Enquanto recebia um agrado da presidente Dilma, o setor produtivo enfrentava ontem outra paulada para a qual o governo ainda não tem curativo.
O agrado foi o pacote de bondades destinado às empresas. Mais prazo e melhores condições para o pagamento de dívidas com a Receita Federal (o Refis) e ampliação do prazo do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que dá mais acesso à compra de máquinas, caminhões, tratores, etc. Sua natureza é eleitoral, mas sua principal característica foi a improvisação. Nem o ministro da Fazenda, Guido Mantega, estava ontem em condições de fornecer pormenores sobre essas decisões.
Poderá reduzir certos custos, mas, por ser limitado e temporário, não parece capaz de levar as empresas a investir com força no aumento da produção e da produtividade.
A paulada é o agravamento da crise cambial da Argentina. Como comentado ontem nesta Coluna, a Suprema Corte dos Estados Unidos exigiu que a Argentina pague integralmente os títulos de dívida cujos portadores não aceitaram os termos da reestruturação imposta a partir de 2001.
É grande a probabilidade de que esse benefício, no todo ou em parte, se torne extensivo até mesmo àqueles que aceitaram o desconto (calote) de aproximadamente 70%. Nessas condições, a Argentina poderá ficar impossibilitada de honrar compromissos, não só com seu passivo de longo prazo, mas até mesmo com o pagamento de suas importações.
Do ponto de vista da indústria brasileira, a questão é que a Argentina absorve nada menos que 8% das exportações do Brasil (US$ 19,6 bilhões em 2013) e 12% da produção brasileira de veículos.
Nenhuma das soluções aventadas para o problema comercial com a Argentina, que já se vinha arrastando antes mesmo do revés imposto segunda-feira pela Suprema Corte dos Estados Unidos, se mostrou viável. Uma delas pretendeu levar os bancos brasileiros a financiar as exportações do Brasil para lá. Ou seja, passariam o pagamento para os exportadores brasileiros e ficariam credores da Argentina. Para isso, seria necessário que o Banco Central assumisse o risco cambial, ou seja, aceitasse ser fiador desses recebíveis. Essa opção foi rejeitada porque, na condição de corresponsável, o Banco Central do Brasil estaria sujeito a sequestros de ativos argentinos em seu poder pelos credores que agora têm mandado judicial para isso.
Outra ideia é usar o Fundo de Garantia à Exportação (FGE) para dar cobertura a eventuais faltas de pagamentos de importações pela Argentina. É uma saída que exigiria cobertura do Banco da República Argentina e, por isso, aumento da dívida entre Estados soberanos (Clube de Paris), portanto considerada de pagamento prioritário, cláusula que o governo argentino se recusou a aceitar.
Uma terceira hipótese seria o aumento das importações de produtos argentinos pelo Brasil, de modo a zerar o superávit que no ano passado foi de US$ 3 bilhões. O problema aí está em que os produtos que o Brasil poderia importar mais da Argentina seriam veículos e autopeças. Nesse caso, a crise do setor no Brasil se agravaria.
É verdade que a Argentina ainda pode ganhar algum tempo e alguma margem de negociação. Mas o nível de incerteza aumentou dramaticamente para ela e para seus parceiros comerciais.
O agrado foi o pacote de bondades destinado às empresas. Mais prazo e melhores condições para o pagamento de dívidas com a Receita Federal (o Refis) e ampliação do prazo do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que dá mais acesso à compra de máquinas, caminhões, tratores, etc. Sua natureza é eleitoral, mas sua principal característica foi a improvisação. Nem o ministro da Fazenda, Guido Mantega, estava ontem em condições de fornecer pormenores sobre essas decisões.
Poderá reduzir certos custos, mas, por ser limitado e temporário, não parece capaz de levar as empresas a investir com força no aumento da produção e da produtividade.
A paulada é o agravamento da crise cambial da Argentina. Como comentado ontem nesta Coluna, a Suprema Corte dos Estados Unidos exigiu que a Argentina pague integralmente os títulos de dívida cujos portadores não aceitaram os termos da reestruturação imposta a partir de 2001.
É grande a probabilidade de que esse benefício, no todo ou em parte, se torne extensivo até mesmo àqueles que aceitaram o desconto (calote) de aproximadamente 70%. Nessas condições, a Argentina poderá ficar impossibilitada de honrar compromissos, não só com seu passivo de longo prazo, mas até mesmo com o pagamento de suas importações.
Do ponto de vista da indústria brasileira, a questão é que a Argentina absorve nada menos que 8% das exportações do Brasil (US$ 19,6 bilhões em 2013) e 12% da produção brasileira de veículos.
Nenhuma das soluções aventadas para o problema comercial com a Argentina, que já se vinha arrastando antes mesmo do revés imposto segunda-feira pela Suprema Corte dos Estados Unidos, se mostrou viável. Uma delas pretendeu levar os bancos brasileiros a financiar as exportações do Brasil para lá. Ou seja, passariam o pagamento para os exportadores brasileiros e ficariam credores da Argentina. Para isso, seria necessário que o Banco Central assumisse o risco cambial, ou seja, aceitasse ser fiador desses recebíveis. Essa opção foi rejeitada porque, na condição de corresponsável, o Banco Central do Brasil estaria sujeito a sequestros de ativos argentinos em seu poder pelos credores que agora têm mandado judicial para isso.
Outra ideia é usar o Fundo de Garantia à Exportação (FGE) para dar cobertura a eventuais faltas de pagamentos de importações pela Argentina. É uma saída que exigiria cobertura do Banco da República Argentina e, por isso, aumento da dívida entre Estados soberanos (Clube de Paris), portanto considerada de pagamento prioritário, cláusula que o governo argentino se recusou a aceitar.
Uma terceira hipótese seria o aumento das importações de produtos argentinos pelo Brasil, de modo a zerar o superávit que no ano passado foi de US$ 3 bilhões. O problema aí está em que os produtos que o Brasil poderia importar mais da Argentina seriam veículos e autopeças. Nesse caso, a crise do setor no Brasil se agravaria.
É verdade que a Argentina ainda pode ganhar algum tempo e alguma margem de negociação. Mas o nível de incerteza aumentou dramaticamente para ela e para seus parceiros comerciais.
19 de junho de 2014
Celso Ming, O Estadão
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