Cícero, na primeira Catilinária contra a corrupção de seus contemporâneos, exclamou: ó, tempora, ó, mores! O mesmo podemos dizer do nosso Brasil de hoje: gente pobre, se comete um deslize furtando uma galinha ou um galo, é para comer, nunca para formar aviário. Já alguns sem-vergonha e ladrões roubam é Petrobras. Outros, remediados e ricos, políticos e velhacos, afanam tudo, principalmente dinheiro público, fazendo fortunas. Ó, tempos, ó, costumes!
Imagine essa situação, caro leitor: Afanásio Maximiniano Guimarães afanou um galo e uma galinha do galinheiro de Raimundo das Graças Miranda. A Defensoria Pública requereu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais a extinção do processo, uma vez que o acusado devolvera os animais (presumo que o dito cujo tenha sido condenado na 1ª instância).
Se o perigoso assaltante de galinhas tivesse tido tempo para devorar os bichos, certamente que a defesa apelaria para o chamado furto famélico, situação em que se subtrai algo para comer e não morrer de fome.
Ou não, porque os políticos de Brasília e aqueles que comem quietos, como mensaleiros e fanáticos interessados na Petrobras e outras fontes luminosas como Copa e Olimpíadas, já desmoralizaram esse tipo de crime e, provavelmente, já pensaram em todas as maneiras de como sair incólume dessas aventuras, depois das ditas efemérides.
Mas, voltando ao tema do furto de galinhas, presumo eu que existiu outro pedido da defesa, em caráter liminar, quanto à aplicação do princípio da insignificância, e o assunto foi parar no Supremo.
O ministro relator, Luiz Fux, ao analisar o caso, decidiu aguardar o julgamento do mérito do pedido para depois decidir a questão em definitivo.
É… um país cujos principais juízes se preocupam na mais alta Corte com galos e galinhas e não conhecem de Renans e Roses, escondidos que vivem debaixo dos caracóis dos seus cabelos e perucas, não podem ter mesmo tempo para mandar prender ladrões de casacas que abundam e que agem abertamente para desmoralizar nossas instituições e quebrar, no sentido de arrebentar, nosso país.
Não sei quem foi o iluminado que um dia descobriu o termo “hediondo” e, achando-o bonito, resolveu enquadrar tudo quanto é desgraça nesse título para substituir nosso Código Penal, fazendo até furto de galinha ser crime hediondo. Ladrão de galinhas não pode ser o mesmo que ladrão de Petrobras.
A lei não pode ser oito ou 80. Quer dizer que eu, que sou apenas um cidadão comum, se furtar uma galinha para comer serei julgado por crime hediondo e terei julgamento igual a esses ladrões sócios de doleiros? Furto é uma coisa, roubo é outra. Ó, quer saber? Eu e muita gente só vamos esperar a primeira parada desse trem brasileiro. Ainda que não tenha chegado a lugar algum, quero descer e só subirei de volta quando desratizarem o ambiente pátrio.
17 de abril de 2014
Sylo Costa
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