Auxílio-moradia é chicana salarial que não se coaduna com atividades cujo fim é zelar pelo respeito à lei e à moralidade pública
Atinge cerca de R$ 1 bilhão por ano o impacto previsto das decisões em que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) concedem auxílio-moradia a quase todos os 16,4 mil juízes e 12,2 mil procuradores do país.
A espantosa cifra resulta, curiosamente, de iniciativa para limitar, em tese, excessos verificados na distribuição desse benefício. É que em Estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Mato Grosso, o subsídio para magistrados chegava às raias da extravagância.
Trinta dias num hotel quatro estrelas em Cuiabá, segundo um conhecido site turístico, custam aproximadamente R$ 6.600. Um juiz mato-grossense recebia até R$ 9.837 mensais para garantir o próprio teto, caso se estabelecesse em alguma comarca distante.
Concurso aberto em janeiro estipula R$ 19,5 mil de vencimentos para um juiz substituto em Mato Grosso. Não seria o suficiente para que, como ocorre a qualquer profissional, seus gastos com moradia estivessem contemplados? E o que dizer dos R$ 25 mil que, na média, percebem os juízes federais?
Abuso, certamente. Era preciso dar fim à liberalidade. Tomou-se, então, a decisão bizarra. O auxílio-moradia foi restrito a uma quantia máxima de R$ 4.377. O critério foi a provisão oferecida pelo Supremo Tribunal Federal. Com um detalhe, no entanto --ou melhor, dois.
O primeiro é que se autorizam gratificações nos diversos Estados em que elas inexistiam. A projetada diminuição no "quantum" de privilégio para magistrados teve como efeito permitir que o despudor se generalize --mesmo quem possua imóvel na cidade fará jus à vantagem, nem sendo necessário apresentar recibo de aluguel.
O segundo detalhe é que, numa operação conjunta, os órgãos controladores do Ministério Público e da magistratura acertaram o mesmo limite de gastos, estendendo assim a oportunidade para um grande contingente de promotores.
Poderia ser pior? Sem dúvida. Afastou-se, mas sempre cabe temer recursos nesse sentido, a tese de que poderiam ser retroativos os pagamentos de auxílio-moradia a quem não os auferiu até esta data.
Saiu perdendo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que procurou restringir o instituto aos casos em que os beneficiários trabalhem em locais distantes de sua residência habitual.
Não estava em suas mãos o que se poderia chamar, jocosamente, de "domínio do teto". Conseguiu-se elevar de forma artificial, sem controle sequer sobre a real destinação dos recursos oferecidos, os salários de juízes e procuradores, para além do limite legal.
Nada contra que recebam remuneração condigna. Mas o sistema do auxílio-moradia, numa óbvia chicana salarial, não se coaduna com atividades cujo fim é precisamente o de zelar pelo respeito à lei e à moralidade pública.
Atinge cerca de R$ 1 bilhão por ano o impacto previsto das decisões em que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) concedem auxílio-moradia a quase todos os 16,4 mil juízes e 12,2 mil procuradores do país.
A espantosa cifra resulta, curiosamente, de iniciativa para limitar, em tese, excessos verificados na distribuição desse benefício. É que em Estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Mato Grosso, o subsídio para magistrados chegava às raias da extravagância.
Trinta dias num hotel quatro estrelas em Cuiabá, segundo um conhecido site turístico, custam aproximadamente R$ 6.600. Um juiz mato-grossense recebia até R$ 9.837 mensais para garantir o próprio teto, caso se estabelecesse em alguma comarca distante.
Concurso aberto em janeiro estipula R$ 19,5 mil de vencimentos para um juiz substituto em Mato Grosso. Não seria o suficiente para que, como ocorre a qualquer profissional, seus gastos com moradia estivessem contemplados? E o que dizer dos R$ 25 mil que, na média, percebem os juízes federais?
Abuso, certamente. Era preciso dar fim à liberalidade. Tomou-se, então, a decisão bizarra. O auxílio-moradia foi restrito a uma quantia máxima de R$ 4.377. O critério foi a provisão oferecida pelo Supremo Tribunal Federal. Com um detalhe, no entanto --ou melhor, dois.
O primeiro é que se autorizam gratificações nos diversos Estados em que elas inexistiam. A projetada diminuição no "quantum" de privilégio para magistrados teve como efeito permitir que o despudor se generalize --mesmo quem possua imóvel na cidade fará jus à vantagem, nem sendo necessário apresentar recibo de aluguel.
O segundo detalhe é que, numa operação conjunta, os órgãos controladores do Ministério Público e da magistratura acertaram o mesmo limite de gastos, estendendo assim a oportunidade para um grande contingente de promotores.
Poderia ser pior? Sem dúvida. Afastou-se, mas sempre cabe temer recursos nesse sentido, a tese de que poderiam ser retroativos os pagamentos de auxílio-moradia a quem não os auferiu até esta data.
Saiu perdendo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que procurou restringir o instituto aos casos em que os beneficiários trabalhem em locais distantes de sua residência habitual.
Não estava em suas mãos o que se poderia chamar, jocosamente, de "domínio do teto". Conseguiu-se elevar de forma artificial, sem controle sequer sobre a real destinação dos recursos oferecidos, os salários de juízes e procuradores, para além do limite legal.
Nada contra que recebam remuneração condigna. Mas o sistema do auxílio-moradia, numa óbvia chicana salarial, não se coaduna com atividades cujo fim é precisamente o de zelar pelo respeito à lei e à moralidade pública.
15 de outubro de 2014
Folha de S.Paulo
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