Ele faz um cálculo pelo valor médio das contas de luz e conclui que cada brasileiro pagará o equivalente a 17 contas a mais até 2017.
A crise, segundo ele, foi em parte criada pelas decisões erradas do governo.
O Brasil tem 75 milhões de unidades consumidoras, em residências, empresas e serviço público. Segundo a Aneel, a fatura média é de R$ 100 no geral; na conta residencial é de R$ 50. Com base nisso, Fróes calcula que, se for feito o rateio do rombo, cada residência estaria devendo R$ 880 para pagar sua parte dessa conta bilionária. Ou seja, 17 meses de contas de luz.
— Sabe o que pode ser feito com R$ 66,5 bilhões? A duplicação da “rodovia da morte", a BR-381, tem um orçamento de R$ 4 bilhões. Poderia ser duplicada 16 vezes. Poderia ser feita sete vezes a transposição do Rio São Francisco. Daria para pagar três anos de Bolsa Família ou para fazer duas vezes todas as obras prometidas para a Copa do Mundo.
Estamos em grave estresse hídrico, mas essa crise não foi causada apenas pela falta de chuva. A conta está subindo pelos desequilíbrios do ano passado, quando choveu normalmente. O setor, porém, foi desorganizado pela MP que antecipou o fim de contratos de concessão e baixou o preço da energia. Os reajustes recentes já anularam a redução e, nos próximos três anos, o consumidor vai pagar pela crise de 2014.
— O governo poderia ter feito uma campanha para diminuir apenas 5% do consumo de energia. Isso reduziria a necessidade de geração térmica em 3.200 MW médios. O custo mensal da geração térmica cairia de R$ 3,7 bilhões para R$ 2,25 bilhões. Uma economia de R$ 1,45 bilhão por mês. Se isso ocorresse de janeiro de 2013 até agosto de 2014, 20 meses, a economia seria de R$ 29 bilhões.
Um estudo mostrou que os aparelhos eletrônicos em stand-by podem representar 15% dos gastos residenciais. Se houvesse uma campanha para desligar esses equipamentos nas casas haveria uma queda de 4,2% do consumo total do Sistema Integrado Nacional.
Poderia também ter sido adotado o sistema de bandeiras tarifárias, que funciona assim: quando as condições hidrológicas ficam menos favoráveis, aciona-se a bandeira amarela, que aumenta em 5% a conta de luz; se a situação é grave, e todas as térmicas são ligadas, aciona-se a bandeira vermelha que implica em aumentar em 10% a tarifa. Os reajustes são revogados quando a situação volta ao normal. Começaria em 2014, mas o governo adiou por causa da eleição.
Se o sistema estivesse em vigor, a bandeira amarela teria sido acionada em janeiro; a vermelha de fevereiro a julho deste ano — meses em que choveu pouco. As distribuidoras teriam arrecadado R$ 543 milhões em janeiro e R$ 6 bilhões entre fevereiro a julho. Isso reduziria o total dos empréstimos que as elas tiveram que tomar — R$ 17,7 bilhões ao todo — e que serão pagos, com os devidos juros, pelo consumidor nos próximos três anos.
Outro erro de gestão foi o governo deixar as distribuidoras com exposição involuntária ao mercado livre. O mesmo governo tentou forçar preços irreais em quatro leilões. Eles fracassaram. As distribuidoras entraram no ano sem ter comprado toda a energia que teriam que entregar. Com a falta de chuva o preço no mercado à vista explodiu e elas tiveram que comprar energia até a R$ 822 para vender a R$ 120.
Tem ainda o problema das geradoras. Há um mecanismo que permite que geradoras comprem energia de outras a custo baixo quando o nível do reservatório cai. O problema é que os reservatórios baixaram em todo o Sudeste e Centro-Oeste. Não havia de quem comprar. Elas tiveram que ir ao mercado à vista para cumprir seus contratos e só no segundo semestre de 2014 ficaram com um rombo de R$ 18 bilhões.
Houve falta de chuva em 2014, mas a crise tem outros motivos. A tentativa de derrubar o preço na marra, o adiamento do sistema de bandeiras tarifárias, a falta de campanhas para economizar eletricidade e o erro ao negociar oferta e demanda de energia criaram o curto-circuito no setor elétrico que vai para o nosso bolso nos próximos anos. É a pesada herança elétrica que começará a ser paga no ano que vem.
15 de outubro de 2014
Miriam Leitão - O Globo
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