Black blocs, manifestações e violência nos centros urbanos são o resultado de uma equação: a pressão do aumento de renda da população versus os resultados do fim de um ciclo econômico artificial ou demanda ampliada da população versus oferta reprimida do Estado.
No passado recente houve um aumento do poder de compra com origem no plano de estabilização da moeda, ainda no governo Fernando Henrique.
Depois disso, a ampliação mediante os programas de transferência de renda durante a administração Lula. Avançamos em direções importantes, em especial em programas sociais que atuam onde existe miséria, mas mostramos ineficiência em tantas outras. Se de um lado foi possível aumentar a renda, do outro os gargalos para atendimento desta demanda ficaram latentes. As revoltas atuais são um resultado desta realidade.
Chegamos a uma situação crítica, que no Brasil sempre pode piorar. A classe média, espremida entre a falta de infra-estrutura e a violência, clama por uma solução, especialmente repressiva, para fazer cessar o mal iminente.
A necessidade de repressão, entretanto, é simples consequência de um modelo esgotado que gera revolta. A origem dos problemas não está na violência em si, latente para quem convive com sua ameaça, mas naquilo que gera a indignação.
É preciso entender que o modelo de aumento de renda puro e simples está esgotado. O Brasil precisa ir além. Como não houve avanço em outras frentes, colhemos este triste resultado. Houve falta, entre outras coisas, de uma política consistente de educação e uma guinada a um modelo econômico menos repressivo, que apesar de transferir renda, não garantiu uma evolução natural para um sistema sustentável.
O Brasil atuou de um lado da equação. Por si só a estabilização gerou aumento do poder de consumo. Tivemos, portanto, um aumento de demanda, seja por meio dos programas de transferência de renda, milionários empréstimos concedidos pelo BNDES ou financiamentos imobiliários da Caixa, entre tantos outros. Criou-se uma bolha, ou seja, um excesso de renda sem pilares claros de sustentação em uma economia real. A bolha está estourando em manifestações e revoltas, em especial da classe média.
Tínhamos dois modelos a seguir depois da estabilização. Realizar reformas que desafogassem a economia e impulsionasse a criação de novos empreendedores, por meio de desregulamentação e flexibilização, ou uma intervenção do Estado direcionando os rumos da economia, similar ao vivido pelo país na década de 70. O Brasil optou pela segunda opção.
Entretanto, esta alternativa exige do Estado prestações muito pesadas, seja por meio de investimentos diretos ou financiamentos. Enquanto a renda aumentava em função do plano de estabilização da moeda, concursos públicos, subsídios ou mesmo bolsas de ajuda do governo, a demanda por mais infra-estrutura e serviços também avançava. Mais uma vez, assim como na década de 80, vimos que o Estado não foi capaz de financiar e executar a sua parte, em especial obras como portos, aeroportos, saneamento, energia e estradas. Os gargalos apareceram. A demanda da população colidiu com a ineficiência estatal.
A pressão esta posta. Uma população que possui maior renda e agora com maior demanda esbarra na falta de infra-estrutura e nas regulações criadas pelo governo que emperram a livre iniciativa. O encerramento do ciclo do crédito e o estrangulamento da capacidade de financiamento do Estado leva a esta situação paradoxal que vivemos hoje. Existe a falta de perspectiva de uma economia sólida para sustentar este ciclo de crescimento que já respira por aparelhos. A saída na década de 90 foi privatizar, mais por necessidade do que por convicção. A pressão do momento levou o governo a começar a tomar, ainda de forma tímida e pontual, o mesmo caminho.
O Brasil vem perdendo, mais uma vez, um momento histórico de oportunidade. Nosso problema latente é a violência, mas precisamos entender que isto é a consequência de apostas equivocadas. O ponto central é a economia. Terminar com a violência exige um tratamento de fundo que vai muito além da repressão e passa por reformular de verdade as bases da educação e principalmente da economia.
Isto leva uma geração. Aprendemos que o Estado, quando tenta induzir o crescimento, acaba por limitá-lo. Aprendemos que aumentar a renda, sem a base de uma economia sólida e um sistema de educação decente, gera conflitos e violência. Já chegou a hora de lidar de forma madura com nossos problemas.
17 de fevereiro de 2014
Márcio Coimbra
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