A nomeação de Eugênio Aragão para a Justiça confirma a intenção de enquadrar-se a PF, num momento em que o certo é confiar nas instituições
É muito provável que a ideia de nomear ministro o ex-presidente Lula tenha sido considerada no Planalto, PT e redondezas uma tacada de mestre. Ao mesmo tempo em que se blindaria Lula contra o juiz Sérgio Moro e a Operação Lava-Jato, um governo enfraquecido contaria com substancial reforço para negociações políticas ou o que fosse. Mas, na prática, a teoria não tem funcionado.
Mesmo sabendo que era investigado, Lula não se moderou ao telefone e permitiu que se registrassem em gravações legais diálogos memoráveis, típicos de quem não se preocupa com limites da lei e éticos na defesa de interesses próprios.
Em uma gravação específica — cuja legalidade será decidida pelo Supremo —, Lula e Dilma deixaram claro que a prioridade, na semana passada, era apressar a nomeação do novo ministro, agora sub judice, para protegê-lo de eventual prisão. E também para que o processo em torno dele que está em construção na Lava-Jato vá para o STF, não fique na Justiça Federal de Curitiba, sede da operação.
A intenção de erguer barreiras contra o trabalho da força-tarefa da Lava Jato para elucidar quem é o verdadeiro dono do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia já é passível de pelo menos uma denúncia criminal.
Além da nomeação de Lula a fim de abrigá-lo no STF — intenção que pode ser ilusória, pois foi o Supremo que condenou os mensaleiros —, há uma operação em curso para, se não desmontar, paralisar a Lava-Jato.
A nomeação para o Ministério da Justiça do sub-procurador-geral da República, Eugênio Aragão, é sintomática. Ele é o mesmo que Lula, num dos diálogos gravados, diz achar que deveria cumprir um papel “de homem”, para enquadrar a Polícia Federal. O que o lulopetismo cobrava do ex-ministro José Eduardo Cardozo.
No fim de semana, em entrevista à “Folha de S.Paulo”, Aragão advertiu: “Cheirou vazamento de investigação por um agente nosso, a equipe será trocada, toda”. Mostrou logo a que veio, mesmo que tempere a advertência com declarações favoráveis à investigação. Mas ela não interessa ao lulopetismo, é certo.
Já começou difícil o relacionamento do ministro com delegados da PF ciosos da importância da sua autonomia operacional.
O ímpeto de Aragão nas primeiras entrevistas, a gana de Lula contra adversários que trata como inimigos, como expresso nas gravações, são ingredientes que podem levar a um agravamento da própria crise política. Porque não será, por certo, aceita de forma passiva qualquer intervenção arbitrária na PF.
Na manifestação de sexta-feira, na Paulista, o Lula que discursou foi o “paz e amor” da campanha de 2002. Melhor assim. A nomeação dele, colocada em suspenso por liminar concedida pelo ministro Gilmar Mandes, será examinada pela Corte. É preciso aguardar uma decisão final, de que dependerá o destino das investigações da Lava-Jato sobre ele. Se ficam em Brasília ou retornam a Curitiba, como determinou o ministro do STF.
Ao mesmo tempo, começa a funcionar a comissão do impeachment. É assim que deve ser: as instituições em funcionamento — Legislativo e Judiciário —, para que se supere a crise sem qualquer desobediência à Constituição.
22 de março de 2016
Editorial O Globo
É muito provável que a ideia de nomear ministro o ex-presidente Lula tenha sido considerada no Planalto, PT e redondezas uma tacada de mestre. Ao mesmo tempo em que se blindaria Lula contra o juiz Sérgio Moro e a Operação Lava-Jato, um governo enfraquecido contaria com substancial reforço para negociações políticas ou o que fosse. Mas, na prática, a teoria não tem funcionado.
Mesmo sabendo que era investigado, Lula não se moderou ao telefone e permitiu que se registrassem em gravações legais diálogos memoráveis, típicos de quem não se preocupa com limites da lei e éticos na defesa de interesses próprios.
Em uma gravação específica — cuja legalidade será decidida pelo Supremo —, Lula e Dilma deixaram claro que a prioridade, na semana passada, era apressar a nomeação do novo ministro, agora sub judice, para protegê-lo de eventual prisão. E também para que o processo em torno dele que está em construção na Lava-Jato vá para o STF, não fique na Justiça Federal de Curitiba, sede da operação.
A intenção de erguer barreiras contra o trabalho da força-tarefa da Lava Jato para elucidar quem é o verdadeiro dono do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia já é passível de pelo menos uma denúncia criminal.
Além da nomeação de Lula a fim de abrigá-lo no STF — intenção que pode ser ilusória, pois foi o Supremo que condenou os mensaleiros —, há uma operação em curso para, se não desmontar, paralisar a Lava-Jato.
A nomeação para o Ministério da Justiça do sub-procurador-geral da República, Eugênio Aragão, é sintomática. Ele é o mesmo que Lula, num dos diálogos gravados, diz achar que deveria cumprir um papel “de homem”, para enquadrar a Polícia Federal. O que o lulopetismo cobrava do ex-ministro José Eduardo Cardozo.
No fim de semana, em entrevista à “Folha de S.Paulo”, Aragão advertiu: “Cheirou vazamento de investigação por um agente nosso, a equipe será trocada, toda”. Mostrou logo a que veio, mesmo que tempere a advertência com declarações favoráveis à investigação. Mas ela não interessa ao lulopetismo, é certo.
Já começou difícil o relacionamento do ministro com delegados da PF ciosos da importância da sua autonomia operacional.
O ímpeto de Aragão nas primeiras entrevistas, a gana de Lula contra adversários que trata como inimigos, como expresso nas gravações, são ingredientes que podem levar a um agravamento da própria crise política. Porque não será, por certo, aceita de forma passiva qualquer intervenção arbitrária na PF.
Na manifestação de sexta-feira, na Paulista, o Lula que discursou foi o “paz e amor” da campanha de 2002. Melhor assim. A nomeação dele, colocada em suspenso por liminar concedida pelo ministro Gilmar Mandes, será examinada pela Corte. É preciso aguardar uma decisão final, de que dependerá o destino das investigações da Lava-Jato sobre ele. Se ficam em Brasília ou retornam a Curitiba, como determinou o ministro do STF.
Ao mesmo tempo, começa a funcionar a comissão do impeachment. É assim que deve ser: as instituições em funcionamento — Legislativo e Judiciário —, para que se supere a crise sem qualquer desobediência à Constituição.
22 de março de 2016
Editorial O Globo
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