"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 14 de maio de 2016

EM MÉDIA, GINASIANO


Otto Lara Resende aceitou certa vez um emprego público em que deveria analisar documentos, emitir pareceres e redigir propostas. Ao tomar posse do cargo, foi logo estudando a papelada deixada em sua mesa pelo antecessor, abriu a máquina de escrever e começou a trabalhar. Um veterano funcionário da repartição, ao vê-lo datilografar em alta velocidade, comentou surpreso: "Oh! Tem redação própria!".

Ao ouvir os intermináveis pareceres, moções, atas, relatórios e contraditórios relativos ao impeachment de Dilma Rousseff, lidos por nossos senadores e deputados no Congresso e transmitidos pela TV, eu me pergunto quantos deles têm redação própria. Não que precisem disso — cada parlamentar tem a seu, digo nosso, soldo um exército de analistas e redatores prontos a pôr em letra de fôrma o apoio ou contestação ao menor inciso da Constituição, de acordo com sua conveniência partidária.

Sei bem que, entre eles, há pessoas preparadas e que talvez até dispensem ghost writers. Mas a maioria parece não saber redigir uma carta comercial ou um rol de roupa para a lavanderia – mesmo que se relevem os seus ii com uma bolinha em lugar de pingo. E quantos ali conseguirão tomar um ditado?

No item leitura, alguns parecem se inspirar no imortal Ronald Golias. Há dias, um senador foi chamado a ler um relatório. Era angustiante o contorcionismo a que isto o obrigava, formando as sílabas com a boca, movendo a cabeça e os olhos para mudar de linha e engalfinhando-se com as palavras acima de três sílabas. Para completar a agonia, o texto que o fizeram ler era um campo minado, cheio de referências a Montaigne e Montesquieu, intelectuais franceses cujos nomes nunca lhe tinham passado pelas oiças.

O atual Congresso é, em média, ginasiano — com todo respeito pelos nossos ginásios.



14 de maio de 2016
Ruy Castro, Folha de São Paulo

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