"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

RELIGIÃO, FICÇÃO OU REALIDADE?

Um número não desprezível de pessoas acredita na infalibilidade do papa

O papa disse que o inferno não existe.

Há duas formas de tratar a religião. Podemos vê-la como um discurso puramente alegórico —isto é, sem maiores preocupações em retratar o mundo real (como a série “O Mecanismo”). 

Nesse plano, abrir o mar Vermelho (Êx. 14:21-28), parar o movimento do Sol (Josué 10:12-14) e falar em concepção imaculada, ressurreições e alma não representam um desafio cognitivo.

Eu diria até que essa religiosidade pode ser saudável. Aquilo que se assume desde sempre como ficção raramente dá margem a fundamentalismos e à violência a eles associada. 


No mais, frequentar igrejas oferece ao fiel a possibilidade de inventar propósitos para a sua vida, além de oportunidades de interação social, o que é bom para a saúde.

O outro modo de encarar a religião é dar crédito às afirmações dos textos sagrados e de sacerdotes e tratá-las como hipóteses testáveis sobre o mundo. Aí, pouco do que dizem para em pé. Afinal, não dá para suspender a rotação da Terra sem arrasar o planeta; seres humanos não se reproduzem por partenogênese; e inexiste modelo físico pelo qual uma alma imaterial possa interagir com um corpo feito de matéria bariônica.

O fiel pode, é claro, escolher ficar com a religião mesmo que ela vá contra a física, a química, a biologia, a estatística. 
Um número não desprezível de pessoas acredita na infalibilidade do papa e na inerrância das Escrituras. Mas deve ser cognitivamente frustrante viver num mundo em que a ciência entrega seus produtos (antibióticos, fornos de micro-ondas etc.) e a religião se esconde confortavelmente atrás de uma mercadoria que só pode ser despachada quando o comprador já não estiver aqui para assinar o recibo.

Espero que o Vaticano não precise de mais 2.000 anos para concluir que o paraíso e todo aquele papo de salvação eterna são tão simbólicos quanto o inferno, que não existe.


06 de abril de 2018
Hélio Schwartsman, Folha de SP

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