Que a política brasileira precisa de uma profunda assepsia todos sabem, mas isso não acontecerá da noite para o dia e muito menos na base do pé de cabra. Afinal, o status atual da política brasileira é como um tumor maligno na veia aorta, que se extirpado a força e na sua integralidade leva o paciente a óbito. Mesmo assim, faz-se necessário redobrar a vigilância e triplicar a cobrança pelo fim da corrupção. O que para muitos pode parecer conformismo com a situação atual, na verdade é uma leitura realista dos fatos. Isso significa que um “novo tempo” só será possível dentro de algumas décadas, desde que comecemos o trabalho agora.
Com ânimos exaltados, a população busca uma resposta, seja qual for, que aplaque a ânsia por um Brasil melhor e livre da roubalheira institucionalizada. Quando pensa-se que algo pode mudar, mesmo que mais adiante, decisões desprovidas de explicação convincente devolvem a esperança ao rés do chão.
Procurador-geral da República, Rodrigo Janot enviou ao Supremo tribunal Federal, há aproximadamente uma semana, pedidos de prisão de Romero Jucá, Renan Calheiros, José Sarney e Eduardo Cunha. Todos acusados de obstrução da Justiça. A conclusão de Janot teve por base o conteúdo das gravações feitas por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, com Jucá, Calheiros e Sarney.
Analisadas com a devida parcimônia e sem a fúria que domina os exacerbados, as referidas gravações mostram três “raposas” da política brasileira indignadas com o fim do status quo criminoso que reinou no País durante décadas. Cada um dos gravados fala nas conversas que é preciso fazer algo, mas em nenhum momento as sugestões para estancar a Operação Lava-Jato se materializam. Até porque, não há no Brasil alguém com poder para interromper as investigações que implodiram o Petrolão.
Estaríamos nós, do UCHO.INFO, defendendo a delinquência política? Nem mesmo em sonho seríamos capazes de tamanha irresponsabilidade, mas é preciso ser coerente e cobrar isonomia diante dos fatos e principalmente da realidade. Não se pode aceitar que alguns paguem, enquanto outros permanecem impunes.
Se o conteúdo das conversas é motivo suficiente para os respectivos pedidos de prisão, Janot deve aos brasileiros de bem ao menos uma explicação: a razão pela qual Lula ainda não foi preso. Afinal, o agora lobista-palestrante sugeriu, em conversas nada republicanas com companheiros de partido, a interrupção das investigações da Lava-Jato e afirmou ser o procurador-geral um ingrato. Sem contar a citação da “República de Curitiba” e as muitas palavras chulas usadas pelo ex-presidente para denegrir a operação da Polícia Federal e os investigadores que participam do caso.
Em situação idêntica encontra-se a presidente afastada Dilma Rousseff, que ainda no cargo enviou a Lula um termo de posse fraudulento, que deveria ser usado somente em caso de necessidade, segundo palavras da própria petista em conversa telefônica. Entenda-se por “em caso de necessidade” um eventual pedido de prisão de Lula com a assinatura do juiz federal Sérgio Moro. Em suma, Janot deveria ter pedido a prisão de Dilma, pois a afastada cometeu crime pior que os de Jucá, Renan e Sarney. Afinal, o trio sugeriu que era preciso fazer algo, ao passo que Dilma chegou às vias de fato.
Em cenário pior está o petista Aloizio Mercadante, que enquanto chefe da Casa Civil tentou comprar o silêncio de Delcídio Amaral, que por ocasião da investida bandoleira do ex-ministro finalizava com a Procuradoria-Geral da República acordo de colaboração premiada. Mercadante foi gravado por um ex-assessor de Delcídio, mas o assunto parece ter caído no esquecimento na PGR.
Em relação a Lula, o mesmo já deveria estar sendo julgado por Sérgio Moro, mas o ministro Teori Zavascki, relator dos processos decorrentes da Lava-Jato no STF, continua postergando a decisão que pode culminar com a prisão do “doutor honoris causa”. Aliás, motivos não faltam ara que Lula acerte as contas com a Justiça.
Ou os brasileiros compreendem que democracia exige coerência por parte dos agentes do Estado e isonomia no tratamento dos cidadãos – devem cobrar isso diuturnamente –, ou aceitam a ideia de que no Brasil alguns (privilegiados) são mais iguais do que o a maioria (indefesa).
07 de junho de 2016
ucho.info
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