Conforme prometido pelo presidente Nicolás Maduro, a Venezuela está agora em plena “guerra econômica”. Parece ser o ápice da ruptura chavista com as leis de mercado. O preço a pagar ─ expressão apropriada no momento em que o governo impõe drástico controle de preços ─ será talvez mais alto do que o país pode suportar.
Sem o carisma do caudilho Hugo Chávez, essencial para dar sentido à loucura denominada “socialismo do século 21″, restou ao medíocre ex-motorista de ônibus Maduro apelar à força bruta para dirigir um país desgovernado.
Maduro mandou soldados do Exército ocuparem lojas de eletrodomésticos acusadas de cobrar preços que o governo considera muito altos. Administradores das empresas foram presos, e Maduro estimulou os consumidores a cobrarem das lojas a devolução do dinheiro que lhes foi “roubado”.
No dia seguinte, o presidente anunciou que a ação contra os varejistas não foi “nem a pontinha do iceberg”. Na TV, ele disse que a truculência foi necessária para “conseguir equilibrar a economia verdadeira, a economia real”, como se a inflação pudesse ser contida na marra, encarcerando os empresários. Segundo o discurso oficial, é essa “burguesia parasitária”, ao lado dos “esquálidos” políticos de oposição e dos “imperialistas ianques”, a responsável pela tragédia que a Venezuela enfrenta. Tudo ─ da inflação galopante aos constantes apagões ─ é visto como “sabotagem”.
Ainda assim, até Maduro sabe que, ao forçar a redução dos preços, haverá uma corrida desenfreada às prateleiras ─ algo que, aliás, já começou. “Não caiamos no nervosismo do consumismo”, pediu ele na TV. Dizendo que os venezuelanos não devem comprar “como loucos” e precisam poupar seu dinheiro ─ que é corroído pela inflação de 54% ao ano ─, Maduro deu um “conselho” a seus governados: que adquiram apenas o “necessário”. Assim, o presidente quer não apenas estabelecer o valor de uma mercadoria, mas também o quanto cada cidadão deve comprar. A história mostra que modelos assim são fadados ao colapso.
Ademais, ao anunciar o recrudescimento da fiscalização para flagrar preços que julga abusivos, deixando explícito que o destino dos que discordarem dessa violência é a cadeia, Maduro nada mais faz do que agravar a doença que ele diz combater. O controle de preços e a hostilidade aos empreendedores são a senha para desestimular a produção, gerando mais escassez, elevação de preços e comércio clandestino. Mas argumentos racionais não têm lugar na Venezuela chavista.
A alta dos preços decorre não apenas do desmonte do setor produtivo, realizado graças à estatização patológica da economia, mas, principalmente, do controle cambial imposto por Chávez.
Como o varejo venezuelano depende de produtos importados, os preços são fixados não pela cotação irreal do governo, mas pelo mercado paralelo, onde o dólar é oito vezes mais caro. Maduro, no entanto, não tem a menor intenção de corrigir essa distorção. Ao contrário: seguindo o padrão de abafar a realidade quando esta não lhe interessa, como bem sabem os jornais que lhe são críticos, ele simplesmente mandou bloquear sites que divulgam o dólar no paralelo.
Não contente em apenas fixar preços, Maduro anunciou também que pretende tabelar os lucros em todos os setores da economia, assim que a Assembleia Nacional lhe conceder os poderes excepcionais que solicitou. Ele citou até mesmo textos religiosos para condenar o crime de usura, e anunciou a criação de tribunais especiais para acelerar o julgamento de casos de “roubo descarado”, ameaçando os empresários com até 30 anos de prisão.
É assim que Maduro, ao tentar proibir a inflação por decreto, conduz a Venezuela ao desastre. A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, afirmou que o país terá de enfrentar “escolhas políticas difíceis” em breve para estancar a sangria de suas reservas. Enquanto isso, o sucessor de Chávez antecipou o Natal por decreto, para “derrotar a amargura”, e criou o Vice-Ministério da Suprema Felicidade.
24 de novembro de 2013
Editorial do Estadão
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