"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 23 de agosto de 2014

"ORA PRO NOBIS"

‘Temos de votar pelos mortos por 12 anos de descaso com a saúde’

Gracias a la vida! Como em quase tudo, damos valor ao que não temos. Ou estamos perdendo. Defendemos o que merece nossa crença durante a vida. E na véspera de ir-se – como todos irão – LUTAMOS pelo que deixamos de fazer. Pela vida não vivida. Pelos valores óbvios. Pela dignidade. Pelos filhos e filhas. Pelos amigos. Pelo que se pode deixar como legado.
A visão de mundo passa a ser mais intensa. O sentimento de ser menor do que a necessidade. De ser um ponto fora de uma reta (não curva) determinada por um pensamento único.
Não é privilégio nem maldição. É a vida. Assim ela é. Só sabe quem vive, na inteira concepção da palavra.

De onde vem a verdade que nestes tempos negros passou a ser propriedade dos poderosos? Quais valores éticos são valorizados? Ódio, ameaça, ofensa, raiva e mentira passam a ser um alegre modelo de combate. Do mau combate.
Um dia o marqueteiro americano James Carville cunhou a frase célebre ─ “É a economia, idiota!” ─ para identificar o que determinaria o futuro de uma eleição.
No Brasil, é a VIDA, IDIOTA!
Tenho – contra a minha vontade, óbvio… – frequentado hospitais com uma frequência que ninguém merece. Nem escolhe. E a pior parte. Aquela que, a cada nova consulta ou internação, falta um… E ninguém ousa perguntar.
Não sou médico. Sou doente. E como tal entendo a saúde pública no Brasil de modo mais intenso que um médico cubano ou paciente do Sírio Libanês.
Empresários que exploram planos de saúde privados são hoje mandatários da ANS e determinam valores irrisórios pagos a médicos e custos nunca cobertos nos hospitais. A saúde privada desceu ao patamar da pública, em acelerada marcha. As filas são as mesmas, a insatisfação do corpo médico idem. E o governo anuncia avanços na área que Lula acha perto da perfeição.  Seria risível se não fosse ofensivo. E macabro. O resultado é uma sepultura. Adiada para os eleitos. Antecipada para todo o resto: nós.
São doze anos de descaso com a saúde. De não formação de médicos. De sucateamento dos hospitais e centros especializados. De uso da saúde privada como alternativa vulgar do que é obrigação do estado, até o ponto de acabar com ela.
Tenho pressa. Todos deveriam ter. A vida é breve e passa muito rápido.
O uso criminoso de gangues que dominam ministérios e agências de saúde ha doze anos provocou quantas mortes que poderiam ser ao menos adiadas? Querem um inventário pessoal? Básico, particular e real.
Alguns exemplos bastam. Doutor Rebelo, um português, agonizou por 15 dias com um câncer cerebral à espera de ANESTESIA para ser operado. Morreu antes.
Zé Augusto  precisava de interferon. A Receita Federal impediu a entrada do medicamento numa das operações de rotina. Morreu 25 dias depois por septicemia derivada de um câncer de rim.
A dona Aninha, uma senhorinha que pedia para morrer, faltava morfina. Um amigo médico contrabandeou a droga para o hospital. E ela teve os últimos 5 dias de paz e sonhos até partir.
Palito, menino de rua com câncer de pele, cheirava mal. Não havia vaga na UTI. Morreu no corredor. Em cima de uma maca. Aos 15 anos.
Seu João, o padeiro, descobriu que tinha câncer numa consulta. Morreu 18 dias depois de internado. Era ainda o quinto da fila para atendimento.
A bela Analice extirpou o câncer de mama. A recidiva ocorreu três meses depois. Não havia vaga na UTI. Morreu em casa em consequência da metástase devastadora.
Vi médicos com olhos vermelhos nos corredores. Causa: bebida, maconha ou choro. Por dor. Por não desistirem da luta. Por terem escolhido a profissão certa no país errado. Por tentarem ser fortes. Os olhos, que nunca mentem, denunciavam a revolta, a humilhação, a comiseração.
Esse é o Brasil que quero deixar no passado. Que após 12 anos reduziu TUDO (saúde pública ou privada) a um padrão africano.
Tenho pressa. O Brasil deveria ter. Em nome de tantos que em 5 de outubro não irão votar.
Morreram antes.

23 de agosto de 2014
Reynaldo Rocha

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