"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

"MANIF POR TOUS" E A IDEOLOGIA DE GÊNERO NO DECADENTE ENSINO PÚBLICO FRANCÊS

                       
          Internacional - Europa        

Não existe uma teoria válida de gênero, mas uma pseudociência fraudulenta, que envolve atos criminosos como aqueles praticados por John Money no “experimento Reimer”.

Não obstante, há uma ideologia de gênero que serve a propósitos estratégicos de engenharia social.


O “ABCD de l’egalité” [“ABCD da Igualdade”] foi lançado oficialmente na França em 13 de janeiro por Vincent Peillon e Najat Vallaud-Bellkacem. Peillon é ministro da Educação Nacional do governo François Hollande; Bellkacem, uma socialista franco-marroquina, apontada em maio de 2012 como titular da pasta dos Direitos da Mulher.

Mas em que consiste o programa? Segundo o sítio oficial do “ABCD” (1), preocupações básicas com a relação entre os garotos e garotas na escola devem permear as políticas públicas, ou seja:
“(...) transmitir valores de igualdade e respeito entre as garotas e garotos, mulheres e homens, é uma das missões essenciais da escola, fundamento do desempenho de todos os alunos, garotas e garotas.

“Com efeito, as desigualdades de tratamento, de desempenho escolar, de orientação e carreira profissional continuam muito reais entre garotas e garotos. As práticas ordinárias em classe constituem-se em fenômenos frequentemente sexuados, sem que os ensinamentos, o conjunto dos atores da educação, os alunos e suas famílias tenham disso consciência. Para os alunos, interagir em par, partilhar espaços e atividades; para o ensino, conceder a palavra, avaliar, sancionar ou recompensar, orientar, obedecer às representações mais frequentemente implícitas sobre as competências de uns e outros. Estas representações, que fomentam frequentemente prejuízos e estereótipos profundamente arraigados, podem ser a fonte direta de discriminações”.

Os fins declarados pelo Elysée são aparentemente, nobres, “pedagógicos” por assim dizer. Mas não são vistos assim por boa parte da população francesa. Na realidade, o que tanto o povo quanto alguns intelectuais temem é que a luta contra estereótipos quiméricos ou reais nas escolas venha a se traduzir em algo como uma nova etapa de “conscientização sobre gênero”, sinônimo de desestruturação familiar e de aprofundamento do nível de degradação do ensino fundamental, já tão debilitado por décadas de inconsequência pedagógica e medidas ineficazes.

A repulsa à ideologia do gênero tomou impulso quando da aprovação da lei que autoriza o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo em maio de 2013, estendendo o alcance do “Pacto Civil de Solidariedade” introduzido em 1999 por Lionel Jospin. Ela voltou a ganhar fôlego este ano, com boicotes em escolas primárias (algumas registraram 40% de ausência em janeiro) e a “Manif pour tous” [“Manifestação para todos”], em dois de fevereiro, que contou com cerca de 500 mil manifestantes em Paris e 40 mil em Lyon segundo seus organizadores (2).

A primeira edição da “Manif” nos primeiros três meses de 2013 foi uma reação ao “Mariage pour tous” [“Matrimônio para todos”, a lei do “casamento gay”], tendo entre suas organizadoras personalidades como a polivalente Frigide Barjot (pseudônimo de Virginnie Tellenne). Mesmo empunhando um “espantalho de reivindicações” (como o descreve Phillipe Euzen, do “Le Monde”), o fenômeno gravita em torno de uma ideia-núcleo (o repúdio à doutrinação político-ideológica nas escolas), indicando que, para a pátria de Joana D’Arc, a aceitação de pressupostos que contrariam o bom senso milenar está distante de qualquer unanimidade.

Por seu turno, a “Journée de retrait de l’école” [“Jornada da retirada da escola”] - proposta por Farida Belghoul (que conta com o apoio do instituto católico Civitas) – relaciona-se diretamente com a implementação do programa “ABCD”. O que está em jogo para sua idealizadora é a disseminação do ideário de gênero, favorecida pelo esgotamento do sistema educacional.
Notável expoente da geração “Beur” (descendentes de imigrantes no norte da África), Belghoul foi militante antirracismo nos anos 80; cineasta, escritora e entusiasta da “l’école à la maison” [“escola em casa”] e suas variações.
Em política, no entanto, tem atuação controvertida (como sua aliança com Alain Soral, ex-comunista, ex-membro do “Front Nacional” e autodenominado “nacional-socialista à francesa”). Porém, suas noções dos riscos em curso são lúcidas e refletem a atordoante percepção do dano causado pelos burocratas de esquerda.

Ela sustenta que no programa “(...) a teoria de gênero avança em nome da igualdade. Ela é antes uma ideologia que uma teoria. Esta ideologia se imiscui nos programas escolares de maneira extremamente perniciosa e com feição mascarada, por trás da igualdade” (3). E acrescenta:

“Feministas radicais como Judith Butler e todos os membros de um lobby influente que é o lobby LGBT (Lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros), são bastante influentes no sentido de que ela [a teoria de gênero] se torne uma prioridade nacional de educação nacional nos programas escolares. Mesmo tendo altas taxas de analfabetismo, mais e mais marcantes nas escolas, e não somente nos bairros populares, também nas camadas médias” (3).

As intervenções propostas pelo gabinete de Hollande condizem com o espírito da “nova pedagogia” à base da substituição do ensino cognitivo pela aprendizagem da “vida social” (4). Os mesmos jovens selecionados como seu “público-alvo” - e que irão receber cândidas lições de gênero e sexualidade - são precisamente aqueles que:

“(...) têm notadamente sido as vítimas de métodos pedagógicos fundados sobre a construção do “saber pelo aluno”. Em linguagem clara, isto quer dizer que na classe (na escola também com seus deveres) eles deverão se debruçar por si sós sobre os saberes de suporte que lhes damos. Este tipo de ensino é fundado sobre o implícito, o alusivo e o dedutivo. Os pais o ignoram e imaginam que seu filho não é capaz, quando ele não alcança sucesso. Na verdade, é muito difícil para um espírito em formação, a fortiori, uma criança, aprender o que quer que seja desta maneira. Por isso a confusão se instala. E com ela o abandono escolar, o caos” (5).

A máquina governamental e a mídia vêm respondendo com rancor as denúncias dos grupos opositores ao “ABCD”. Para defendê-lo, “L´express” convocou o próprio ministro Peillou, para quem tudo “isto é absolutamente falso” e “não há ensinamento da teoria de gênero na escola mas uma educação sobre a igualdade moça-garoto” (6).
A desgastada tática de assinalar como posicionamentos de “extrema direita” a objeção de grupos pró-família às manobras socialistas é repetida nos seguintes termos pela BBC:
Especialistas ressaltam que não existe uma "teoria do gênero" e sim os estudos sobre gênero (gender studies), iniciados nos Estados Unidos nos anos 60 e 70, que analisam a construção social da identidade sexual e a questão das desigualdades entre homens e mulheres.

O ministro da Educação, Vincent Peillon, declarou que o ministério "rejeita totalmente a teoria do gênero e a instrumentalização feita por pessoas da extrema direita, que estão difundindo uma ideia que causa medo aos pais de alunos" (7)

Decerto não existe uma teoria válida de gênero, mas uma pseudociência fraudulenta, que envolve atos criminosos como aqueles praticados por John Money no “experimento Reimer” (8). Não obstante, há uma ideologia de gênero que serve a propósitos estratégicos de engenharia social. Contra ela – e a despeito do alarido esquerdista - a retaliação ao “ABCD” prossegue exitosa. A crescente mobilização contra a agenda Peillon-Belkacem (e a “Manif pour tous”) revela outro fenômeno na esfera pública, ainda mais importante: a gradual cristalização de forças políticas que, em meio a bruscos solavancos e entrechoques - como convém aos processos históricos – poderá resultar no surgimento de um bloco coerente de princípios, apto a se contrapor aos inimigos da família, da educação e da cultura.

05 de fevereiro de 2014
Creomar Baptista

Notas:

(1) Disponível em: http://www.cndp.fr/ABCD-de-l-egalite/a-propos.html - Acesso em: 02 de fevereiro de 2014.
(2) Disponível em: http://www.lemonde.fr/politique/article/2014/02/02/manif-pour-tous-a-paris-un-defile-contre-l-ideologie-destructrice-des-ministres_4358591_823448.html - Acesso em: 02 de fevereiro de 2014
(3) Disponível em: http://www.zamanfrance.fr/article/farida-belghoul-theorie-genre-avance-a-visage-masque-derriere-legalite-7457.html - Acesso em: 02 de fevereiro de 2014
(4) BERNARDIM, Pascal. Maquiavel pedagogo ou o ministério da reforma psicológica. Campinas: Eclesiae/Vide Editorial, 2013.
(5) Disponível em: http://blog.reid.fr/pages/entretienFaridaBelghoul - Acesso em: 02 de fevereiro de 2014
(6) Disponível em: http://www.lexpress.fr/actualite/societe/l-abcd-de-l-egalite-pas-du-genre-a-plaire-a-tous-les-parents_1318095.html - Acesso em: 03 de fevereiro de 2014
(7)
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/01/140129_franca_escolas_igualdade_genero_df_cc.shtml - Acesso em: 03 de fevereiro de 2014

 

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