Diante do descalabro nas contas públicas, o resultado de 2017 chega a ser heroico, embora também tenha sido um déficit. Mas o relativo êxito é tópico, devido à Previdência
Se forem considerados o tamanho da crise fiscal e sua evolução, principalmente a partir de 2015, a recuperação relativa das contas públicas no ano passado chega a ser heroica. Embora, dada a gravidade do quadro, a União tenha encerrado mais um ano com um déficit bilionário, de R$ 124,4 bilhões, ele foi R$ 34,6 bilhões inferior à meta de R$ 159 bilhões.
O feito tem vários aspectos relevantes. Um deles, que o esforço de contenção de gastos do governo foi recompensado. Outro, que chegaram em bom momento receitas extraordinárias — de leilões de hidrelétricas e na área de petróleo, e o Refis. Sendo oportuno comentar, no entanto, que são receitas, como diz o termo, que não se repetem no futuro. Portanto, para que seja mantido sob controle o quadro fiscal, elas precisam ser substituídas por imposto, outras rendas extras ou corte de gastos.
Seja como for, o horizonte deste ano ficou bem mais claro. A ponto de o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, ontem, no evento “E Agora, Brasil?”, promovido pelo GLOBO, ter demonstrado relativa despreocupação com o cumprimento em 2018 da regra de ouro — é vetado pela Constituição emitir títulos de dívida para financiar gastos de custeio.
Outra limitação constitucional é o teto de gastos, obedecido no ano passado, e o será certamente neste. Mas, quanto a 2019, primeiro ano do próximo governo, continua o nevoeiro.
A questão é que o êxito de 2017 não significa que a questão fiscal foi resolvida, longe disso, porque o grande indutor de déficits públicos continua sem controle, a Previdência. E sem que ela comece a ser reformada — éo que se verá no dia 19 de fevereiro na Câmara —, nada feito. O Tesouro continuará em marcha batida para a insolvência. No ano passado, a despesa total da União cresceu abaixo da inflação, chegando a cair 1% em termos reais. Mas nada garante que o resultado se repetirá. Ao contrário.
O governo ganhou uma folga para este ano, mas será anunciado em breve um contingenciamento orçamentário na faixa dos R$ 20 bilhões. Haverá cortes. Não é uma contradição, porque, como chamou a atenção a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, o país, pelo quarto ano consecutivo, teve déficit primário, desta vez de 1,9%, inferior aos 2,5% de 2016, mas déficit do mesmo jeito.
Por isso, o peso da dívida pública em relação ao PIB, na faixa dos 75%, continua escalando — há quatro anos, era 50%. No bloco de economias emergentes, de que o Brasil faz parte, os índices são de cerca de 45%. O país está bastante fora da curva.
Tudo porque a Previdência, o maior gasto obrigatório, não para de ficar mais dispendiosa. O bom resultado de 2017, portanto, em vez de funcionar como um calmante, deve aumentar o sentido de urgência com que a reforma previdenciária precisa ser tratada no Congresso. Quem aspira a ser governo em 2019, por exemplo, tem de se preocupar com isso.
31 de janeiro de 2018
Editorial O Globo
Se forem considerados o tamanho da crise fiscal e sua evolução, principalmente a partir de 2015, a recuperação relativa das contas públicas no ano passado chega a ser heroica. Embora, dada a gravidade do quadro, a União tenha encerrado mais um ano com um déficit bilionário, de R$ 124,4 bilhões, ele foi R$ 34,6 bilhões inferior à meta de R$ 159 bilhões.
O feito tem vários aspectos relevantes. Um deles, que o esforço de contenção de gastos do governo foi recompensado. Outro, que chegaram em bom momento receitas extraordinárias — de leilões de hidrelétricas e na área de petróleo, e o Refis. Sendo oportuno comentar, no entanto, que são receitas, como diz o termo, que não se repetem no futuro. Portanto, para que seja mantido sob controle o quadro fiscal, elas precisam ser substituídas por imposto, outras rendas extras ou corte de gastos.
Seja como for, o horizonte deste ano ficou bem mais claro. A ponto de o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, ontem, no evento “E Agora, Brasil?”, promovido pelo GLOBO, ter demonstrado relativa despreocupação com o cumprimento em 2018 da regra de ouro — é vetado pela Constituição emitir títulos de dívida para financiar gastos de custeio.
Outra limitação constitucional é o teto de gastos, obedecido no ano passado, e o será certamente neste. Mas, quanto a 2019, primeiro ano do próximo governo, continua o nevoeiro.
A questão é que o êxito de 2017 não significa que a questão fiscal foi resolvida, longe disso, porque o grande indutor de déficits públicos continua sem controle, a Previdência. E sem que ela comece a ser reformada — éo que se verá no dia 19 de fevereiro na Câmara —, nada feito. O Tesouro continuará em marcha batida para a insolvência. No ano passado, a despesa total da União cresceu abaixo da inflação, chegando a cair 1% em termos reais. Mas nada garante que o resultado se repetirá. Ao contrário.
O governo ganhou uma folga para este ano, mas será anunciado em breve um contingenciamento orçamentário na faixa dos R$ 20 bilhões. Haverá cortes. Não é uma contradição, porque, como chamou a atenção a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, o país, pelo quarto ano consecutivo, teve déficit primário, desta vez de 1,9%, inferior aos 2,5% de 2016, mas déficit do mesmo jeito.
Por isso, o peso da dívida pública em relação ao PIB, na faixa dos 75%, continua escalando — há quatro anos, era 50%. No bloco de economias emergentes, de que o Brasil faz parte, os índices são de cerca de 45%. O país está bastante fora da curva.
Tudo porque a Previdência, o maior gasto obrigatório, não para de ficar mais dispendiosa. O bom resultado de 2017, portanto, em vez de funcionar como um calmante, deve aumentar o sentido de urgência com que a reforma previdenciária precisa ser tratada no Congresso. Quem aspira a ser governo em 2019, por exemplo, tem de se preocupar com isso.
31 de janeiro de 2018
Editorial O Globo
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