O modo como o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, reconheceu a representatividade da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB) - o que lhe assegura a liberação automática da fatia equivalente a R$ 15 milhões por ano da arrecadação do imposto sindical - revela o deslavado uso político do dinheiro que, extraído compulsoriamente do salário do trabalhador, deveria ser empregado na defesa de seus direitos. O ministro, que é do PDT, acatou "atas retificadoras" apresentadas pela CSB - sabidamente vinculada ao PMDB, partido da base aliada e ao qual está filiado o vice-presidente da República, Michel Temer - que haviam sido rejeitadas pelo secretário de Relações de Trabalho do Ministério, Manuel Messias, a quem cabe decidir sobre a criação de entidades sindicais.
Como essas atas aumentaram, por mágica, em 182 mil o número de trabalhadores filiados a sindicatos associados à central - o que, pelo menos no papel, assegurou a representatividade mínima exigida por lei para lhe dar o direito de participar do bolo do imposto sindical -, Messias não as reconheceu. "Como servidor, não tinha como liberar esses sindicatos", justificou-se Messias, deixando a decisão para o ministro.
Como mostrou reportagem do Estado, o ministro acatou, em janeiro, as "atas retificadoras" de seis sindicatos da CSB aumentando o total de filiados de 439 mil para 621 mil. Foi o bastante para permitir à CSB, que antes de dezembro de 2013 contava com 5,4% de representatividade, alcançar o índice de 7,3%, acima dos 7% exigidos pela lei para partilhar os 10% do imposto sindical a que as centrais têm direito. A representatividade indica a porcentagem dos trabalhadores filiados à central em questão em relação ao total de trabalhadores sindicalizados em todo o País. O milagre da multiplicação de filiações e a canetada de Dias renderão R$ 15 milhões ao longo do ano. E a CSB já recebeu a parcela de janeiro na nova divisão.
O imposto sindical, eufemisticamente chamado de contribuição sindical, é cobrado anualmente dos trabalhadores, sindicalizados ou não, na base de um dia de trabalho em março. Em 2013, R$ 3,2 bilhões foram distribuídos de acordo com a partilha estabelecida pela Lei 11.648 de 2008, assinada pelo ex-presidente Lula: 60% para 15.315 sindicatos; 15% para federações; 10% para centrais e 5% para confederações.
A criação de sindicatos, prática corriqueira nas gestões pedetistas no Ministério do Trabalho, não implica despesas para o contribuinte. Isso se aplica à permissão para funcionamento da CSB. Trata-se de disputa por um dinheiro já arrecadado do qual os dirigentes das entidades não precisam prestar contas. A briga se acirra à medida que aumenta ano após ano a arrecadação do imposto sindical.
As atas para a formalização da criação da nova central, obtidas pelo Estado, resultam de assembleias realizadas por seis sindicatos nos últimos dias de 2013 e nelas o número de sócios foi flagrantemente inflado. O Sindicato dos Químicos, Técnicos e Engenheiros Químicos de São Paulo, por exemplo, passou em um ano de 1,4 mil para 70 mil sócios. Outro exemplo é o do Sindicato dos Médicos Veterinários do Rio de Janeiro, que registrou números divergentes; no documento obtido pelo Estado, diz ter 9 mil sindicalizados, mas relaciona apenas 813 médicos veterinários. O grupo técnico do Ministério aconselhou optar pelo número menor, mas o ministro tomou a decisão baseado nos 9 mil, suficientes para assegurar formalmente a representatividade.
O reconhecimento da nova central sindical com direito a receber uma quantia expressiva do imposto sindical deixa claro que, no governo do PT, a questão sindical não é gerida tendo como foco a garantia dos direitos dos trabalhadores, como deveria ser, mas sim os interesses políticos-partidários.
Dias tornou-se ministro por indicação do presidente do PDT, Carlos Lupi, em troca de apoio à reeleição da presidente Dilma. O presidente da CSB, Antônio Neto, é, de acordo com a reportagem, ligado ao vice-presidente Michel Temer. O diretor de assuntos parlamentares da central, ex-deputado Mário Limberger, é filiado ao PMDB, partido de Temer.
25 de fevereiro de 2015
Editorial O Estado de SPaulo
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