No Brasil, infelizmente, certas desgraças vêm para ficar, fazem ninho, dão cria e são zelosamente nutridas; algumas têm fã clube e vivem sob a proteção da tesouraria. ”E as soluções?”, perguntará o leitor mais proativo. Pois é, meu caro, aí é que está. Nosso país não tem compromisso com soluções, mas com problemas. Quanto maior for a encrenca, mais sólida será a adesão nacional àquilo que lhe dá causa.
A alavanca com a qual Arquimedes afirmou que poderia mover a Terra se lhe dessem um ponto de apoio não serve para o Brasil. Parece não haver braço de alavanca nem ponto de apoio capazes de abalar a inércia nacional em relação a suas principais dificuldades. Em compensação, por aqui, nada é mais sólido do que uma boa conversa mole, que se resume em encontrar razões para deixar tudo como está.
PODER PÚBLICO – Os acontecimentos – sim, há fatos acontecendo – terríveis, assustadores, vexatórios, em nada alteram a alma do país. O poder público continua escrevendo o roteiro, dirigindo a peça, escolhendo os atores. E embolsando a bilheteria. Lê-se em toda parte que o Brasil tomará jeito quando os brasileiros aprenderem a votar, o padrão cultural e socioeconômico da sociedade avançar, houver menos pobres. Verdadeira mixórdia de causas e efeitos que transforma a borda do poço em opressivo horizonte.
Tome, por exemplo, a questão da insegurança pública. Apenas uma corrente de opinião muito minoritária, minúscula, é contra legislação penal mais rígida e penas que desestimulem a atividade criminosa. No entanto, o que está em vigor é o desencarceramento e a total leniência, inclusive para com crimes de maior potencial ofensivo. Por quê? “Porque só prender não resolve”, respondem, como se tal frase contivesse um argumento e refutasse a verdade esférica de que bandido preso perturba menos do que bandido solto.
PARLAMENTARISMO – O mesmo tipo de raciocínio, que quebra, na prática, a alavanca de Arquimedes, é usado quando se apresenta o parlamentarismo como ponto de apoio para resolver o problema institucional no Brasil. “Só isso não resolve”, repetem.
Claro que só isso não resolve! Precisamos, também, de alguma forma de voto distrital, de cláusula de barreira que reduza o número de partidos, de uma justiça mais disposta a julgar casos de corrupção e mau uso dos mandatos eletivo e de tudo, absolutamente tudo mais que a divergência queira incluir. Mas não bastará! Insatisfeitos, retornarão em ares de xeque mate: “No parlamentarismo, com esse Congresso, o chefe do governo vai ser alguém tipo Renan Calheiros ou Rodrigo Maia”.
Desculpem-me os eleitores de uns e de outros, mas não parece justa essa restrição num país que, por conta própria, elegeu Collor, reelegeu FHC, deu dois mandatos para Lula e outros dois para Dilma. Se é para usarmos o instituto da eleição direta para produzir resultados assim, continuo preferindo o parlamentarismo, no qual o eleito por via direta será apenas chefe de Estado e não exercerá, simultaneamente, a chefia de governo. No presidencialismo, “the winner takes it all”, como cantou Meryl Streep. O vencedor leva tudo; e leva mesmo.
NADA FUNCIONA – O que nosso presidencialismo chama de “instituições funcionando” é isso que você vê. É assim que elas “funcionam”, gerando crises sem solução, criando instabilidade política, retração das atividades econômicas, desconfiança externa e interna, e sérios danos à vida de todos. No parlamentarismo também existem conflitos e disputas, mas a facilidade com que os governos são substituídos estabiliza a democracia e produz uma vida política sem sobressaltos.
14 de junho de 2017
Percival Puggina
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