"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

A GUERRA PELA ALMA DO ISLÃ


Atentados nos Estados Unidos em 2001. Responsáveis? Radicais islâmicos, reunidos na Al Qaeda.

Atentados aos trens na Espanha, três anos depois. Responsáveis? Radicais islâmicos.

Atentados a ônibus e ao metrô em Londres, em 2005. Responsáveis? Radicais islâmicos.

Atentados de sexta-feira em Paris. Responsável? O Estado Islâmico.

O islã é, então, a fonte da violência que assusta o planeta? Não.

Não é minha opinião, irrelevante, mas a dos líderes dos principais países do mundo, congregados no G20, cujo comunicado final sobre terrorismo é claro:

"Nós reafirmamos que terrorismo não pode e não deve ser associado com qualquer religião, nacionalidade, civilização ou grupo étnico".

Mas, como disse à Folha o filósofo Pascal Bruckner, "o desafio do século 21 é o islamismo, ponto". Ressalva fundamental: "O radical é a degeneração ideológica do islã".

Aí, chega-se ao ponto.

Na verdade, há uma guerra surda entre a maioria islamista não radical e os fanáticos que praticam atentados e tentam recriar o califado, o governo de um Estado com base na sharia, a lei islâmica, cuja última expressão (o Império Otomano) foi abolida já faz quase um século (em 1924) pelo turco Mustafá Kemal Atatürk.

Dessa guerra dá bem ideia Hisham Hellyer, pesquisador sênior do Conselho Atlântico de Washington, em artigo para o "Financial Times":

"O grupo [Estado Islâmico] visa muçulmanos bem mais do que quaisquer outros –e a maioria das pessoas que lutam contra o EI também é muçulmana".

A questão seguinte é saber se é possível "eliminar" os fanáticos (verbo usado pelo presidente Barack Obama) e, com isso, pôr fim ao terrorismo.

É esse esforço militar que foi agudizado pelos atentados em Paris, mas o mais lógico é admitir que não se ganha a guerra apenas pelas armas.

Tim Arango lembra, no "The New York Times" desta quarta-feira, 18, que um predecessor do Estado Islâmico (Al Qaeda na Mesopotâmia), criado para combater a invasão norte-americana do Iraque em 2003, foi destruído e teve seus líderes mortos em 2009.

Mas, "depois que os americanos deixaram o Iraque, o grupo ascendeu de novo das sombras e, em sua reencarnação [o Estado Islâmico], tornou-se ainda mais brutal e determinado".

O sentido comum determina, pois, que, por mais que a ação militar seja indispensável, ela só será de fato vitoriosa se houver, também, uma guerra cultural pela alma do islã.

"Necessitamos uma forte identidade religiosa que convoque as pessoas à ação, mas ação de um modo construtivo, não destrutivo, e que promova a vida, não a morte", disse ao "The New York Times" o imã Mohamed Magid, líder espiritual da comunidade muçulmana na Virgínia.

Mas que ninguém se iluda: não só a vitória militar não está à volta da esquina, na Síria ou no Iraque (bases do califado), como a batalha cultural também leva tempo.

É como disse o filósofo Bruckner à Folha: "Desativar militar, policial e judicialmente o radicalismo vai levar várias gerações".

Mas ou se começa já ou se eternizará o medo –e, com ele, a islamofobia.

19 de novembro de 2015
Clóvis Rossi

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