"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 26 de abril de 2016

BOLSONARO PISOU NA BOLA

Convenhamos: o deputado Bolsonaro, pretendendo uma carona para professar a sua fé de ultradireitista convicto, o que não iremos também censurar, cometeu, publicamente, pecado contra todos os credos.

Fato é que, na votação do impedimento de D Dilma na Câmara Federal, quando convocado a votar, lembrou-se de filhos, de não sei mais quem e, alto e bom som, dedicou o voto “sim” como homenagem ao finado coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, nome pomposo para um personagem pequeno.

Pecou, primeiro, contra seus eleitores. É compreensível que uma multidão (quase 500.000 pessoas !!!) queira uma oposição dura contra os infiéis sociais (gays, transexuais, lésbicas etc), mas jamais esta mesma multidão coonestaria a ação de um torturador que assumidamente feriu, torturou (quem sabe matou) cidadãos que durante os anos de chumbo possuíam convicções políticas adversas ao regime. E, quanto, com toda a certeza, agiu em nome de superiores sem conhecimento ou ordenação deles, mas aproveitando-se usurpadamente de sua posição de comando.

Pecou, em segunda linha, contra o digno e glorioso Exército Brasileiro, cujas bases institucionais não permitiam que se instaurassem ou se instaurem no país o procedimento hediondo de tortura como estratégia para obtenção de confissões ou testemunhos, ou até mesmo se fazendo de eventuais tribunais de exceção, e seus mais altos escalões assim o afirmaram em oportunidades sucessivas. As torturas que efetivamente ocorreram deveu-se, em sua maior parte, à polícia civil (lembrai-vos do feroz delegado Sérgio Fleury, de dolorosa memória, chefe do DOPS em São Paulo), na certeza vã de que estaria cooperando com os princípios do regime, enquanto militar, pois se esforçava este na restauração da ordem e da hierarquia, na expulsão ou prisão de esquerdistas, vândalos ou mesmo terroristas, estes então um perigo constante à sociedade.

Pecou Bolsonaro, ainda, contra o povo brasileiro, de tradição pacífica e oposta a atos de violência, do Império à República, especialmente em querelas de natureza política, à exceção da guerra de Canudos, uma incompreensão covarde e cruenta incursão oficial ao terreiro de Antônio Conselheiro e o assassínio de todos seus seguidores.

Comportamento digno de uma cristã, muito raramente encontrado em qualquer um de nós, reconhecemos na presidente Dilma Roussef, pois sofreu violências em sua juventude, todas decorreram de sua ativa e precipitada aventura política, e, agora, com todo o poder de sua investidura, nunca revolveu o passado a procura de seus carrascos. Este esquecimento é nobre e republicano.

Bolsonaro terá de se desculpar, sem evasivas, pois o decoro parlamentar o exige. Não poderá permanecer aberta esta ferida numa sessão acompanhada pelo país e pelo mundo. A cusparada lançada por Jean Wyllys, que assim também confrontou o decoro, não é suficiente para redimir o deputado.

Caso não o faça, será impossível repetir suas façanhas eleitorais, responsáveis até pelo lançamento de sua candidatura à presidência.


26 de abril de 2016
José Maria Couto Moreira é advogado.

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