José Dirceu atravessa seus primeiros dias de cárcere como se fosse um personagem de desenho animado —desses que, quando acaba o chão, continuam caminhando no vazio e só caem quando se dão conta de que pisam em nada. Desde a decretação de sua prisão, em 15 de novembro, o ex-número 2 do PT ainda não olhou para baixo.
Político preso, Dirceu se autoproclamou preso político. Detento do semiaberto, saiu-se com um contrato de ‘trabalho’ de R$ 20 mil mensais. Empregou-se num hotel cujo suposto proprietário, homem de rádios e tevês, tem na proximidade com o poder seu principal capital social. Em poucos dias, descobriu-se que o empregador de Dirceu habita um mundo em que ‘laranja’ há muito deixou de ser uma reles fruta.
Expostos os pés de barro do neopatrão, Dirceu ergueu o queixo e mandou seus advogados divulgarem uma nota. No texto, “renuncia à oferta de emprego”. Para não perder o hábito, queixa-se do “linxamento midiático”. Acha injusto que outras pessoas sejam “transformadas em alvo de ódio e perseguição” por terem sido generosas com ele.
Por sorte, a bondade do brasileiro é infinita. Uma ONG de amparo a presidiários ofereceu emprego a Dirceu e seus dois companheiros do núcleo político do mensalão. O salário é menor: R$ 508 mensais. Mas não há laranjas no cesto. Se topar, Dirceu vai supervisionar a fabricação de piso de concreto por outros presos.
No ofício que enviou ao STF, a entidade explicou que Delúbio, ex-gestor de arcas partidárias, sofrerá algumas restrições. “Não demostrou a nosso ver nenhuma habilidade em outras funções senão a de tesoureiro do partido político.” Nesse posto, anotou a ONG, Delúbio mostrou “não ser de confiança” para o exercício de funções administrativas. “Por este motivo, lhe ofereceremos o cargo de assistente de marcenaria.”
Quanto a José Genoino, a cooperativa de presos levou em conta seu estado de saúde. Como não pode fazer grandes esforços, o ex-presidente do PT teria a atribuição de costurar bolas de futebol. A atividade não impõe “nenhum esforço físico”, anota o ofício. E proporciona ao preso uma renda de R$ 5 por bola.
Não se sabe, por ora, se Dirceu aceitará cuidar da fabricação de piso de concreto em troca de remuneração equivalente a 75% do salário mínimo. Parece improvável. No dicionário de Dirceu não há o vocábulo piso, só teto. Na sua realidade de animação, o preso mais ilustre do mensalão fez um novo pedido à Vara de Execuções Penais de Brasília.
Mesmo no xiloindró, Dirceu deseja obter autorização para atualizar seu blog periodicamente. Repetindo: o preso quer laptop, banda larga de internet e liberdade para fazer política na rede. Mais: quer receber jornais e revistas. Não é só: acha que pode dar entrevistas.
Dirceu atravessa seu abismo sem fazer concessões à realidade. Enquanto caminha sobre o vazio, tenta de tudo sem perceber que tudo já não quer nada com ele. O detendo ainda não enxergou o tom acinzentado do chão da cela. Dirceu demora a olhar para baixo
06 de dezembro de 2013
Blog do Josias - UOL
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