Joesley & Wesley podem ensinar uma coisa ou duas a Bobby Axelrod, o protagonista do elétrico drama financeiro "Billions", cuja segunda temporada terminou em maio (e está inteira na Netflix). Os empresários-delatores de Goiás e o megainvestidor fictício de Nova Jersey, afinal, têm mais em comum do que daria a entender seu descompasso capilar.
A série, produzida e exibida nos EUA pelo canal pago Showtime, já tem terceira temporada confirmada para o ano que vem. É o trunfo da inteligência sobre a pirotecnia e o apelo fácil, já que a a produção se ampara essencialmente no roteiro engenhoso e nas atuações gigantescas de Paul Giamatti ("Sideways") e Damian Lewis ("Homeland") como o promotor federal e o dono de uma firma de investimentos movidos primariamente por ódio mútuo.
O que torna esta temporada especial (a coluna já havia abordado o primeiro ano da série em fevereiro) é o vigor dos roteiristas para, após alguns episódios arrastados que seguiram uma estreia bastante bem-sucedida, recobrarem o roteiro e produzirem um final perfeito que não só fecha a história de forma satisfatória como abre a porta para uma temporada mais centrada em política (e aí entra a similaridade com os irmãos Batista).
As reviravoltas são constantes, sem serem inverossímeis; as nuances dos personagens são tantas que é difícil assumir torcidas e apostas.
É fácil apontar "House of Cards" com suas intrigas políticas e seus crimes de poder como a epítome do nosso tempo, mas talvez seja "Billions" e seu desapreço pelas regras em nome do ego e do lucro que explique melhor esses anos revoltos.
Aqui, mocinho e bandido se confundem o tempo todo, com o lado supostamente "do bem" movido pela vaidade e o desejo de ascensão, metido em jogos sexuais fetichistas e usando subordinados e parentes para atingir fins pouco nobres.
Do outro lado, o vilão é sujeito família, o "self-made man" que constrói com destreza a riqueza que a sociedade americana apregoa, e é idolatrado pela sua habilidade de usar brechas na mal regulada indústria financeira para alavancar lucros e ambições que nem sempre têm a ver com dinheiro. Ambos filhos inegáveis da meritocracia, ambos prontos para fecharem a primeira delação ou usarem o primeiro grampo que lhes convier.
O centro desta temporada são duas grandes operação que lança mão de informações privilegiadas obtidas de forma pouco heterodoxa (tipo compra de dólares quando se sabe que o câmbio da moeda saltará) e as pretensões eleitorais do promotor Chuck Rhoades (Giamatti).
A dimensão pessoal também avança, com o crescimento da personagem de Maggie Siff, a inacreditavelmente "isentona" psicóloga que é mulher do promotor e confidente de seu investigado, e a introdução da protegée genial que não se identifica como homem nem como mulher vivida por Asia Kate Dillon —intérprete excelente que, aliás, se apresenta da mesma forma. Ah. E há Marie-Louise Parker, que deve ficar em 2018.
06 de junho de 2017
Luciana Coelho, Folha de SP
A série, produzida e exibida nos EUA pelo canal pago Showtime, já tem terceira temporada confirmada para o ano que vem. É o trunfo da inteligência sobre a pirotecnia e o apelo fácil, já que a a produção se ampara essencialmente no roteiro engenhoso e nas atuações gigantescas de Paul Giamatti ("Sideways") e Damian Lewis ("Homeland") como o promotor federal e o dono de uma firma de investimentos movidos primariamente por ódio mútuo.
O que torna esta temporada especial (a coluna já havia abordado o primeiro ano da série em fevereiro) é o vigor dos roteiristas para, após alguns episódios arrastados que seguiram uma estreia bastante bem-sucedida, recobrarem o roteiro e produzirem um final perfeito que não só fecha a história de forma satisfatória como abre a porta para uma temporada mais centrada em política (e aí entra a similaridade com os irmãos Batista).
As reviravoltas são constantes, sem serem inverossímeis; as nuances dos personagens são tantas que é difícil assumir torcidas e apostas.
É fácil apontar "House of Cards" com suas intrigas políticas e seus crimes de poder como a epítome do nosso tempo, mas talvez seja "Billions" e seu desapreço pelas regras em nome do ego e do lucro que explique melhor esses anos revoltos.
Aqui, mocinho e bandido se confundem o tempo todo, com o lado supostamente "do bem" movido pela vaidade e o desejo de ascensão, metido em jogos sexuais fetichistas e usando subordinados e parentes para atingir fins pouco nobres.
Do outro lado, o vilão é sujeito família, o "self-made man" que constrói com destreza a riqueza que a sociedade americana apregoa, e é idolatrado pela sua habilidade de usar brechas na mal regulada indústria financeira para alavancar lucros e ambições que nem sempre têm a ver com dinheiro. Ambos filhos inegáveis da meritocracia, ambos prontos para fecharem a primeira delação ou usarem o primeiro grampo que lhes convier.
O centro desta temporada são duas grandes operação que lança mão de informações privilegiadas obtidas de forma pouco heterodoxa (tipo compra de dólares quando se sabe que o câmbio da moeda saltará) e as pretensões eleitorais do promotor Chuck Rhoades (Giamatti).
A dimensão pessoal também avança, com o crescimento da personagem de Maggie Siff, a inacreditavelmente "isentona" psicóloga que é mulher do promotor e confidente de seu investigado, e a introdução da protegée genial que não se identifica como homem nem como mulher vivida por Asia Kate Dillon —intérprete excelente que, aliás, se apresenta da mesma forma. Ah. E há Marie-Louise Parker, que deve ficar em 2018.
06 de junho de 2017
Luciana Coelho, Folha de SP
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