O Brasil optou pelo isolamento da economia e agora paga um alto preço por essa escolha
Em entrevista à Folha, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Mauro Borges, traça, em minha opinião, um retrato fiel do estado em que se encontra a política de comércio exterior brasileira: há uma ausência absoluta de visão do que o país almeja nas suas relações econômicas internacionais.
Vamos aos exemplos mais gritantes. Não fechamos ainda o acordo com a União Europeia, mas, segundo o ministro, podemos lavar as mãos. Afinal, a culpa não é nossa, já que, com os parceiros do Mercosul, fizemos o dever de casa, enquanto os europeus, não.
Por outro lado, um eventual acordo com os EUA não interessa, e ele demonstrou taxativamente sua oposição, ao indagar se "devemos nos submeter às regras americanas". E nada foi dito sobre o esfacelamento do Mercosul, que antes cumpria papel relevante na absorção de manufaturados brasileiros, uma função que não desempenha há anos, sem que tenhamos mexido uma palha para procurar alternativas.
Nenhuma palavra também foi proferida sobre a perda de espaço de nossos produtos nos mercados globais. E, pior, não houve qualquer aceno sobre ações no sentido de mudar esse cenário. Assistimos simultaneamente à derrocada das vendas de manufaturados e ao fim de um ciclo favorável de commodities que, em seus melhores momentos, acomodava as ineficiências de nossa política externa.
De acordo com a política econômica em curso, essas evidências não significam muita coisa e se o saldo do comércio exterior desabou de US$ 20 bilhões para praticamente zero, isto se deve --acredite se quiser-- ao fato de que o Brasil é uma "economia relativamente aberta", segundo o ministro.
A nosso ver, a economia brasileira é uma das mais fechadas do mundo. Contudo, nem mesmo as elevadas barreiras comerciais são capazes de proteger o setor produtivo, particularmente a indústria, devido à sua progressiva perda de competitividade. Reside aí a razão do colapso do superavit comercial.
Quais mensagens o governo transmite com essas posições? No plano das relações internacionais, o recado é claro: não há muito o que fazer, seja para resgatar o dinamismo do Mercosul, seja para desenvolver novos mercados através da aproximação com países representativos dos principais fluxos do comércio mundial. Nem mesmo são aventados acordos junto a economias emergentes.
É o império do imobilismo. Para o setor privado, esse quadro reforça a disposição de não investir para ampliar exportações, privilegiando o mercado interno. Isto reproduz e realimenta o isolamento ao qual estamos submetidos.
Na mesma entrevista, o ministro foi indagado pela jornalista Raquel Landim sobre minha convicção de que o Brasil necessita abrir sua economia para ser mais competitivo. Sua resposta: "Ele está equivocado. A visão dele é que a abertura comercial é um instrumento de política industrial".
Como não? Disputar mercados externos e importar bens e serviços são fatores que ampliam as escalas de produção, barateiam custos, permitem acesso a insumos e bens de capital de última geração e, talvez o mais importante, aumentam a competição, o que estimula o investimento em inovação e a busca por mais qualidade e produtividade.
De quebra, propiciam o surgimento de novos setores, novas empresas e novos empreendedores. Ou seja, tudo que o Brasil precisa para melhorar sua capacidade exportadora e retomar o crescimento. Na história, não há exemplos de processos de desenvolvimento que tenham prescindido de uma forte exposição externa de suas economias.
Tenho insistido que a maior inserção externa só trará bons resultados se for empreendida com muita responsabilidade e aliada a medidas que garantam um ambiente de negócios mais favorável, com a integração de políticas industriais e tecnológicas, além da remoção dos gargalos do custo Brasil.
Por fim, gostaria de fazer uma observação sobre o receio manifestado pelo ministro de que a mudança da política externa "seria um desastre" porque transformaria o setor industrial em "linha de montagem". Talvez não se tenha percebido, mas a perda de dinamismo e densidade da indústria no Brasil não é uma visão do futuro: ela já ocorreu e a ausência de conexão do país com as cadeias globais de produção é um dos seus principais determinantes.
Em entrevista à Folha, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Mauro Borges, traça, em minha opinião, um retrato fiel do estado em que se encontra a política de comércio exterior brasileira: há uma ausência absoluta de visão do que o país almeja nas suas relações econômicas internacionais.
Vamos aos exemplos mais gritantes. Não fechamos ainda o acordo com a União Europeia, mas, segundo o ministro, podemos lavar as mãos. Afinal, a culpa não é nossa, já que, com os parceiros do Mercosul, fizemos o dever de casa, enquanto os europeus, não.
Por outro lado, um eventual acordo com os EUA não interessa, e ele demonstrou taxativamente sua oposição, ao indagar se "devemos nos submeter às regras americanas". E nada foi dito sobre o esfacelamento do Mercosul, que antes cumpria papel relevante na absorção de manufaturados brasileiros, uma função que não desempenha há anos, sem que tenhamos mexido uma palha para procurar alternativas.
Nenhuma palavra também foi proferida sobre a perda de espaço de nossos produtos nos mercados globais. E, pior, não houve qualquer aceno sobre ações no sentido de mudar esse cenário. Assistimos simultaneamente à derrocada das vendas de manufaturados e ao fim de um ciclo favorável de commodities que, em seus melhores momentos, acomodava as ineficiências de nossa política externa.
De acordo com a política econômica em curso, essas evidências não significam muita coisa e se o saldo do comércio exterior desabou de US$ 20 bilhões para praticamente zero, isto se deve --acredite se quiser-- ao fato de que o Brasil é uma "economia relativamente aberta", segundo o ministro.
A nosso ver, a economia brasileira é uma das mais fechadas do mundo. Contudo, nem mesmo as elevadas barreiras comerciais são capazes de proteger o setor produtivo, particularmente a indústria, devido à sua progressiva perda de competitividade. Reside aí a razão do colapso do superavit comercial.
Quais mensagens o governo transmite com essas posições? No plano das relações internacionais, o recado é claro: não há muito o que fazer, seja para resgatar o dinamismo do Mercosul, seja para desenvolver novos mercados através da aproximação com países representativos dos principais fluxos do comércio mundial. Nem mesmo são aventados acordos junto a economias emergentes.
É o império do imobilismo. Para o setor privado, esse quadro reforça a disposição de não investir para ampliar exportações, privilegiando o mercado interno. Isto reproduz e realimenta o isolamento ao qual estamos submetidos.
Na mesma entrevista, o ministro foi indagado pela jornalista Raquel Landim sobre minha convicção de que o Brasil necessita abrir sua economia para ser mais competitivo. Sua resposta: "Ele está equivocado. A visão dele é que a abertura comercial é um instrumento de política industrial".
Como não? Disputar mercados externos e importar bens e serviços são fatores que ampliam as escalas de produção, barateiam custos, permitem acesso a insumos e bens de capital de última geração e, talvez o mais importante, aumentam a competição, o que estimula o investimento em inovação e a busca por mais qualidade e produtividade.
De quebra, propiciam o surgimento de novos setores, novas empresas e novos empreendedores. Ou seja, tudo que o Brasil precisa para melhorar sua capacidade exportadora e retomar o crescimento. Na história, não há exemplos de processos de desenvolvimento que tenham prescindido de uma forte exposição externa de suas economias.
Tenho insistido que a maior inserção externa só trará bons resultados se for empreendida com muita responsabilidade e aliada a medidas que garantam um ambiente de negócios mais favorável, com a integração de políticas industriais e tecnológicas, além da remoção dos gargalos do custo Brasil.
Por fim, gostaria de fazer uma observação sobre o receio manifestado pelo ministro de que a mudança da política externa "seria um desastre" porque transformaria o setor industrial em "linha de montagem". Talvez não se tenha percebido, mas a perda de dinamismo e densidade da indústria no Brasil não é uma visão do futuro: ela já ocorreu e a ausência de conexão do país com as cadeias globais de produção é um dos seus principais determinantes.
11 de outubro de 2014
Pedro Luiz Passos, Folha de SP
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