O jornalista Valdo Cruz, em reportagem publicada na Folha de São Paulo do dia 4, revelou que o projeto de cortar 80 bilhões de reais no orçamento da União para este ano, de autoria do ministro Joaquim Levy, está dividindo o governo. A presidente Dilma Rousseff, assim, terá que assumir a decisão final quanto à iniciativa, que também depende de aprovação pelo Congresso. Valdo Cruz assinala que os ministros da área política temem que a dimensão de tal corte paralise as ações do Poder Executivo e projete o Brasil num panorama de recessão logo ao início do segundo mandato da presidente reeleita.
Como alguém disse no passado, o remédio pode ser tão forte que, ao invés de curar, faça piorar o doente. O problema não se esgota na redução em si, mas nos seus efeitos junto a população. Some-se a isso a iniciativa das distribuidoras de energia elétrica, que segundo Danilo Fariello em O Globo de sábado, desejam antecipadamente repassar aos consumidores as taxas prováveis de inadimplência, diante do processo de aumento de preços do mercado.
Tal repasse, é claro, seria feito através de nova elevação de tarifas. Como tal elevação evidentemente atingiria a indústria, o comércio, o setor de serviços e também as residências, fácil é concluir que causaria um acréscimo generalizado no mercado de consumo levando a uma ainda maior retração do poder aquisitivo popular.
DESCAPITALIZAÇÃO
Estamos, assim, diante de mais um processo de descapitalização da força de trabalho, pois está implícito que os salários não serão reajustados nos mesmos níveis das majorações projetadas para os preços. Mais uma vez, portanto, o peso dos cortes nos gastos públicos terminaria sendo transferido para todos nós, pois o sistema empresarial condena a concessão de direitos sociais. No final da ópera, a elevação dos preços acima dos salários atingirá ainda com maior intensidade a aprovação do governo Dilma Rousseff.
A matéria de Valdo Cruz tem um significado político muito importante, na medida em que assinala a divisão do Executivo em pelo menos duas correntes, bastante tradicionais no passado, mesmo desde os tempos do presidente Juscelino Kubitschek: as correntes monetarista e estruturalista.
JK conseguiu harmonizar as duas tendências e o resultado foi o êxito de seu plano de metas. O mesmo desafio, 60 anos depois, coloca-se agora à mesa da presidente Dilma Rousseff, só que com uma diferença fundamental da popularidade alcançada por JK e a popularidade negativa registrada agora. O impasse, assim, se acentua e o seu campo de opção diminui e sua decisão torna-se urgente. Ou um caminho ou o outro, que enfrenta o obstáculo de uma inflação acima das metas originais. Essas metas, no entanto, sempre foram fictícias, pois ninguém vai supor que o índice inflacionário depois de atingir 6,5%, em 2014, fosse capaz de retroceder a 4,5 em 2015. Os preços, os exemplos históricos explicam, depois de subir não baixam mais. Estou me referindo, é claro aos preços do mercado de consumo interno, impulsionados expressivamente também pela força devastadora da corrupção que envolve quase todos os setores produtivos nacionais.
DESCRÉDITO
A corrupção gera também um estado de espírito que, se provoca descrédito de um lado nas ações do governo, de outro impulsiona a volúpia do roubo sem limites. Tanto assim que o sistema corrupto não se restringiu à Petrobrás, mas se expandiu a outras áreas vitais para o desenvolvimento econômico como o das obras ferroviárias e rodoviárias.
Vale acrescentar que a volúpia de se apoderar dos bens públicos levou até à montagem de um esquema tenebroso de chantagem na Receita Federal, através de processos em julgamento no CARF. Portanto, tal volúpia generalizou-se no governo, que infelizmente não deu a resposta de firme condenação aos ladrões, que a sociedade esperava. E que continua aguardando.
A reação contrária da opinião pública ao atual governo é um reflexo dessa espera que ameaça eternizar-se. Inclusive como a revista Veja publicou, com a montagem de um esquema destinado a evitar que o empresário Ricardo Pessoa, preso em Curitiba, possa ser atendido na sua proposta de delação premiada. Pessoa, como personagem de Hitchcock é o homem que sabia demais. A edição da Veja está nas bancas esta semana, depois dela não será fácil a confirmação do esquema que ela divulgou.
06 de abril de 2015
Pedro do Coutto
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