Sua equipe tenta descobrir o que mais lhes reserva a "herança maldita" do cofre de Dilma, além do que ela própria já inscreveu no Orçamento deste ano. O PT inventou a expressão, mas podemos tomá-la emprestada, pois, em termos de herança governamental, a de Dilma, senhores, ponha-se "maldita" nisso. Ela bem que avisou, ao dizer que faria "o diabo para ganhar a eleição". O diabo atendeu com alegria.
Enquanto eu escrevia este artigo, a equipe do Ministério do Planejamento, quase todos funcionários de carreira, inclusive do Ministério da Fazenda, revia o Orçamento deste ano, deixado pela própria Dilma. O crescimento das despesas a assustou a ponto de ela mesma propor diversos abatimentos colossais: R$ 9 bilhões no PAC (que era sua menina dos olhos); R$ 3 bilhões na Saúde; R$ 3,5 bilhões na Defesa; e, não obstante, o déficit previsto ficou em mais de R$ 96 bilhões. Os números estão sendo revistos, junto com as previsões da arrecadação - em queda continuada, R$ 5 bilhões a menos só em abril. Há estimativas de um déficit recalculado de R$ 130 bilhões; os menos otimistas falam em R$ 160 bilhões.
O PIB brasileiro de 2015 (fechado pelo IBGE em março deste ano) teve uma queda de 3,8% em relação a 2014, alcançou R$ 5,9 trilhões (US$ 1,53 trilhão, no câmbio de 3/3/2016). No ano passado o PIB caiu 0,7% no primeiro trimestre; 1,9% no segundo; 1,7% no terceiro; e 1,4% no quarto. Quedas sucessivas sobre o que já caíra. E no primeiro trimestre deste ano o IBGE estimou uma queda de 1,44% do PIB.
Estamos, portanto, independentemente de preferências políticas ou ideológicas, por Dilma, Lula, Temer, PT, PSDB, PMDB, PC do B, Cunha ou Renan, diante de um dos maiores desastres nas contas públicas. Nunca houve coisa semelhante nem no disparatado período Sarney, quando os planos de ajuste e estabilização (3 deles) se sucederam com a mesma frequência dos desajustes e desestabilizações. Fernando Collor pegou o barco afundando e tentou fazê-lo flutuar com medidas quixotescas: confisco de depósitos bancários; congelamento de preços; extinção de ministérios; demissões de funcionários.
Tudo para segurar uma inflação que chegara aos 1.764% ao ano. Nada funcionou. Sofreu impeachment e deixou o governo em 1992, nas mãos de Itamar Franco, o topetudo, bonachão e mulherengo presidente que, sem saber o que fazer direito, colocou no Ministério da Fazenda um sociólogo que, presumidamente, nada entendia de Economia, FHC, mas que, com uma equipe de jovens economistas engenhosos, derrubou a assustadora inflação para 916,43% em 1994; 22,41% em 1995; 9,56% em 1996; 5,22% em 1997; e 1,6% em 1998. Terminaria seu segundo mandato em 2002 com uma inflação de 12,53%.
Hoje não é uma inflação galopante o problema, e sim contas públicas estouradas. Com elas, os bons profissionais de que o governo dispõe, na Fazenda, no Planejamento, no Banco Central, no Tesouro, sabem lidar e como lidar. Só dependem de cobertura política para repô-las nos trilhos. Mas é na política que reside o "déficit" estrutural mais grave. A demanda da população por seriedade, inteligência, honradez, espírito público e ética ultrapassa em muito a oferta que a classe política produz hoje em dia. Daí esta governança falida em quase tudo o que dependa dos governos, federal, estaduais e municipais.
Temer só conseguirá arrumar um pouco as contas para o próximo governo poder governar.
19 de maio de 2016
Marco Antonio Rocha, O Estado de S. Paulo
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