“Qualquer deputado pode pedir à Mesa da Câmara a abertura de processo [de impeachment] contra o presidente da República. Dizer que isso é golpe é falta de assunto.” A frase não é de um tucano em busca do 3º turno, mas de um petista insuspeito.
Ela foi articulada por José Dirceu em 1999, quando o PT liderava um movimento para afastar o então recém-reeleito Fernando Henrique Cardoso, que, como Dilma, perpetrara um estelionato eleitoral ao manipular o câmbio em favor de sua candidatura.
Trago essas incômodas lembranças numa tentativa de flagrar o militante, petista ou tucano, no ato de aplicar pesos diferentes à mesma medida. Se deixarmos de lado a paixão política para tentar pensar os conceitos com rigor, teremos de concordar com Dirceu.
O impeachment é o contrário de um golpe. Trata-se de um mecanismo constitucionalmente previsto que pode ser utilizado para sair de certas crises. Embora seja um processo traumático, é certamente preferível a tanques nas ruas.
Como toda relíquia institucional, o impeachment encerra ambiguidades. Ele surgiu na Inglaterra medieval como um procedimento penal. Para que seja aplicado, a autoridade precisa ser acusada de um “crime de responsabilidade”.
Mas a definição do que seja esse tal de crime de responsabilidade é suficientemente aberta para comportar qualquer coisa, o que permite que o instituto seja utilizado como instrumento político.
REVOGAÇÃO DE MANDATO
Na prática, o impeachment é um mecanismo de revogação de mandato travestido de trâmite judicial. Seria legal trocá-lo pelo mais moderno recall de voto, que existe na Venezuela e em porções dos EUA, mas é improvável que legisladores transfiram à população um poder que hoje é seu.
Quanto a Dilma, não creio que ela será afastada nem o desejo. É sempre mais didático quando o governante conclui seu mandato. É nessas horas que o eleitor decide se vai ou não rejeitar as políticas por ele adotadas.
Hélio Schwartsman
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