Todo o mercado de petróleo está em retração. Com a queda de preços, companhias desistem dos investimentos mais caros
A inflação já estourou o teto da meta e vai continuar assim ao longo deste ano. Produção e consumo vão devagar, quase parando. Contas externas continuam no vermelho. Contas públicas são arrumadas a custo de corte de gastos, inclusive em benefícios sociais, e carga tributária.
O brasileiro já entendeu tudo. Pesquisa do Instituto Datapopular mostra que as pessoas esperam para este ano mais inflação, menos emprego, mais impostos e nada de aumento de salário.
Mas não há expectativa de desastre ou de uma crise aguda, não por causa do cenário econômico.
Por exemplo: a inflação em 12 meses, medida pelo IPCA-15 de fevereiro, bateu em 7,36%. Qual a previsão consensual entre os especialistas para o final do ano? A mesma coisa, 7,33%, tal como se vê no Relatório Focus, veiculado toda segunda-feira no site do Banco Central e que resume a opinião de fora do governo (consultorias, instituições financeiras, institutos de estudo e pesquisa).
O dólar tem oscilado entre R$ 2,80 e R$ 2,90. Expectativa para dezembro? R$ 2,90, e se chegar a R$ 3, pouca gente vai estranhar. Bate na inflação, encarece o importado, mas o BC agora parece mais sério no esforço de alcançar a meta de 4,5%, ainda que lá na frente. A taxa de juros vai subir de novo na próxima reunião.
Por outro lado, o dólar caro o ano todo deve ajudar a reduzir o déficit das contas externas, barateando exportações e encarecendo as viagens internacionais.
Também ninguém espera um desastre nas contas públicas. Ao contrário, é certo que estarão bem melhor do que ano passado só com a eliminação, já em prática, das lambanças do ex-ministro Mantega. Será difícil para o atual ministro Joaquim Levy cumprir a meta de economizar R$ 55 bilhões líquidos este ano, mas ninguém vai achar que é o fim do mundo se economizar uns 40 bi ou até menos que isso. Interromper a trajetória desastrosa dos últimos anos já é um baita avanço.
O país não escapa de uma recessão este ano, também conforme um amplo entendimento entre analistas aqui e lá fora. Logo, o desemprego deve aumentar — e as pessoas já perceberam que está mais difícil arranjar ou trocar de trabalho. Mas quando se estende o cenário para 2016, a coisa melhora no geral. A expectativa é de mais crescimento, com menos inflação e maior equilíbrio nas contas do governo.
Resumindo, 2015 é um ano ruim, pior que 2014, mas será também um período de arrumação. Dia desses, o ministro Joaquim Levy disse que não há tarefa de política econômica que não possa ser feita neste momento. Quis dizer que os problemas estão identificados, as receitas são conhecidas e já foram aplicadas em outras ocasiões. Há também amplo entendimento nisso.
Então, qual o problema, além do desconforto de cruzar este ano?
A Petrobras.
Considerem os investimentos em infraestrutura, por meio das concessões de estradas, portos, aeroportos, transportes a empresas privada — aqui está a única chance de intensificar a atividade econômica. Mas isso não pode deslanchar enquanto as empresas que se ocupam disso, todas clientes e fornecedoras da Petrobras, estiverem mais preocupadas em se livrar da Lava-Jato e vender ativos.
A própria estatal está cancelando obras e devolvendo sondas, plataformas etc. Estaleiros nacionais e estrangeiros que se instalaram por aqui perdem encomendas, sobram com capacidade ociosa. E não são competitivos no mercado externo porque, protegidos aqui, têm preços maiores e tecnologia menos atual.
Além disso, todo o mercado mundial de petróleo está em retração. Com a queda de preços, companhias pelo mundo todo desistem dos investimentos mais caros e, com isso, sobram equipamentos e navios. Aliás, ficaram mais baratos, o que poderia ser uma oportunidade para a Petrobras — que, entretanto, não pode aproveitá-la por causa da política de comprar máquinas com alto componente nacional.
Não foi só roubalheira — com o perdão desse “só”.
Além de limpar os balanços do que foi roubado, será preciso mudar toda a política para o setor e eliminar os desastres causados por uma gestão tão equivocada que está merecendo a atenção de especialistas internacionais como um exemplo acabado do que não se deve fazer.
Vai ser difícil, porque depende de circunstâncias internacionais fora de controle e porque a presidente Dilma acha que está tudo indo bem na estatal. Disse, por exemplo, que a agência Moddy’s rebaixou a nota da Petrobras por falta de conhecimento do que se faz na companhia. Ora, todo mundo sabe o que se passa lá — e ninguém acha que vai bem.
Acrescente a isso a lista de Janot — a relação de políticos investigados ou denunciados na Lava-jato, que está para sair, e se vê o potencial de impacto na vida política.
Quem mesmo queria acabar com a Petrobras? Ou com o país?
27 de fevereiro de 2015
Carlos Alberto Sardenberg, O Globo
A inflação já estourou o teto da meta e vai continuar assim ao longo deste ano. Produção e consumo vão devagar, quase parando. Contas externas continuam no vermelho. Contas públicas são arrumadas a custo de corte de gastos, inclusive em benefícios sociais, e carga tributária.
O brasileiro já entendeu tudo. Pesquisa do Instituto Datapopular mostra que as pessoas esperam para este ano mais inflação, menos emprego, mais impostos e nada de aumento de salário.
Mas não há expectativa de desastre ou de uma crise aguda, não por causa do cenário econômico.
Por exemplo: a inflação em 12 meses, medida pelo IPCA-15 de fevereiro, bateu em 7,36%. Qual a previsão consensual entre os especialistas para o final do ano? A mesma coisa, 7,33%, tal como se vê no Relatório Focus, veiculado toda segunda-feira no site do Banco Central e que resume a opinião de fora do governo (consultorias, instituições financeiras, institutos de estudo e pesquisa).
O dólar tem oscilado entre R$ 2,80 e R$ 2,90. Expectativa para dezembro? R$ 2,90, e se chegar a R$ 3, pouca gente vai estranhar. Bate na inflação, encarece o importado, mas o BC agora parece mais sério no esforço de alcançar a meta de 4,5%, ainda que lá na frente. A taxa de juros vai subir de novo na próxima reunião.
Por outro lado, o dólar caro o ano todo deve ajudar a reduzir o déficit das contas externas, barateando exportações e encarecendo as viagens internacionais.
Também ninguém espera um desastre nas contas públicas. Ao contrário, é certo que estarão bem melhor do que ano passado só com a eliminação, já em prática, das lambanças do ex-ministro Mantega. Será difícil para o atual ministro Joaquim Levy cumprir a meta de economizar R$ 55 bilhões líquidos este ano, mas ninguém vai achar que é o fim do mundo se economizar uns 40 bi ou até menos que isso. Interromper a trajetória desastrosa dos últimos anos já é um baita avanço.
O país não escapa de uma recessão este ano, também conforme um amplo entendimento entre analistas aqui e lá fora. Logo, o desemprego deve aumentar — e as pessoas já perceberam que está mais difícil arranjar ou trocar de trabalho. Mas quando se estende o cenário para 2016, a coisa melhora no geral. A expectativa é de mais crescimento, com menos inflação e maior equilíbrio nas contas do governo.
Resumindo, 2015 é um ano ruim, pior que 2014, mas será também um período de arrumação. Dia desses, o ministro Joaquim Levy disse que não há tarefa de política econômica que não possa ser feita neste momento. Quis dizer que os problemas estão identificados, as receitas são conhecidas e já foram aplicadas em outras ocasiões. Há também amplo entendimento nisso.
Então, qual o problema, além do desconforto de cruzar este ano?
A Petrobras.
Considerem os investimentos em infraestrutura, por meio das concessões de estradas, portos, aeroportos, transportes a empresas privada — aqui está a única chance de intensificar a atividade econômica. Mas isso não pode deslanchar enquanto as empresas que se ocupam disso, todas clientes e fornecedoras da Petrobras, estiverem mais preocupadas em se livrar da Lava-Jato e vender ativos.
A própria estatal está cancelando obras e devolvendo sondas, plataformas etc. Estaleiros nacionais e estrangeiros que se instalaram por aqui perdem encomendas, sobram com capacidade ociosa. E não são competitivos no mercado externo porque, protegidos aqui, têm preços maiores e tecnologia menos atual.
Além disso, todo o mercado mundial de petróleo está em retração. Com a queda de preços, companhias pelo mundo todo desistem dos investimentos mais caros e, com isso, sobram equipamentos e navios. Aliás, ficaram mais baratos, o que poderia ser uma oportunidade para a Petrobras — que, entretanto, não pode aproveitá-la por causa da política de comprar máquinas com alto componente nacional.
Não foi só roubalheira — com o perdão desse “só”.
Além de limpar os balanços do que foi roubado, será preciso mudar toda a política para o setor e eliminar os desastres causados por uma gestão tão equivocada que está merecendo a atenção de especialistas internacionais como um exemplo acabado do que não se deve fazer.
Vai ser difícil, porque depende de circunstâncias internacionais fora de controle e porque a presidente Dilma acha que está tudo indo bem na estatal. Disse, por exemplo, que a agência Moddy’s rebaixou a nota da Petrobras por falta de conhecimento do que se faz na companhia. Ora, todo mundo sabe o que se passa lá — e ninguém acha que vai bem.
Acrescente a isso a lista de Janot — a relação de políticos investigados ou denunciados na Lava-jato, que está para sair, e se vê o potencial de impacto na vida política.
Quem mesmo queria acabar com a Petrobras? Ou com o país?
27 de fevereiro de 2015
Carlos Alberto Sardenberg, O Globo
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