se viu foi uma América com um governo cada vez mais inchado, intrometido e tachador, o contrário do desejo dos pais fundadores. Neste ano haverá eleições. Que a portentosa América não continue a fugir do sonho liberal dos grandes homens do passado, para que tenhamos mais 240 anos dos EUA como o farol da liberdade auto-evidente.
(*) Bernardo Santoro é Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.
06 de julho de 2016
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