Em seu quarto ano de governo a presidente Dilma Rousseff colherá o resultado de equívocos plantados nos três anos anteriores e também no mandato de seu antecessor, como os custos financeiros, administrativos e políticos de uma caríssima Copa do Mundo, inoportuna, mal planejada e mal preparada.
O pior desempenho da Bovespa desde 1995, quando o índice caiu 10,77%, é um bom marco inicial de um roteiro com muitos obstáculos e armadilhas.
Os principais problemas externos foram previstos com folga suficiente para um governo sensato se prevenir. A redução gradual dos estímulos monetários americanos foi anunciada no primeiro semestre do ano passado. As tensões nos mercados surgiram logo em seguida, mas o Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, só começou a executar o programa no mês passado.
A acomodação da economia chinesa começou há mais de um ano. O crescimento deve ainda manter-se em torno de 7,5%, um resultado notável, mas a desaceleração tende a afetar os mercados de commodities e os países mais dependentes de exportações de produtos básicos para a China. É esse, obviamente, o caso do Brasil. Além do mais, há uma ampla perspectiva de desempenho mais fraco dos emergentes.
A combinação de todos esses fatores já interfere na movimentação internacional de capitais. Na última semana de janeiro US$ 6,3 bilhões foram retirados de carteiras de renda variável de países emergentes, segundo relatório do banco Morgan Stanley.
Considerados os valores absolutos, a quarta maior perda, US$ 610 milhões, foi a das carteiras de ações brasileiras. Os três maiores perdedores, por esse critério, foram a Coreia, a China e a Rússia.
Em termos proporcionais, isto é, em relação ao volume investido, os mais atingidos foram o México, o Chile e a Indonésia.
Na corrida inicial, os fundamentos econômicos e a confiabilidade de cada país podem fazer pouca diferença. Não tem sentido, nesse caso, falar de justiça ou injustiça. O mais importante para o aplicador, no momento de susto, é sacar o dinheiro e transferi-lo para aplicações consideradas mais seguras.
São principalmente ativos em dólares. Mas os países mais preparados para absorver choques tendem a se destacar, depois dos primeiros impactos, e a levar vantagem na disputa pelos capitais.
O Brasil, neste momento, está em desvantagem pelos dois critérios, o preparo para choques e a credibilidade necessária para o retorno ao mercado. Permanece o risco de rebaixamento de sua nota por agências de avaliação de crédito.
Consultores e especialistas do setor financeiro em geral conhecem os fundamentos econômicos do Brasil. Sabem o suficiente para distinguir a situação brasileira da desastrosa posição de países como a Argentina e a Venezuela, mas em outras comparações a imagem do Brasil é bem menos atraente.
A resistência brasileira a choques externos depende exclusivamente do volume de reservas, US$ 375,76 bilhões em 30 de janeiro. A acumulação de moeda forte foi um dos principais e raros acertos dos últimos anos. Os demais indicadores denunciam vulnerabilidades.
O resultado fiscal do ano passado, o superávit primário de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), o menor em 11 anos, só foi alcançado com receitas extraordinárias. A inflação continua bem acima da meta de 4,5%.
O clássico ajuste por meio da desvalorização cambial envolverá, portanto, riscos consideráveis em relação ao nível geral de preços. A produção manufatureira pouco avançou no ano passado e a indústria continua despreparada para a competição internacional.
O comércio exterior será novamente uma das áreas mais vulneráveis. Se tiver algum realismo, a presidente Dilma Rousseff tentará criar no mercado alguma expectativa de mudança. Se falhar, o mau desempenho da bolsa será a consequência menos grave.
05 de fevereiro de 2014
Editorial O Estado de São Paulo
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