Há diversas formas de envelhecer, e talvez a mais pesarosa seja desaparecer em nosso próprio esquecimento. É o que ocorre com aquele avô que você adora, um sujeito admirável, hábil contador de histórias e divertido companheiro de parques e circos, mas que, de repente, torna-se irreconhecível. Começa a provocar situações constrangedoras e deprimentes, muitas vezes feitas de gritarias, xingamentos, agressões físicas ou simples falta de bom senso. Abandonado à demência, descola-se da pessoa que foi para vestir outra identidade.
É dessa forma que prefiro pensar no ex-presidente Lula - um bom avô que o Brasil um dia teve e que inspirou milhões de pessoas, convencidas da possibilidade de reformas estruturais na sociedade. Hoje, no entanto, transformou-se em um homem perdido, de discursos desatinados, de atos obscenos e que não mais reconhecemos. Como um rato (ou seria uma jararaca?) encurralado, com medo de ser preso, assume seus valores degenerados, ataca a sociedade, ofende o bom senso e debocha da decência.
Ao perder a noção da responsabilidade sobre seus atos, o nosso herói com Alzheimer passou a ser vigiado até por netos que, em um passado recente, o admiravam, e que não querem vê-lo cometer mais bobagens. Sei que muitos deles participaram das manifestações do domingo de 13 de março, o maior protesto já registrado na história nacional, na tentativa de combater toda e qualquer forma de corrupção no País. Porque todos nós, antes de tudo, somos filhos dessa nação. Alguns, ainda contagiados por uma cegueira educacional ou ideológica.
Logo cedo, na escola, conhecemos Macunaíma, personagem da obra prima do escritor brasileiro Mário de Andrade. Então, entendemos a natureza de um herói sem nenhum caráter: é mentiroso, traidor, briguento, preguiçoso. Demonstra acolher todo o mundo, mas também rouba e trapaceia sem remorso. É nisso que penso enquanto acompanho as notícias recentes que confirmam o aceite de Lula para o comando da Casa Civil, em um golpe desesperado para se manter no poder.
Assim como o avô de quem guardamos apenas as boas lembranças, eu gostaria de, um dia, preservar em minha memória a imagem do homem que produziu esperança para um povo. É certo que gente se alimenta não só de comida e bens de consumo, mas também de educação, cultura e desenvolvimento. Não quero, porém, entrar nesse mérito. Houve uma mudança e, por isso, ele merece seu espaço na história.
Porém, um velho homem acometido pela senilidade indica o fim da vida, seja ele real ou simbólico. E a morte tem um dom: o de expurgar os defeitos e, com poucas exceções, perdoar na Terra aquilo que os homens fizeram. Até que, aos poucos, aquela imagem tão familiar vai desaparecendo de nosso coração e de nossas mentes.
“Escreve na pedra aquilo que lhe fazem de bem, e na areia aquilo que lhe fazem de mal”, como diz o ditado. Porque o que há de mal o vento vem e leva. E o vento há de soprar.
Francisco Balestrin é presidente do Conselho de Administração da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) e presidente eleito da Associação Mundial de Hospitais (IHF)
22 de março de 2016
francisco balestrin
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