As acusações são inconsistentes, do tipo “andam comentando por aí”, mas são logo aproveitadas no jogo rasteiro da política nacional. No final de semana, por exemplo, a grande mídia abriu espaço para determinado trecho da delação do lobista Júlio Camargo, vazado propositadamente à imprensa pelo Planalto para continuar a demolir o PMDB e, consequentemente, diminuir a pressão pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff.
A primeira parte da estratégia do chamado núcleo palaciano, comandado pelo ministro Aloizio Mercadante, já se saiu bem-sucedida e conseguiu neutralizar a crescente influência do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), denunciado quinta-feira pelo procurador-geral Rodrigo Janot.
Imediatamente entrou em curso a segunda parte da estratégia, que objetiva agora desconstruir a imagem do vice-presidente Michel Temer, para evitar o fortalecimento da campanha do impeachment.
NEM LULA É POUPADO
A manobra contra Temer veio com o vazamento da informação de que o lobista Júlio Camargo, ao relatar ter dado propina a Cunha, afirmara também que “havia comentários” de que o lobista Fernando Baiano Soares era conhecido por representar o PMDB, o que incluiria, além de Cunha, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o vice-presidente da República Michel Temer.
É impressionante que se baseie uma denúncia dessa gravidade num texto que começa com “havia comentários”, mas o nível da luta política é mesmo muito rasteiro.
O mais surpreendente é que, para salvar Dilma, a estratégia do Planalto admite envolver o próprio Lula, vejam que falta de solidariedade partidária, pois a notícia vazada diz que, em outro ponto do depoimento, ao mencionar que o PMDB deu apoio também ao então diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, “Camargo volta a citar de forma vaga os três nomes” (Cunha, Renan e Temer) e também o empresário José Carlos Bumlai, amigo íntimo de Lula. De forma vaga???
EM SIGILO?
Os três depoimentos de Camargo ao grupo de trabalho do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estão sob sigilo e serviram de fundamento para o oferecimento de denúncia contra o Eduardo Cunha por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O sigilo hipoteticamente não acabou, mas o vazamento de trechos selecionados vai continuar, não tenham dúvidas.
O resumo da ópera é o seguinte: depois de Cunha, o Planalto quer destruir Renan e Temer, para enfraquecer a campanha do impeachment. Apesar do acordo com Dilma, Renan voltou a estar na mira, porque o Planalto sabe que ele também será denunciado por Janot e não há como livrá-lo disso. Quanto a Temer, já prestou bons serviços na Articulação Política, mas será o grande beneficiário do impeachment e precisa ser destruído com antecedência. Mas acontece que Temer não é Cunha nem Renan e vai reagir nos bastidores. Já se afastou da Articulação Política, divulgou nota afirmando que jamais viu Fernando Baiano nem Júlio Camargo, e depois se reuniu com Eduardo Cunha, e é aí que mora o perigo.
Este é o quadro até hoje, mas amanhã pode piorar.
24 de agosto de 2015
Carlos Newton
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