Com famílias endividadas e numa economia em marcha lenta, já com sinais de elevação do desemprego, é arriscado apostar no êxito das medidas
O impulso recebido pela economia a partir de fins de 2008, como proteção diante do impacto recessivo do estouro da bolha imobiliária americana, teve êxito. Muito longe de ter sido uma “marolinha”, como dissera o então presidente Lula, o travamento do crédito em escala planetária, no final de 2008, jogou, por exemplo, a produção industrial brasileira no chão. As transferências de recursos ao BNDES e outros bancos estatais, somadas aos gastos públicos como um todo, amorteceram o choque. Cumpriram, portanto, seu papel “anticíclico”. Um dos resultados foi o crescimento do PIB de 2010 em fulgurantes 7,5%, ajuda providencial à campanha em que Lula elegeu Dilma como sucessora.
A partir daquele momento, veio a conhecida sucessão de erros do governo Dilma, um dos maiores deles a insistência em privilegiar o consumo como alavanca da produção, a desconsideração inicial do setor privado para acelerar investimentos imprescindíveis na infraestrutura e o descaso com a inflação.
Quatro anos depois, analistas indicam a possibilidade de o país estar no momento em leve recessão. E se o recuo na produção for revertido até dezembro, mesmo assim o PIB de 2014 não deve ultrapassar 1% de expansão. O diagnóstico unânime fora do governo é que de fato se esgotou qualquer possibilidade de a economia ser reanimada por meio do consumo das famílias. Endividadas, não há mais espaço no seu orçamento para novos créditos. Também a inflação, resistente na proximidade dos 6,5% — limite superior da meta, por leniência do Planalto —, corrói o poder aquisitivo da população, além de reduzir a confiança das pessoas em assumir novos compromissos financeiros. Enquanto isso, o Planalto não consegue ativar os investimentos, os únicos capazes de reanimar a economia de forma duradoura.
Mas o Ministério da Fazenda insiste. Depois de ter procurado turbinar o financiamento de veículos no final de julho, com a liberação de recursos do compulsório dos bancos, o governo voltou, quarta-feira, a fazer o mesmo. Agora, também com medidas bem-vindas de desburocratização nos financiamentos, incluindo o de imóveis. Os dois pacotes, o de agora e o de julho, estima-se, injetam no sistema de crédito cerca de R$ 75 bilhões. A cifra em si é elevada, mas pouco representativa dentro do bolo geral de crédito no país, próximo dos R$ 3 trilhões. Se a política econômica já tem baixa confiabilidade, a imagem dela piora com a constatação de que os estímulos ao consumo vão em direção oposta ao da política monetária: o BC, com os juros, restringe o consumo; e a Fazenda o estimula.
Diante de famílias no limite do endividamento e numa economia em marcha lenta, com sinais de elevação do desemprego, principalmente na indústria, é arriscado apostar no êxito dos pacotes. Quanto mais não fosse, as eleições e suas incertezas também ajudam a adiar decisões de consumo e investimentos.
O impulso recebido pela economia a partir de fins de 2008, como proteção diante do impacto recessivo do estouro da bolha imobiliária americana, teve êxito. Muito longe de ter sido uma “marolinha”, como dissera o então presidente Lula, o travamento do crédito em escala planetária, no final de 2008, jogou, por exemplo, a produção industrial brasileira no chão. As transferências de recursos ao BNDES e outros bancos estatais, somadas aos gastos públicos como um todo, amorteceram o choque. Cumpriram, portanto, seu papel “anticíclico”. Um dos resultados foi o crescimento do PIB de 2010 em fulgurantes 7,5%, ajuda providencial à campanha em que Lula elegeu Dilma como sucessora.
A partir daquele momento, veio a conhecida sucessão de erros do governo Dilma, um dos maiores deles a insistência em privilegiar o consumo como alavanca da produção, a desconsideração inicial do setor privado para acelerar investimentos imprescindíveis na infraestrutura e o descaso com a inflação.
Quatro anos depois, analistas indicam a possibilidade de o país estar no momento em leve recessão. E se o recuo na produção for revertido até dezembro, mesmo assim o PIB de 2014 não deve ultrapassar 1% de expansão. O diagnóstico unânime fora do governo é que de fato se esgotou qualquer possibilidade de a economia ser reanimada por meio do consumo das famílias. Endividadas, não há mais espaço no seu orçamento para novos créditos. Também a inflação, resistente na proximidade dos 6,5% — limite superior da meta, por leniência do Planalto —, corrói o poder aquisitivo da população, além de reduzir a confiança das pessoas em assumir novos compromissos financeiros. Enquanto isso, o Planalto não consegue ativar os investimentos, os únicos capazes de reanimar a economia de forma duradoura.
Mas o Ministério da Fazenda insiste. Depois de ter procurado turbinar o financiamento de veículos no final de julho, com a liberação de recursos do compulsório dos bancos, o governo voltou, quarta-feira, a fazer o mesmo. Agora, também com medidas bem-vindas de desburocratização nos financiamentos, incluindo o de imóveis. Os dois pacotes, o de agora e o de julho, estima-se, injetam no sistema de crédito cerca de R$ 75 bilhões. A cifra em si é elevada, mas pouco representativa dentro do bolo geral de crédito no país, próximo dos R$ 3 trilhões. Se a política econômica já tem baixa confiabilidade, a imagem dela piora com a constatação de que os estímulos ao consumo vão em direção oposta ao da política monetária: o BC, com os juros, restringe o consumo; e a Fazenda o estimula.
Diante de famílias no limite do endividamento e numa economia em marcha lenta, com sinais de elevação do desemprego, principalmente na indústria, é arriscado apostar no êxito dos pacotes. Quanto mais não fosse, as eleições e suas incertezas também ajudam a adiar decisões de consumo e investimentos.
24 de agosto de 2014
Editorial O Globo
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