O referendo Brexit confunde o Brasil por não ser de direita ou esquerda, mas tratar de algo só discutido no Primeiro Mundo: o globalismo.
Brexit: o que você deve saber e a Globo News não conta
O referendo Brexit, que definiu que o Reino Unido não faz mais parte da União Européia, causou um choque nas hostes do jornalismo mundial. O Brasil, crente manjado de qualquer coisa que saia no editorial do New York Times, levou um susto com o resultado: os ingleses não querem fazer parte da UE.
Durante a cobertura do Brexit na Globo News, comentava-se com entusiasmo que a decisão de permanecer era praticamente certa. Que até mesmo Nigel Farage, o líder do UKIP, o partido eurocético a transformar a Inglaterra em um sistema de quatro partidos principais, que nunca é citado sem as palavras mentirosas “xenófobo”, “populista” ou “de extrema-direita”, teria admitido a derrota. Que Financial Times, The Guardian, Telegraph e tantos outros davam como certa a permanência do Reino Unido na zona de mando de Bruxelas.
A Inglaterra foi o país que inventou o governo mediado e vigiado pela imprensa – seus paparazzi e sua imprensa marrom de tablóides até hoje é famosa por expor os podres e a privacidade de governantes, da nobreza e de celebridades.
Quando o primeiro referendo britânico a respeito da União Européia foi aventado na década de 70, simplesmente todos os jornais das Ilhas Britânicas advogaram pelo voto pró-União Européia, exceto dois: The Morning Star e The Spectator. Para este Brexit, um outro jornal se uniu ao time: o Daily Mail.
Quando foi a última vez que uma revista com mais de um século de idade como a Spectator, com os maiores nomes do país que mais espalhou cultura e civilização pelo mundo, foi citada como fonte no jornalismo brasileiro?
Nas últimas quatro mais importantes eleições do Reino Unido, a Spectator adivinhou o resultado de todas, enquanto o país e o mundo inteiro apostavam no contrário. Que a Escócia permaneceria no Reino Unido. Que David Cameron seria reeleito (afirmavam que as chances eram pequenas, Cameron foi o Primeiro Ministro com mais votos para reeleição desde ninguém menos do que Winston Churchill). Que o Brexit teria como resultado a saída da União Européia. Nos três casos, apostaram na vitória da esquerda. Perderam, para padrões britânicos, de lavada. Na única vitória (óbvia) da esquerda, a Spectator já exibia na capa de seu site que não havia surpresa, pois fora fácil antever os resultados com a campanha catastrófica do concorrente Zac Goldsmith.
Quantos brasileiros ouvem o nome da melhor revista semanal do Reino Unido? Quantos sabem da sua existência? Para o tupiniquim, mesmo (ou especialmente) o universitário pesquisador bilíngue, é praticamente uma certeza de que o único jornal lido e respeitado na Terra de Sua Majestade é o The Guardian, que até no formato tenta copiar os tablóides de fofoca The Sun e The Mirror, com conteúdo ideológico de mesmo jaez. Um jornal tratado pelos ingleses com a mesma confiança que o Brasil tem pelos piores colunistas da Folha de S. Paulo. Ou pela Carta Capital. É só ver o quanto conseguiu influenciar no Brexit.
O rapaz infelizmente ainda não aprendeu português o suficiente. Ou é mau-caráter, né, vai saber.
Segundo a visão de sumidades do pensamento mundial como Cristiana Lôbo e J. K. Rowling, aqueles que não votaram por subjugar a Inglaterra aos burocratas não-eleitos da União Européia seriam “de extrema-direita”, racistas, xenófobos e radicais. Será uma visão válida? A globalização era criticada, justamente, pela esquerda na década de 90. Não há algo historicamente constituído que parece termos esquecido e que precisamos resgatar para interpretar os fatos?
Globalização e globalismo
No Primeiro Mundo, quando se discute sobre os grandes blocos econômicos, sobretudo a UE e as medidas da ONU pelo mundo, é comum que se fale sobre o globalismo, a verdadeira questão do Brexit. O termo é praticamente desconhecido no Brasil, que obedece caninamente à ONU sem nem saber disso. A palavra possui o total de zero referências em nosso noticiário. Formadores de opinião, intelectuais e professores universitários, à direita ou à esquerda, não sabem o que é o globalismo, se são globalistas ou não.
O entendimento histórico comum, não só no Brasil de Paulo Freire, mas da educação voltada para a tecnicidade da sociedade, é o de que houve uma disputa entre fascismo, socialismo e capitalismo na Segunda Guerra e na Guerra Fria, e de, com a extinção militar provisória do primeiro o descrédito do segundo, hoje vivemos num mundo globalizado e multipolar, com tendências razoavelmente conservadoras ou progressistas disputando terreno em blocos de livre comércio que promovem a democracia.
Na suposição de uma hipotética multipolarização, quais seriam de fato os vários pólos? Será que Bolívia, Grécia e Egito, ou mesmo Suíça, Qatar e Canadá, podem mesmo competir com a influência da América de Obama e da Rússia de Putin? Será que a Inglaterra tem mais poder como a Inglaterra através do Brexit ou como um voto eternamente derrotado na Comissão Européia?
Adicione-se a tal caldo o componente islâmico, que hoje pode ser considerado uma terceira força, e a massa do que nos ensinaram desanda de vez (vide o debate entre o filósofo conservador Olavo de Carvalho e “o cérebro de Putin”Alexandr Dugin sobre a Nova Ordem Mundial). Basta lembrar que, em uma lista recente das pessoas mais poderosas do mundo (da qual Dilma Rousseff saltou no abismo de 8.ª mulher mais poderosa do mundo para não comparecer entre as 100 mais), o homem mais poderoso da Europa foi considerado… Recep Erdogan, o presidente da Turquia, que mal faz parte da Europa.
A esquerda nas décadas de 80 e 90 era radicalmente contrária à globalização. Quem estudou até o início de 2000 lembra do pânico que palavras como “globalização”, “ALCA”, “FMI” e “acordo de livre comércio” causavam no que é hoje o PT, o PSOL, a Marina Silva, os professores de História, os especialistas de jornal. Por que todos inverteram o discurso e se preocupam tanto em chamar de “fascistas” e “racistas” quem possui ceticismo em relação à União Européia?
Em meados da década de 60, com a Guerra Fria no auge em diversas frentes, a intelectualidade do Ocidente já havia abandonado todas as esperanças de conter o avanço comunista. A questão não era se o comunismo seria possível globalmente, mas quando.
Para Karl Marx, a Revolução ocorreria espontaneamente, pelo materialismo histórico-dialético. Como já notara o filósofo Benedetto Croce, arqui-rival de Antonio Gramsci, em Materialismo Histórico E Economia Marxista, tal previsão nunca ocorreu, e os operários ganhavam cada vez mais a cada década no capitalismo.
Desde a Segunda Internacional, houve um racha entre os comunistas da velha guarda, das casernas e coturnos, que queriam a Revolução, e os então intitulados socialistas. Estes últimos não acreditavam mais na Revolução, preferindo criar partidos socialistas e chegar ao socialismo pelas vias democráticas. Controlando o Estado, poderiam criar direitos trabalhistas e aumentar impostos, até a atividade econômica ser abocanhada e unificada pelo Estado. Com 51% de impostos, o Estado poderia comprar empresas privadas, se tornando o maior agente econômico de um país, até criar o socialismo sem, supostamente, derramar uma gota de sangue. Desacreditados em 1889, ganharam força com a dissolução das monarquias européias após a Primeira Guerra, e começaram a criar Partidos Socialistas por todo o Ocidente. Leis para se comprar empresas privadas são criadas. A situação e a ideologia são facilmente reconhecíveis no Brasil de 2016, mas não é levada em conta para o Brexit.
Os capitalistas se assustam e, culturalmente, capitulam, financiando a Guerra Fria no front militar, mas fagocitando o ideário socialista em sua cultura. É a era da Escola de Frankfurt atacando a base familiar da sociedade, de Antonio Gramsci transformando tudo em propaganda partidária, de Foucault, Reich, Deleuze e do sex lib, do maio de 68 e do Woodstock. O único problema seria como causar a Revolução em países de capitalismo avançado (e não os bananeiros de Terceiro Mundo sonhando em se tornar a China), que não aceitariam de bom grado a estatização dos meios de produção.
Um grupo de capitalistas na América traça então um programa de reação. O principal nome era o economista austríaco e futuro Nobel de Economia Friedrich von Hayek, que, graças a tal pragmatismo, abdica de alguns princípios mais ortodoxos da Escola Austríaca de Economia de que faz parte. Como colaboradores, não teve economistas “austríacos”, mas os Chicago Boys de Milton Friedman, da Escola de Chicago.
O plano foi a chamada globalização da economia, aplicando um princípio hoje básico estudado por 9 em cada 10 economistas iniciantes em obras como a de Gregory Mankiw: se ao invés de um país produzir batatas e armas, um país que produza bem armas (diga-se, a Suíça) e outro que produza bem batatas (como a Inglaterra) especializarem-se cada qual em seu setor de excelência e trocar livremente com o outro país, ambos terão uma produção maior e enriquecerão mais e mais rapidamente do que se precisassem produzir tudo.
A economia setorizada torna todos os países mutuamente dependentes. Nada de Brexit até então. Onde antes havia o ranço nacionalista e o protecionismo que gerou a Primeira Guerra, a dependência econômica gerou a paz e uma fraternidade entre os povos europeus nunca antes vista. Confirmando inversamente a tese de Frédéric Bastiat, em A Lei: por onde não passa o comércio, passam soldados. Retirados os soldados, veio o comércio.
Com uma economia globalizada e setorizada, causando hiperprodução e um enriquecimento rápido e sem igual, não havia como ganhar eleições com Partidos Socialistas e “socializar os meios de produção”. O avanço do socialismo foi barrado por Friedrich von Hayek na economia e, militarmente, pelas 26 letras do artigo quinto do Tratado de Washington, que fundou a OTAN em 1949: “The Parties agree that an armed attack against one or more of them in Europe or North America shall be considered an attack against them all”. Um herói de quem seu professor de História nunca ouviu falar, mas odeia sem saber.
A história é integralmente desconhecida por aqueles que espumam “Eu estudei História!” com empáfia e bordões na internet, mas ela possui complicações que confundem nossa visão sobre o mundo hoje. Vide o Brexit.
A esquerda, que lutou contra “a globalização” até o início da década de 2000 (alguém se lembra de José Bové, que vinha ao Brasil de mãos dadas com o MST, tratorando McDonald’s pelo mundo?), mudou radicalmente (sic) o discurso contra os “neoliberais” (até hoje mal definidos), preferindo fingir que não tentou lutar contra a forma de economia que mais enriqueceu os pobres, com rapidez inacreditável até para os deslumbrados, em toda a história. E hoje pode criticar o Brexit à vontade, mesmo que o globalismo da UE não seja o Estado gigante que sempre sonhou.
Deturparam a União Européia
Os primeiros acordos de livre comércio entre países são feitos, como o famoso Benelux, gênese da futura União Européia, que estudamos na escola. Os Chicago Boys, liberais tout court, ainda que num nível muito mais brando do que a Escola Austríaca, ocupam as fundações que determinariam os rumos da futura União Européia. Estão até hoje no FMI, no Banco Mundial, no Banco Central Europeu, nas fundações bilionárias que dão tutano à UE.
Aqui é preciso entender uma bifurcação. Na economia liberal, quanto mais países integrados e praticando comércio (trocas livres), melhor. Na política, o exato contrário é melhor: os agentes precisam ser locais, não terem poder sobre vastos territórios, não estarem longe do povo representado, não terem poder de barganha perante muitos outros políticos em conluio.
Graças a isso, o Brexit pode aproveitar o melhor dos dois mundos: poderes políticos locais, com tratados de livre comércio (quem não quer comercializar com a Inglaterra?) com a Europa e com o mundo.
Tal bifurcação confunde mortalmente os analistas até hoje, como confundiu os próprios Chicago Boys. O comércio livre pretendido funcionaria à perfeição se fosse um comércio entre indivíduos e empresas, não entre governos. A despeito da suposta promoção do “livre comércio”, a UE gera, justamente, protecionismo europeu ante a produtos estrangeiros ao bloco.
Mais: o comércio é firmado entre governos, o que é justamente o tipo de comércio pretendido por Marx, Stalin e Mao. Ludwig von Mises, maior economista do mundo e principal nome da Escola Austríaca, deu a seu magnum opus o título de Ação Humana justamente para frisar tal noção de comércio. E o próprio Mises avisaque acordos comerciais feitos por governos sempre visam a estimular as próprias exportações e a tolher as importações.
Em outras palavras, a globalização de “livre comércio” apenas mantém uma certa aparência de comércio. Apesar de todos os países da União Européia terem enriquecido no bloco (o argumento número 1 dos unionistas), quem mais cresceu foi a burocracia para gerir o próprio bloco – e, sobretudo, o poder transnacional sobre as decisões populares em cada país. É isso que gera o Brexit, não “extremismo”.
Como escrevem sobre o Brexit Ryan McMaken e Carmen Elena Dorobat no Instituto Mises:
A UE é uma organização secreta e totalmente isolada do povo europeu, o qual não detém absolutamente nenhum poder de supervisão sobre ela. A UE não é gerida por pessoas eleitas. O próprio Parlamento Europeu é totalmente impotente para impedir ou revogar os atos da Comissão Europeia (que é o corpo executivo da União Europeia). Os membros da comissão não são eleitos, mas sim designados pelos governos dos estados-membros.
Sendo um conglomerado formado por dezenas de comissões anônimas e secretas, a UE é um paraíso para um burocrata. Pessoas extremamente poderosas permanecem praticamente anônimas, seguras para impingir seus infindáveis esquemas intervencionistas sem jamais temer qualquer punição dos eleitores. Praticamente ninguém é capaz de citar os nomes dos mais poderosos indivíduos da UE, seja dos cinco presidentes da UE ou de outros poderosos membros das organizações pertencentes à UE.
Como bem disse um observador: “De que adiantaria eu saber quem eles são? Ninguém tem nenhum poder sobre eles.”
Como já sabiam os céticos do globalismo desde sempre, não é mera burocracia: é um Leviatã instituindo leis a serem obedecidas, sob pena de sanções, que nunca foram debatidas. Nem mesmo seus autores foram eleitos. Aliás, o povo nem sequer sabe da sua existência.
A globalização econômica, liberal, enriquecedora e libertadora de tiranias, trouxe em sua aplicação na Europa, o berço da civilização e o Primeiro Mundo par excellence, uma forma de controle político nunca antes experimentada pela Europa. O que possui uma aparência de livre mercado é o nome fantasia de um controle por engenheiros sociais não-eleitos, completamente desconhecidos do público comandado, promovendo toda a sorte de políticas alienígenas aos valores europeus, aos desejos populares, à própria noção de que a Europa que conhecemos continuará a ser a Europa, e não um puxadinho da Arábia Saudita ou do Estado Islâmico.
O Brexit, fora uma turbulência econômica ínfima inicial, faz bem aos cidadãos, e mal aos políticos. Poucas coisas são tão boas no mundo. Beira o sexo.
Graças a isso, Nigel Farage, o líder do partido da independência britânica UKIP, encurralou o presidente da União Européia na parede de maneira histórica, com um comentário que faria muito analista político que chama Nigel Farage de “extrema-direita” ou “eurofóbico” (sic) sem resposta: quem diabos é o presidente da União Européia, que manda tanto na Europa?!
Alguém aí viu algum comentário sobre as pessoas pró-União Européia (ou podemos chamá-las de “eurocrentes” ou “britanicofóbicos”?) serem “extremistas radicais”? Fanáticos adoradores de Leviatã?
O que confunde estes analistas desconhecedores do que está acontecendo um pouco escondido de seus narizes, em salas secretas da União Européia bem protegidas dos olhos do público, é que o suposto “livre comércio” (como se fosse possível entre governos) é quem está promovendo um Estado gigantesco hoje.
No dizer de Shakespeare, era um serpent’s egg: a promoção do suposto livre-comércio deu origem ao Leviatã moderno. Por isso o globalismo convive bem com os Chicago Boys no Banco Mundial, a um só tempo em que promove toda a agenda progressista através de seus órgãos de Educação, por exemplo. A antiga esquerda “anti-globalização” hoje é a esquerda nadando no FMI. E o Brexit, apoiado por alguns membros da velha guarda do Partido Trabalhista inglês, é chamado de projeto “de extrema-direita”.
Não à toa, o único brasileiro a falar do globalismo, ainda que com o antiquado nome de “Nova Ordem Mundial” (que envolve um sem número de teorias da conspiração que nada têm a ver com a seriedade do tema), o filósofo Olavo de Carvalho, é incompreendido pela esquerda e pela direita por falar de um conceito conhecido unicamente no Primeiro Mundo. Quantos “especialistas” de Globo News sabem, digamos, 20% do que vai acima? 10%? 5%?
Crendo apenas no formalismo de pactos e tratados, diminuem o poder local, próximo do povo, para entregá-lo de mão beijada a burocratas em órgãos não-eleitos que promovem agendas, ideologias, regulações, imposições, obrigações e novas formas de viver, da mais cotidiana das tarefas até a visão de mundo quase metafísica, sem que ninguém saiba sequer quem são.
Brexit: desligue a Globo News e vá ouvir Iron Maiden
No mundo pós-1980, justamente quando o Banco Mundial se encarregou dos ditames de toda a educação mundial, em mais uma demonstração de como o globalismo atua silenciosa e invisivelmente no mundo, embora com onipresença, onipotência e cada vez mais onisciência, tudo se reduziu a uma pitada de palavras que cabem entre os dedos para filtrar e explicar o mundo. Basta ler as análises de Pascal Bernardin sobre os documentos da ONU para a educação mundial em Maquiavel Pedagogo.
Através dos mesmos institutos de pesquisa tão confiáveis que erraram as três últimas eleições nacionais no Reino Unido, hoje todos os jornalistas que ontem juravam de pés juntos que o Brexit resultaria na permanência da União Européia aos mandos e desmandos da União Européia afirmam que quem votou pela saída foram velhos, brancos e sem escolaridade. Você acredita no que o Guardian, a Caros Amigos e a Lúcia Guimarães acreditam?
Toda a discussão sobre o Brexit está se pautando na idéia de imigração. Para ela, basta então associar a saída da União Européia não ao que os britânicos sentem na pele todo santo dia, mas a racismo. Soltando as palavras “racismo”, “nacionalismo” e “extremismo” em seus adversários e “tolerância” e “diversidade” para si próprios, nenhum jornalista, acadêmico, cientista político, historiador ou especialista de Globo News precisa saber nada sobre o que está em jogo no mundo. É dizer o que pega bem no senso comum reconstruído justamente pelo Banco Mundial e correr para o abraço da galera na Vila Madalena.
O que passa a milhas de distância de suas sinapses é que a questão imigratória não é o centro da discussão, mas uma conseqüência. Que não se trata de imigrantes, mas sim de fronteiras de poder.
Não se discute se o Reino Unido faz parte da Europa, e sim de um governo transnacional não-eleito sitiado em Bruxelas, cujo presidente, se perguntado a qualquer fanático pelo Remain que considere que o Leave é a primeira trombeta do Apocalipse, ninguém saberá o nome (dica: é Jean-Claude Juncker).
Os “inteligentes” da Globo News nem sequer descobriram que o principal nome da campanha pelo Brexit não era Nigel Farage, do UKIP, mas o conservador tradicional Boris Johnson, Tory, ex-prefeito de Londres até há pouco, intelectualíssimo e autor de uma majestosa biografia de Churchill.
Os mesmos que adoram criticar o grande poder do FMI, do Banco Mundial e dos governantes agora criticam o Reino Unido, 5.ª maior economia do mundo que ensinou o planeta a enriquecer, por se livrar dos ditames do FMI de Strauss-Kahn, do Banco Mundial de Jim Yong Kim e de toda sorte de lobistas, tecnocratas, banqueiros e burocratas corruptos para ficarem com o próprio dinheiro e a própria liberdade para si. Desde que a esquerda aprendeu a ganhar com a burocracia, nem um partido socialista e uma cafonérrima retórica anti-capitalista são necessários.
Para não falar da agência promovida pelos globalistas, lucrando com comércio, ganhando poder com o controle sub-reptício de órgãos para-estatais cada vez mais poderosos, secretos e mandando em um número cada vez mais alto de pessoas. Toda a educação que promove o aborto, o feminismo, o controle populacional, a nova eugenia, a destruição da família e das tradições como algo “normal” vem direto da Comissão Européia, do Banco Mundial e quejandos.
Como disse Elton Flaubert:
Por trás da grana, o que realmente guiava os europeístas (de direita e esquerda) era a ideia de uma união política. Por isto, o tratado determina a criação de uma Comissão Europeia, um Conselho Europeu, um Parlamento Europeu e um Tribunal de Justiça Europeu.
Era a consolidação de um sonho grandiloquente dos humanistas: a integração que homogeniza – por cima – os valores.
O que está em discussão no Brexit é se o Reino Unido terá leis próprias ou leis da Comissão Européia. Leis inclusive para imigração: o “Império que nunca dorme”, com colônias da América até a China, não tem imigrantes graças à União Européia, e nem deixarão de ter, a despeito do maniqueísmo reducionista de quem quer enxergar “racismo” e “xenofobia” (agora com uma modalidade mais engraçada: a “eurofobia”) em manter uma Inglaterra inglesa: pontual, cortês, bebendo pints de Guinness em bares protegidos pela Carta Magna, e não precisando obedecer a shari’ah. Isto é ser “radical de extrema-direita”?
O ideário brasileiro é contaminado, ou melhor, inteiramente determinado pela meia dúzia de palavras prontas da Globo News, cujo nome não disfarça a que veio (além do Ministério da Educação e da Câmara dos Deputados, a principal atuação pública da ONU e dos globalistas no Brasil é através do Criança Esperança).
Entendendo por que os ingleses são viciados em História – basta ler as letras do Iron Maiden – entenderemos porque do mais simples campesino a grandes intelectuais do porte de Sir Roger Scruton, a terra que primeiro trabalhou o senso comum e o empirismo não se deixa dobrar por explicações fáceis com palavrinhas mágicas como “racismo” e “integração”.
O país de Churchill (e seu “We shall never surrender!” cantado em Aces High), de Shakespeare (“multicultural” o suficiente?), de Coleridge, de Chesterton – todos musicados pelo Iron Maiden – só poderia ter em seu espírito não o servilismo brasileiro a qualquer coisa estatal com “social” no nome, mas o fogo de The Trooper, The Clansman, The Duelists e Be Quick Or Be Dead, com seu ceticismo em relação a burocratas e políticos. Basta trocar o imaginário e não precisaremos de tantos argumentos.
A Carta Magna, o primeiro grande documento conservador do mundo, foi o que tornou a Inglaterra a monarquia mais respeitada do mundo, a um só tempo em que combina a idéia de representatividade popular de maneira muito mais avançada e funcional do que as democracias modernas: uma carta que limita o poder do rei, nunca permitindo que o monarca tenha mais poder do que o reconhecido pelo povo.
A Comissão Européia, por acaso, possui uma Carta Magna? Enquanto não possuir, os britânicos estão muito mais corretos do que Globo News, Guardian e CNN em preferirem ser súditos de Sua Majestade.
28 de junho de 2016
Flavio Morgenstern
Brexit: o que você deve saber e a Globo News não conta
O referendo Brexit, que definiu que o Reino Unido não faz mais parte da União Européia, causou um choque nas hostes do jornalismo mundial. O Brasil, crente manjado de qualquer coisa que saia no editorial do New York Times, levou um susto com o resultado: os ingleses não querem fazer parte da UE.
Durante a cobertura do Brexit na Globo News, comentava-se com entusiasmo que a decisão de permanecer era praticamente certa. Que até mesmo Nigel Farage, o líder do UKIP, o partido eurocético a transformar a Inglaterra em um sistema de quatro partidos principais, que nunca é citado sem as palavras mentirosas “xenófobo”, “populista” ou “de extrema-direita”, teria admitido a derrota. Que Financial Times, The Guardian, Telegraph e tantos outros davam como certa a permanência do Reino Unido na zona de mando de Bruxelas.
A Inglaterra foi o país que inventou o governo mediado e vigiado pela imprensa – seus paparazzi e sua imprensa marrom de tablóides até hoje é famosa por expor os podres e a privacidade de governantes, da nobreza e de celebridades.
Quando o primeiro referendo britânico a respeito da União Européia foi aventado na década de 70, simplesmente todos os jornais das Ilhas Britânicas advogaram pelo voto pró-União Européia, exceto dois: The Morning Star e The Spectator. Para este Brexit, um outro jornal se uniu ao time: o Daily Mail.
Quando foi a última vez que uma revista com mais de um século de idade como a Spectator, com os maiores nomes do país que mais espalhou cultura e civilização pelo mundo, foi citada como fonte no jornalismo brasileiro?
Quantos brasileiros ouvem o nome da melhor revista semanal do Reino Unido? Quantos sabem da sua existência? Para o tupiniquim, mesmo (ou especialmente) o universitário pesquisador bilíngue, é praticamente uma certeza de que o único jornal lido e respeitado na Terra de Sua Majestade é o The Guardian, que até no formato tenta copiar os tablóides de fofoca The Sun e The Mirror, com conteúdo ideológico de mesmo jaez. Um jornal tratado pelos ingleses com a mesma confiança que o Brasil tem pelos piores colunistas da Folha de S. Paulo. Ou pela Carta Capital. É só ver o quanto conseguiu influenciar no Brexit.
O rapaz infelizmente ainda não aprendeu português o suficiente. Ou é mau-caráter, né, vai saber.
Segundo a visão de sumidades do pensamento mundial como Cristiana Lôbo e J. K. Rowling, aqueles que não votaram por subjugar a Inglaterra aos burocratas não-eleitos da União Européia seriam “de extrema-direita”, racistas, xenófobos e radicais. Será uma visão válida? A globalização era criticada, justamente, pela esquerda na década de 90. Não há algo historicamente constituído que parece termos esquecido e que precisamos resgatar para interpretar os fatos?
Globalização e globalismo
No Primeiro Mundo, quando se discute sobre os grandes blocos econômicos, sobretudo a UE e as medidas da ONU pelo mundo, é comum que se fale sobre o globalismo, a verdadeira questão do Brexit. O termo é praticamente desconhecido no Brasil, que obedece caninamente à ONU sem nem saber disso. A palavra possui o total de zero referências em nosso noticiário. Formadores de opinião, intelectuais e professores universitários, à direita ou à esquerda, não sabem o que é o globalismo, se são globalistas ou não.
O entendimento histórico comum, não só no Brasil de Paulo Freire, mas da educação voltada para a tecnicidade da sociedade, é o de que houve uma disputa entre fascismo, socialismo e capitalismo na Segunda Guerra e na Guerra Fria, e de, com a extinção militar provisória do primeiro o descrédito do segundo, hoje vivemos num mundo globalizado e multipolar, com tendências razoavelmente conservadoras ou progressistas disputando terreno em blocos de livre comércio que promovem a democracia.
Na suposição de uma hipotética multipolarização, quais seriam de fato os vários pólos? Será que Bolívia, Grécia e Egito, ou mesmo Suíça, Qatar e Canadá, podem mesmo competir com a influência da América de Obama e da Rússia de Putin? Será que a Inglaterra tem mais poder como a Inglaterra através do Brexit ou como um voto eternamente derrotado na Comissão Européia?
Adicione-se a tal caldo o componente islâmico, que hoje pode ser considerado uma terceira força, e a massa do que nos ensinaram desanda de vez (vide o debate entre o filósofo conservador Olavo de Carvalho e “o cérebro de Putin”Alexandr Dugin sobre a Nova Ordem Mundial). Basta lembrar que, em uma lista recente das pessoas mais poderosas do mundo (da qual Dilma Rousseff saltou no abismo de 8.ª mulher mais poderosa do mundo para não comparecer entre as 100 mais), o homem mais poderoso da Europa foi considerado… Recep Erdogan, o presidente da Turquia, que mal faz parte da Europa.
A esquerda nas décadas de 80 e 90 era radicalmente contrária à globalização. Quem estudou até o início de 2000 lembra do pânico que palavras como “globalização”, “ALCA”, “FMI” e “acordo de livre comércio” causavam no que é hoje o PT, o PSOL, a Marina Silva, os professores de História, os especialistas de jornal. Por que todos inverteram o discurso e se preocupam tanto em chamar de “fascistas” e “racistas” quem possui ceticismo em relação à União Européia?
Em meados da década de 60, com a Guerra Fria no auge em diversas frentes, a intelectualidade do Ocidente já havia abandonado todas as esperanças de conter o avanço comunista. A questão não era se o comunismo seria possível globalmente, mas quando.
Para Karl Marx, a Revolução ocorreria espontaneamente, pelo materialismo histórico-dialético. Como já notara o filósofo Benedetto Croce, arqui-rival de Antonio Gramsci, em Materialismo Histórico E Economia Marxista, tal previsão nunca ocorreu, e os operários ganhavam cada vez mais a cada década no capitalismo.
Desde a Segunda Internacional, houve um racha entre os comunistas da velha guarda, das casernas e coturnos, que queriam a Revolução, e os então intitulados socialistas. Estes últimos não acreditavam mais na Revolução, preferindo criar partidos socialistas e chegar ao socialismo pelas vias democráticas. Controlando o Estado, poderiam criar direitos trabalhistas e aumentar impostos, até a atividade econômica ser abocanhada e unificada pelo Estado. Com 51% de impostos, o Estado poderia comprar empresas privadas, se tornando o maior agente econômico de um país, até criar o socialismo sem, supostamente, derramar uma gota de sangue. Desacreditados em 1889, ganharam força com a dissolução das monarquias européias após a Primeira Guerra, e começaram a criar Partidos Socialistas por todo o Ocidente. Leis para se comprar empresas privadas são criadas. A situação e a ideologia são facilmente reconhecíveis no Brasil de 2016, mas não é levada em conta para o Brexit.
Os capitalistas se assustam e, culturalmente, capitulam, financiando a Guerra Fria no front militar, mas fagocitando o ideário socialista em sua cultura. É a era da Escola de Frankfurt atacando a base familiar da sociedade, de Antonio Gramsci transformando tudo em propaganda partidária, de Foucault, Reich, Deleuze e do sex lib, do maio de 68 e do Woodstock. O único problema seria como causar a Revolução em países de capitalismo avançado (e não os bananeiros de Terceiro Mundo sonhando em se tornar a China), que não aceitariam de bom grado a estatização dos meios de produção.
Um grupo de capitalistas na América traça então um programa de reação. O principal nome era o economista austríaco e futuro Nobel de Economia Friedrich von Hayek, que, graças a tal pragmatismo, abdica de alguns princípios mais ortodoxos da Escola Austríaca de Economia de que faz parte. Como colaboradores, não teve economistas “austríacos”, mas os Chicago Boys de Milton Friedman, da Escola de Chicago.
O plano foi a chamada globalização da economia, aplicando um princípio hoje básico estudado por 9 em cada 10 economistas iniciantes em obras como a de Gregory Mankiw: se ao invés de um país produzir batatas e armas, um país que produza bem armas (diga-se, a Suíça) e outro que produza bem batatas (como a Inglaterra) especializarem-se cada qual em seu setor de excelência e trocar livremente com o outro país, ambos terão uma produção maior e enriquecerão mais e mais rapidamente do que se precisassem produzir tudo.
A economia setorizada torna todos os países mutuamente dependentes. Nada de Brexit até então. Onde antes havia o ranço nacionalista e o protecionismo que gerou a Primeira Guerra, a dependência econômica gerou a paz e uma fraternidade entre os povos europeus nunca antes vista. Confirmando inversamente a tese de Frédéric Bastiat, em A Lei: por onde não passa o comércio, passam soldados. Retirados os soldados, veio o comércio.
Com uma economia globalizada e setorizada, causando hiperprodução e um enriquecimento rápido e sem igual, não havia como ganhar eleições com Partidos Socialistas e “socializar os meios de produção”. O avanço do socialismo foi barrado por Friedrich von Hayek na economia e, militarmente, pelas 26 letras do artigo quinto do Tratado de Washington, que fundou a OTAN em 1949: “The Parties agree that an armed attack against one or more of them in Europe or North America shall be considered an attack against them all”. Um herói de quem seu professor de História nunca ouviu falar, mas odeia sem saber.
A história é integralmente desconhecida por aqueles que espumam “Eu estudei História!” com empáfia e bordões na internet, mas ela possui complicações que confundem nossa visão sobre o mundo hoje. Vide o Brexit.
A esquerda, que lutou contra “a globalização” até o início da década de 2000 (alguém se lembra de José Bové, que vinha ao Brasil de mãos dadas com o MST, tratorando McDonald’s pelo mundo?), mudou radicalmente (sic) o discurso contra os “neoliberais” (até hoje mal definidos), preferindo fingir que não tentou lutar contra a forma de economia que mais enriqueceu os pobres, com rapidez inacreditável até para os deslumbrados, em toda a história. E hoje pode criticar o Brexit à vontade, mesmo que o globalismo da UE não seja o Estado gigante que sempre sonhou.
Deturparam a União Européia
Os primeiros acordos de livre comércio entre países são feitos, como o famoso Benelux, gênese da futura União Européia, que estudamos na escola. Os Chicago Boys, liberais tout court, ainda que num nível muito mais brando do que a Escola Austríaca, ocupam as fundações que determinariam os rumos da futura União Européia. Estão até hoje no FMI, no Banco Mundial, no Banco Central Europeu, nas fundações bilionárias que dão tutano à UE.
Aqui é preciso entender uma bifurcação. Na economia liberal, quanto mais países integrados e praticando comércio (trocas livres), melhor. Na política, o exato contrário é melhor: os agentes precisam ser locais, não terem poder sobre vastos territórios, não estarem longe do povo representado, não terem poder de barganha perante muitos outros políticos em conluio.
Graças a isso, o Brexit pode aproveitar o melhor dos dois mundos: poderes políticos locais, com tratados de livre comércio (quem não quer comercializar com a Inglaterra?) com a Europa e com o mundo.
Tal bifurcação confunde mortalmente os analistas até hoje, como confundiu os próprios Chicago Boys. O comércio livre pretendido funcionaria à perfeição se fosse um comércio entre indivíduos e empresas, não entre governos. A despeito da suposta promoção do “livre comércio”, a UE gera, justamente, protecionismo europeu ante a produtos estrangeiros ao bloco.
Mais: o comércio é firmado entre governos, o que é justamente o tipo de comércio pretendido por Marx, Stalin e Mao. Ludwig von Mises, maior economista do mundo e principal nome da Escola Austríaca, deu a seu magnum opus o título de Ação Humana justamente para frisar tal noção de comércio. E o próprio Mises avisaque acordos comerciais feitos por governos sempre visam a estimular as próprias exportações e a tolher as importações.
Em outras palavras, a globalização de “livre comércio” apenas mantém uma certa aparência de comércio. Apesar de todos os países da União Européia terem enriquecido no bloco (o argumento número 1 dos unionistas), quem mais cresceu foi a burocracia para gerir o próprio bloco – e, sobretudo, o poder transnacional sobre as decisões populares em cada país. É isso que gera o Brexit, não “extremismo”.
Como escrevem sobre o Brexit Ryan McMaken e Carmen Elena Dorobat no Instituto Mises:
A UE é uma organização secreta e totalmente isolada do povo europeu, o qual não detém absolutamente nenhum poder de supervisão sobre ela. A UE não é gerida por pessoas eleitas. O próprio Parlamento Europeu é totalmente impotente para impedir ou revogar os atos da Comissão Europeia (que é o corpo executivo da União Europeia). Os membros da comissão não são eleitos, mas sim designados pelos governos dos estados-membros.
Sendo um conglomerado formado por dezenas de comissões anônimas e secretas, a UE é um paraíso para um burocrata. Pessoas extremamente poderosas permanecem praticamente anônimas, seguras para impingir seus infindáveis esquemas intervencionistas sem jamais temer qualquer punição dos eleitores. Praticamente ninguém é capaz de citar os nomes dos mais poderosos indivíduos da UE, seja dos cinco presidentes da UE ou de outros poderosos membros das organizações pertencentes à UE.
Como bem disse um observador: “De que adiantaria eu saber quem eles são? Ninguém tem nenhum poder sobre eles.”
Como já sabiam os céticos do globalismo desde sempre, não é mera burocracia: é um Leviatã instituindo leis a serem obedecidas, sob pena de sanções, que nunca foram debatidas. Nem mesmo seus autores foram eleitos. Aliás, o povo nem sequer sabe da sua existência.
A globalização econômica, liberal, enriquecedora e libertadora de tiranias, trouxe em sua aplicação na Europa, o berço da civilização e o Primeiro Mundo par excellence, uma forma de controle político nunca antes experimentada pela Europa. O que possui uma aparência de livre mercado é o nome fantasia de um controle por engenheiros sociais não-eleitos, completamente desconhecidos do público comandado, promovendo toda a sorte de políticas alienígenas aos valores europeus, aos desejos populares, à própria noção de que a Europa que conhecemos continuará a ser a Europa, e não um puxadinho da Arábia Saudita ou do Estado Islâmico.
O Brexit, fora uma turbulência econômica ínfima inicial, faz bem aos cidadãos, e mal aos políticos. Poucas coisas são tão boas no mundo. Beira o sexo.
Graças a isso, Nigel Farage, o líder do partido da independência britânica UKIP, encurralou o presidente da União Européia na parede de maneira histórica, com um comentário que faria muito analista político que chama Nigel Farage de “extrema-direita” ou “eurofóbico” (sic) sem resposta: quem diabos é o presidente da União Européia, que manda tanto na Europa?!
Alguém aí viu algum comentário sobre as pessoas pró-União Européia (ou podemos chamá-las de “eurocrentes” ou “britanicofóbicos”?) serem “extremistas radicais”? Fanáticos adoradores de Leviatã?
O que confunde estes analistas desconhecedores do que está acontecendo um pouco escondido de seus narizes, em salas secretas da União Européia bem protegidas dos olhos do público, é que o suposto “livre comércio” (como se fosse possível entre governos) é quem está promovendo um Estado gigantesco hoje.
No dizer de Shakespeare, era um serpent’s egg: a promoção do suposto livre-comércio deu origem ao Leviatã moderno. Por isso o globalismo convive bem com os Chicago Boys no Banco Mundial, a um só tempo em que promove toda a agenda progressista através de seus órgãos de Educação, por exemplo. A antiga esquerda “anti-globalização” hoje é a esquerda nadando no FMI. E o Brexit, apoiado por alguns membros da velha guarda do Partido Trabalhista inglês, é chamado de projeto “de extrema-direita”.
Não à toa, o único brasileiro a falar do globalismo, ainda que com o antiquado nome de “Nova Ordem Mundial” (que envolve um sem número de teorias da conspiração que nada têm a ver com a seriedade do tema), o filósofo Olavo de Carvalho, é incompreendido pela esquerda e pela direita por falar de um conceito conhecido unicamente no Primeiro Mundo. Quantos “especialistas” de Globo News sabem, digamos, 20% do que vai acima? 10%? 5%?
Crendo apenas no formalismo de pactos e tratados, diminuem o poder local, próximo do povo, para entregá-lo de mão beijada a burocratas em órgãos não-eleitos que promovem agendas, ideologias, regulações, imposições, obrigações e novas formas de viver, da mais cotidiana das tarefas até a visão de mundo quase metafísica, sem que ninguém saiba sequer quem são.
Brexit: desligue a Globo News e vá ouvir Iron Maiden
No mundo pós-1980, justamente quando o Banco Mundial se encarregou dos ditames de toda a educação mundial, em mais uma demonstração de como o globalismo atua silenciosa e invisivelmente no mundo, embora com onipresença, onipotência e cada vez mais onisciência, tudo se reduziu a uma pitada de palavras que cabem entre os dedos para filtrar e explicar o mundo. Basta ler as análises de Pascal Bernardin sobre os documentos da ONU para a educação mundial em Maquiavel Pedagogo.
Através dos mesmos institutos de pesquisa tão confiáveis que erraram as três últimas eleições nacionais no Reino Unido, hoje todos os jornalistas que ontem juravam de pés juntos que o Brexit resultaria na permanência da União Européia aos mandos e desmandos da União Européia afirmam que quem votou pela saída foram velhos, brancos e sem escolaridade. Você acredita no que o Guardian, a Caros Amigos e a Lúcia Guimarães acreditam?
Toda a discussão sobre o Brexit está se pautando na idéia de imigração. Para ela, basta então associar a saída da União Européia não ao que os britânicos sentem na pele todo santo dia, mas a racismo. Soltando as palavras “racismo”, “nacionalismo” e “extremismo” em seus adversários e “tolerância” e “diversidade” para si próprios, nenhum jornalista, acadêmico, cientista político, historiador ou especialista de Globo News precisa saber nada sobre o que está em jogo no mundo. É dizer o que pega bem no senso comum reconstruído justamente pelo Banco Mundial e correr para o abraço da galera na Vila Madalena.
O que passa a milhas de distância de suas sinapses é que a questão imigratória não é o centro da discussão, mas uma conseqüência. Que não se trata de imigrantes, mas sim de fronteiras de poder.
Não se discute se o Reino Unido faz parte da Europa, e sim de um governo transnacional não-eleito sitiado em Bruxelas, cujo presidente, se perguntado a qualquer fanático pelo Remain que considere que o Leave é a primeira trombeta do Apocalipse, ninguém saberá o nome (dica: é Jean-Claude Juncker).
Os “inteligentes” da Globo News nem sequer descobriram que o principal nome da campanha pelo Brexit não era Nigel Farage, do UKIP, mas o conservador tradicional Boris Johnson, Tory, ex-prefeito de Londres até há pouco, intelectualíssimo e autor de uma majestosa biografia de Churchill.
Os mesmos que adoram criticar o grande poder do FMI, do Banco Mundial e dos governantes agora criticam o Reino Unido, 5.ª maior economia do mundo que ensinou o planeta a enriquecer, por se livrar dos ditames do FMI de Strauss-Kahn, do Banco Mundial de Jim Yong Kim e de toda sorte de lobistas, tecnocratas, banqueiros e burocratas corruptos para ficarem com o próprio dinheiro e a própria liberdade para si. Desde que a esquerda aprendeu a ganhar com a burocracia, nem um partido socialista e uma cafonérrima retórica anti-capitalista são necessários.
Para não falar da agência promovida pelos globalistas, lucrando com comércio, ganhando poder com o controle sub-reptício de órgãos para-estatais cada vez mais poderosos, secretos e mandando em um número cada vez mais alto de pessoas. Toda a educação que promove o aborto, o feminismo, o controle populacional, a nova eugenia, a destruição da família e das tradições como algo “normal” vem direto da Comissão Européia, do Banco Mundial e quejandos.
Como disse Elton Flaubert:
Por trás da grana, o que realmente guiava os europeístas (de direita e esquerda) era a ideia de uma união política. Por isto, o tratado determina a criação de uma Comissão Europeia, um Conselho Europeu, um Parlamento Europeu e um Tribunal de Justiça Europeu.
Era a consolidação de um sonho grandiloquente dos humanistas: a integração que homogeniza – por cima – os valores.
O que está em discussão no Brexit é se o Reino Unido terá leis próprias ou leis da Comissão Européia. Leis inclusive para imigração: o “Império que nunca dorme”, com colônias da América até a China, não tem imigrantes graças à União Européia, e nem deixarão de ter, a despeito do maniqueísmo reducionista de quem quer enxergar “racismo” e “xenofobia” (agora com uma modalidade mais engraçada: a “eurofobia”) em manter uma Inglaterra inglesa: pontual, cortês, bebendo pints de Guinness em bares protegidos pela Carta Magna, e não precisando obedecer a shari’ah. Isto é ser “radical de extrema-direita”?
O ideário brasileiro é contaminado, ou melhor, inteiramente determinado pela meia dúzia de palavras prontas da Globo News, cujo nome não disfarça a que veio (além do Ministério da Educação e da Câmara dos Deputados, a principal atuação pública da ONU e dos globalistas no Brasil é através do Criança Esperança).
Entendendo por que os ingleses são viciados em História – basta ler as letras do Iron Maiden – entenderemos porque do mais simples campesino a grandes intelectuais do porte de Sir Roger Scruton, a terra que primeiro trabalhou o senso comum e o empirismo não se deixa dobrar por explicações fáceis com palavrinhas mágicas como “racismo” e “integração”.
O país de Churchill (e seu “We shall never surrender!” cantado em Aces High), de Shakespeare (“multicultural” o suficiente?), de Coleridge, de Chesterton – todos musicados pelo Iron Maiden – só poderia ter em seu espírito não o servilismo brasileiro a qualquer coisa estatal com “social” no nome, mas o fogo de The Trooper, The Clansman, The Duelists e Be Quick Or Be Dead, com seu ceticismo em relação a burocratas e políticos. Basta trocar o imaginário e não precisaremos de tantos argumentos.
A Carta Magna, o primeiro grande documento conservador do mundo, foi o que tornou a Inglaterra a monarquia mais respeitada do mundo, a um só tempo em que combina a idéia de representatividade popular de maneira muito mais avançada e funcional do que as democracias modernas: uma carta que limita o poder do rei, nunca permitindo que o monarca tenha mais poder do que o reconhecido pelo povo.
A Comissão Européia, por acaso, possui uma Carta Magna? Enquanto não possuir, os britânicos estão muito mais corretos do que Globo News, Guardian e CNN em preferirem ser súditos de Sua Majestade.
28 de junho de 2016
Flavio Morgenstern
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