Reportagem de Natuza Nery e Andréia Sadi, Folha de São Paulo de ontem, revela que a equipe do Planalto, e também uma corrente do PMDB, principalmente após a saída de Michel Temer, estão culpando Joaquim Levy pelo inegável desgaste do governo perante a opinião pública. O titular da Fazenda é apontado como causador de atritos com a base do Executivo no Congresso Nacional.
Sob o ângulo da política econômico-financeira podem até ter razão quanto ao projeto de contenção de gastos colocado em prática, mas esquecem que é a presidente da República quem assina as Medidas Provisórias e os projetos enviados ao Legislativo, além dos decretos como esse que, primeiro, adiou o pagamento da metade do décimo-terceiro salário aos aposentados e pensionistas do INSS, depois, através de outro ato, recuou e dividiu a metade em duas frações iguais a serem liberadas em setembro e outubro. A última palavra sempre cabe a ela. O poder não se divide. É impossível.
Dessa forma também é impossível transferir responsabilidades executivas. Elas pertencem – e sempre pertencerão – a quem ocupar a presidência da República. Portanto, culpar Joaquim Levy é, automaticamente, culpar a própria Dilma Rousseff. Para o núcleo político que opera no Planalto – acentuam Natuza Nery e Andréia Sadi – o titular da Fazenda joga errado, sobretudo quando se coloca contra propostas do próprio governo. Tal posição atingiu o vice Michel Temer, que deixou a coordenação governamental, por ter assumido compromissos fisiológicos com setores multipartidários, os quais não foram cumpridos. Mas a decisão final foi de quem?
TEMPO DA POLÍTICA
Joaquim Levy – sustentou o senador Romero Jucá, do PMDB – o teu tempo não é o tempo da política. O parlamentar, claro, referia-se a uma falta de sintonia entre o programa de contenção de despesas com os acordos do governo com integrantes da chamada base aliada.
Base cada vez menos sólida e menos aliada. Basta citar o episódio Eduardo Cunha. Joaquim Levy passou a ser alvo paralelamente de críticas do ministro Eliseu Padilha, da Aviação Civil, porém de fato ministro para a articulação política, com presença certa no Planalto. Causa surpresa, assim, que ele tenha sido escalado para uma função que nada tem com o voo e menos ainda com a aterrissagem de problemas. Problemas? Brasília está repleta deles.
O primeiro, na realidade, vem da contradição entre o que a candidata afirmou na campanha de 2014 e aquilo que ela passou a adotar na presidência, em 2015. Como ela tornou-se a sucessora de si mesma, verifica-se que a contradição é bem mais ampla: ela envolve duas presidentes da República. Se o rumo mudou, na economia, é porque passou a rejeitar a atuação de sua antecessora, ela própria. Claro. Pois só se muda o que se considera errado. A alteração, no entanto, passou a envolver uma política de compressão, a qual, sob o ângulo psicológico, leva à depressão. Que constitui o pior caminho possível.
SEM SINALIZAÇÃO
O bloqueio da esperança, e falta de sinalização para a saída da crise, são fatores que naturalmente levam à queda do consumo. E sem consumo a consequência é a queda da receita pública, refletindo diretamente para a imobilidade do governo. Não investe porque não arrecada. Não arrecada porque não tem recursos para investir. No fundo uma questão de tempo. Sobretudo porque uma política à base de investimentos privados, como a que o atual governo propõe, mesmo bem sucedida, demoraria pelo menos quatro anos para surtir efeito concreto.
E quatro anos representa um período de submersão demasiado longo para a população brasileira. Responsabilizar Joaquim Levy não resolve coisa alguma. Mudar a rota do próprio governo é a questão essencial.
25 de agosto de 2015
Pedro do Coutto
Nenhum comentário:
Postar um comentário