Dos inesperados dos últimos tempos, um deles é a manifestação no Brasil contra o futebol. Estamos em plena era do tudo pode acontecer, mas essa é realmente espantosa. O país não deixou de, em sua maioria, gostar do esporte e vibrar, ainda mais quando é Copa do Mundo. Mas estamos a um mês do evento que será no Brasil e, em vez de a torcida aumentar, cresce a tensão.
Foi um motorista de táxi que me alertou outro dia para uma ausência. Ele perguntou se eu sentia falta de alguma coisa relacionada à disputa do mundial. Ele mesmo respondeu, com uma pergunta:
— Você tem visto ruas pintadas de verde e amarelo? Bandeirolas penduradas? Bandeira nas janelas? Está esquisito, este país.
Na verdade, não tinha notado essa ausência. Talvez porque seja cedo, pela perspectiva brasileira. Um mês é um tempo enorme para o país começar a se enfeitar, mas o grande problema é a bronca contra a Copa, em si. Em junho passado, o Brasil estava ganhando a disputa das Confederações e a população, nas ruas, em eloquentes protestos. Houve um dia que a multidão cercou o Maracanã e não era para comemorar a vitória do time brasileiro lá dentro.
Difícil repetir os eventos de junho de 2013 na mesma dimensão, porque agora, com medo da violência, as famílias ficarão em casa. O que houve de forte em junho foi o fato de que brasileiros de todas as idades foram juntos para as ruas demonstrar insatisfação contra tudo o que as incomodava. Não necessariamente eram as mesmas bandeiras e por isso os cartazes levantavam temas diferentes.
Há uma insatisfação contra a qualidade dos serviços públicos, as dificuldades da mobilidade urbana, os preços que sobem, a corrupção, os sobre preços nas obras, os descumprimentos dos prazos das empreiteiras e das promessas dos governantes. E há um desconforto com os efeitos colaterais das obras nas grandes cidades.
A construção da linha 4 do Metrô no Rio deixa há muito tempo os moradores da Zona Sul em sobressaltos. Nas explosões para o projeto avançar, janelas sacodem como nos pequenos tremores de terra. E o caso do buraco no chão que surgiu na Rua Barão da Torre é a concretização do medo de todos os moradores: o de que, numa cidade construída com aterros e em terreno arenoso, o bombardeio de pedras subterrâneas tire a sustentação do chão.
Há também o aproveitamento pelo movimento grevista da necessidade premente de que tudo funcione. Na última quinta-feira, a cidade do Rio virou do avesso com greves, manifestações e ataques a ônibus. Ontem, o dia já começou com falta generalizada nos serviços porque trabalhadores não conseguiram chegar ao seu local de trabalho.
Manifestação é parte da democracia e assim é visto por cidadãos de países onde há liberdade de expressão, mas se as greves e manifestações produzirem muitos problemas de locomoção, muito transtorno para brasileiros e visitantes, o Brasil terá dificuldade de realizar um bom evento. Já se sabe que por erros de planejamento e gestão haverá risco de que muita coisa dê errado.
É inesperado que um mês antes da Copa, realizada no Brasil pela primeira vez desde 1950, o que se tem de mais forte não é a torcida pela vitória da seleção, mas sim uma enorme tensão no ar.
Quando o Brasil ganhou a disputa para sediar a Copa do Mundo e as Olimpíadas o clima era de festa porque os eventos poderiam ser usados para induzir investimentos há muito tempo necessários. Agora a sensação é de uma inversão de prioridades no país. O que é fundamental tem sido deixado de lado pelas obras nos estádios e alguns nem prontos estão. Vamos atravessar o mês dos jogos com um olho nos gramados e outro nas ruas, torcendo para que o direito de manifestação seja respeitado e a turma do Felipão nos traga o caneco.
Foi um motorista de táxi que me alertou outro dia para uma ausência. Ele perguntou se eu sentia falta de alguma coisa relacionada à disputa do mundial. Ele mesmo respondeu, com uma pergunta:
— Você tem visto ruas pintadas de verde e amarelo? Bandeirolas penduradas? Bandeira nas janelas? Está esquisito, este país.
Na verdade, não tinha notado essa ausência. Talvez porque seja cedo, pela perspectiva brasileira. Um mês é um tempo enorme para o país começar a se enfeitar, mas o grande problema é a bronca contra a Copa, em si. Em junho passado, o Brasil estava ganhando a disputa das Confederações e a população, nas ruas, em eloquentes protestos. Houve um dia que a multidão cercou o Maracanã e não era para comemorar a vitória do time brasileiro lá dentro.
Difícil repetir os eventos de junho de 2013 na mesma dimensão, porque agora, com medo da violência, as famílias ficarão em casa. O que houve de forte em junho foi o fato de que brasileiros de todas as idades foram juntos para as ruas demonstrar insatisfação contra tudo o que as incomodava. Não necessariamente eram as mesmas bandeiras e por isso os cartazes levantavam temas diferentes.
Há uma insatisfação contra a qualidade dos serviços públicos, as dificuldades da mobilidade urbana, os preços que sobem, a corrupção, os sobre preços nas obras, os descumprimentos dos prazos das empreiteiras e das promessas dos governantes. E há um desconforto com os efeitos colaterais das obras nas grandes cidades.
A construção da linha 4 do Metrô no Rio deixa há muito tempo os moradores da Zona Sul em sobressaltos. Nas explosões para o projeto avançar, janelas sacodem como nos pequenos tremores de terra. E o caso do buraco no chão que surgiu na Rua Barão da Torre é a concretização do medo de todos os moradores: o de que, numa cidade construída com aterros e em terreno arenoso, o bombardeio de pedras subterrâneas tire a sustentação do chão.
Há também o aproveitamento pelo movimento grevista da necessidade premente de que tudo funcione. Na última quinta-feira, a cidade do Rio virou do avesso com greves, manifestações e ataques a ônibus. Ontem, o dia já começou com falta generalizada nos serviços porque trabalhadores não conseguiram chegar ao seu local de trabalho.
Manifestação é parte da democracia e assim é visto por cidadãos de países onde há liberdade de expressão, mas se as greves e manifestações produzirem muitos problemas de locomoção, muito transtorno para brasileiros e visitantes, o Brasil terá dificuldade de realizar um bom evento. Já se sabe que por erros de planejamento e gestão haverá risco de que muita coisa dê errado.
É inesperado que um mês antes da Copa, realizada no Brasil pela primeira vez desde 1950, o que se tem de mais forte não é a torcida pela vitória da seleção, mas sim uma enorme tensão no ar.
Quando o Brasil ganhou a disputa para sediar a Copa do Mundo e as Olimpíadas o clima era de festa porque os eventos poderiam ser usados para induzir investimentos há muito tempo necessários. Agora a sensação é de uma inversão de prioridades no país. O que é fundamental tem sido deixado de lado pelas obras nos estádios e alguns nem prontos estão. Vamos atravessar o mês dos jogos com um olho nos gramados e outro nas ruas, torcendo para que o direito de manifestação seja respeitado e a turma do Felipão nos traga o caneco.
16 de maio de 2014
Miriam Leitão, O Globo
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