1 Armínio Fraga chegou a dizer que momento da economia é de grave perigo
Quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso entrou no Cine Cultura ontem pela manhã, em São Paulo, para a abertura do seminário organizado pelo seu instituto para comemorar os 20 anos do Plano Real, ninguém aplaudiu de imediato. Foi preciso que o ex-ministro José Gregori, com seu vozeirão, puxasse as palmas, reclamando de pé: Ninguém aplaude. Que partido é este? O auditório então veio abaixo.
Na verdade, todos ali se conheciam de longa data e Fernando Henrique já desfilara pelo Conjunto Nacional posando para fotos, dando autógrafos ou simplesmente trocando dois dedos de prosa. O sucesso foi tão grande que, inicialmente marcado para o Teatro Eva Herz da Livraria Cultura, teve que se transferir para o Cine Cultura, e ainda sobrou gente que viu os debates num telão montado no teatro.
O evento também não era um acontecimento partidário, embora todos fossem unânimes em destacar a sorte de um aniversário redondo do Plano Real cair justamente no ano eleitoral mais favorável de tantos que já transcorreram desde que o PSDB deixou o poder, em 2002. Estavam otimistas os tucanos, especialmente depois da derrota que o governo sofrera na noite anterior na Câmara.
Na verdade ontem se comemoravam os 20 anos da implantação da URV, que deu partida ao Plano Real. O aniversário do plano propriamente dito acontecerá mais adiante e será devidamente festejado também. Ao contrário do PT, o PSDB não gosta de, ou não sabe, transformar seminários como esse em atos partidários, embora o tom de vários dos pronunciamentos, como o do ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, tenha sido mais político que econômico.
Malan chegou mesmo a retomar uma crítica indireta que o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga fizera, para dar nome aos bois. Armínio, que vocalizou mais pessimismo entre os debatedores, chegando a dizer que o momento da economia é de grave perigo , defendeu a tese de que, entre outras medidas necessárias, seria preciso que os gastos do governo crescessem menos que o PIB, lembrando, entre sorrisos, que essa proposta já havia sido feita antes por Antonio Palocci quando era ministro da Fazenda, sem resultados.
Coube a Malan explicitar o que toda a plateia sabia: fora a presidente Dilma, quando chefe da Casa Civil, quem vetara a proposta, taxando-a de rudimentar , afirmando em uma entrevista que gasto é vida . Todos os palestrantes chamaram a atenção para a urgência da retomada das bases originais da política econômica gerada pelo Plano Real, com o controle da inflação e o reequilíbrio das contas públicas.
Malan ressaltou a certa altura que a gravidade do momento exigiria um mínimo de boa-fé e honestidade intelectual para a busca de soluções, abandonando-se rotulagens destituídas de significado para estimular formas estereotipadas de não pensar .
A sintonia entre os antigos membros da equipe econômica do governo Fernando Henrique era tão grande que Edmar Bacha, ex-presidente do BNDES e do IBGE e ex-assessor econômico da Presidência, brincou com André Lara Resende a seu lado: Está tudo tão combinado que só falta agora voltar ao poder.
O economista André Lara Resende hoje é um dos principais colaboradores da ex-senadora Marina Silva e, por extensão, da candidatura do governador Eduardo Campos, assim como o economista Gianetti da Fonseca, que também foi um dos palestrantes.
Como sempre, coube ao ex-presidente Fernando Henrique fazer uma análise das questões econômicas com um ponto de vista mais político, especialmente quando abordou os reflexos do momento atual para o futuro do país. Para ele, o país passa por um momento semelhante ao de 20 anos atrás, quando havia um anseio na sociedade para que algo fosse feito para conter a hiperinflação. Estamos em um novo momento desses, alguma mudança mais profunda tem de ocorrer , comentou o ex-presidente, afirmando que o Brasil perdeu o rumo .
Para Fernando Henrique, as manifestações de junho do ano passado são um sintoma interessante do mal-estar que domina o país. Ele considera que a sociedade está à espera de uma liderança que mostre os novos rumos e a convença de que somos capazes de enfrentar o futuro com um projeto de país. O nosso futuro depende do salto da quantidade para a qualidade. Isso é o que as pessoas desejam: melhor qualidade de vida .
13 de março de 2014
Merval Pereira, O Globo
2 Malan ressaltou que momento exigiria um mínimo de boa-fé e honestidade intelectual para a busca de soluções
3 Para FH, o país passa por momento semelhante ao de 20 anos atrás, quando havia um anseio na sociedade para que algo fosse feito para conter a hiperinflação
Quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso entrou no Cine Cultura ontem pela manhã, em São Paulo, para a abertura do seminário organizado pelo seu instituto para comemorar os 20 anos do Plano Real, ninguém aplaudiu de imediato. Foi preciso que o ex-ministro José Gregori, com seu vozeirão, puxasse as palmas, reclamando de pé: Ninguém aplaude. Que partido é este? O auditório então veio abaixo.
Na verdade, todos ali se conheciam de longa data e Fernando Henrique já desfilara pelo Conjunto Nacional posando para fotos, dando autógrafos ou simplesmente trocando dois dedos de prosa. O sucesso foi tão grande que, inicialmente marcado para o Teatro Eva Herz da Livraria Cultura, teve que se transferir para o Cine Cultura, e ainda sobrou gente que viu os debates num telão montado no teatro.
O evento também não era um acontecimento partidário, embora todos fossem unânimes em destacar a sorte de um aniversário redondo do Plano Real cair justamente no ano eleitoral mais favorável de tantos que já transcorreram desde que o PSDB deixou o poder, em 2002. Estavam otimistas os tucanos, especialmente depois da derrota que o governo sofrera na noite anterior na Câmara.
Na verdade ontem se comemoravam os 20 anos da implantação da URV, que deu partida ao Plano Real. O aniversário do plano propriamente dito acontecerá mais adiante e será devidamente festejado também. Ao contrário do PT, o PSDB não gosta de, ou não sabe, transformar seminários como esse em atos partidários, embora o tom de vários dos pronunciamentos, como o do ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, tenha sido mais político que econômico.
Malan chegou mesmo a retomar uma crítica indireta que o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga fizera, para dar nome aos bois. Armínio, que vocalizou mais pessimismo entre os debatedores, chegando a dizer que o momento da economia é de grave perigo , defendeu a tese de que, entre outras medidas necessárias, seria preciso que os gastos do governo crescessem menos que o PIB, lembrando, entre sorrisos, que essa proposta já havia sido feita antes por Antonio Palocci quando era ministro da Fazenda, sem resultados.
Coube a Malan explicitar o que toda a plateia sabia: fora a presidente Dilma, quando chefe da Casa Civil, quem vetara a proposta, taxando-a de rudimentar , afirmando em uma entrevista que gasto é vida . Todos os palestrantes chamaram a atenção para a urgência da retomada das bases originais da política econômica gerada pelo Plano Real, com o controle da inflação e o reequilíbrio das contas públicas.
Malan ressaltou a certa altura que a gravidade do momento exigiria um mínimo de boa-fé e honestidade intelectual para a busca de soluções, abandonando-se rotulagens destituídas de significado para estimular formas estereotipadas de não pensar .
A sintonia entre os antigos membros da equipe econômica do governo Fernando Henrique era tão grande que Edmar Bacha, ex-presidente do BNDES e do IBGE e ex-assessor econômico da Presidência, brincou com André Lara Resende a seu lado: Está tudo tão combinado que só falta agora voltar ao poder.
O economista André Lara Resende hoje é um dos principais colaboradores da ex-senadora Marina Silva e, por extensão, da candidatura do governador Eduardo Campos, assim como o economista Gianetti da Fonseca, que também foi um dos palestrantes.
Como sempre, coube ao ex-presidente Fernando Henrique fazer uma análise das questões econômicas com um ponto de vista mais político, especialmente quando abordou os reflexos do momento atual para o futuro do país. Para ele, o país passa por um momento semelhante ao de 20 anos atrás, quando havia um anseio na sociedade para que algo fosse feito para conter a hiperinflação. Estamos em um novo momento desses, alguma mudança mais profunda tem de ocorrer , comentou o ex-presidente, afirmando que o Brasil perdeu o rumo .
Para Fernando Henrique, as manifestações de junho do ano passado são um sintoma interessante do mal-estar que domina o país. Ele considera que a sociedade está à espera de uma liderança que mostre os novos rumos e a convença de que somos capazes de enfrentar o futuro com um projeto de país. O nosso futuro depende do salto da quantidade para a qualidade. Isso é o que as pessoas desejam: melhor qualidade de vida .
13 de março de 2014
Merval Pereira, O Globo
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