"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

PATRULHEIROS DA MORAL CRIAM TRIBUNAIS PARA DECIDIR QUEM PODE ANDAR NAS RUAS

"Cagão" e "bosta" foram algumas das delicadezas dirigidas a Gilmar Mendes em um voo no sábado (27). Dias antes, duas mulheres haviam apupado o ministro do STF em Portugal. Uma delas disse rogar para que Deus o enviasse sem escalas ao quinto dos infernos.

Tudo registrado em vídeo por celulares e espalhado nas redes sociais.

Atos assim falam mais sobre quem se presta a eles do que qualquer outra coisa. O alvo dos autointitulados "cidadãos de bem" é pego quase sempre só, tal um colegial paga-lanches assolado na hora do recreio.

Essa turma de patriotas já decidiu no seu tribunal particular e inapelável quem pode embarcar em voos comerciais ou jantar em restaurantes.

Dane-se o contraditório, quem pensa diferente, o Estado de direito, as leis, as formas mais dignas e menos covardes de protesto. Em suma, danem-se as instituições democráticas –essas porcarias todas que "deveriam ser fechadas" porque não "prestam pra nada", nas palavras de um dos bravateiros do voo de Gilmar.

Nem é preciso dizer que muita gente que arrota moral e bons costumes nas redes sociais não suportaria 15 minutos de escrutínio sério da própria vida. Nem que toda a bravura surge, normalmente, quando estão em bando, contra oponente preferivelmente solitário. Nem que boa parte deseja, na verdade, é a volta de generais a nos ditar goela abaixo o que fazer ou deixar de fazer.

A história está repleta de vestais a atirar pedras nas adúlteras, tocar fogo às "bruxas" ou decidir no berro quem pode ou não andar nas ruas.

Gilmar Mendes mandou soltar alvos da Justiça contra as quais pesam sérias acusações, entre eles empresário com quem tem laço familiar. Tem questionável relação com o governo, com encontros a portas fechadas inimagináveis a um magistrado com pudor institucional. E uma série de outras práticas controversas.


Nada disso, porém, justifica o grotesco teatro encenado pelos talibãs da moral, família e bons costumes


30 de janeiro de 2018
Ramier Bragon, Folha de SP

NOTA AO PÉ DO TEXTO

Um texto equivocado, ao desconsiderar o cansaço de uma sociedade diante da grosseira insensibilidade de um Congresso que está de costas para a nação. Pior: dá um título 'perigoso' ao repúdio de cidadãos que já não suportam mais assistir a complacência com o crime de parlamentares que apenas usufruem de absurdas mordomias. Envergonha-nos a cumplicidade, a omissão, o silêncio diante da esbórnia com o dinheiro dos contribuintes, além do desrespeito aos mínimos direitos da sociedade, da nação.
É notória a leniência do STF com os indiciados na Lava Jato, e que pela excrescência desse tal 'forum privilegiado' mostra ao país a democracia em que vivemos.
Até hoje, o STF não condenou ninguém. Interessante que o autor do texto aponta um dos atos de Gilmar Mendes, quando mandou soltar 'alvos da justiça' contra os quais pesam graves acusações.
Dá o ar de pouca importância a tal fato. O que tem isso demais? Afinal, ele tem o poder da toga, e dane-se o resto.
Com sarcasmo, denuncia a tal 'muita gente' que 'arrota e bons costumes nas redes sociais', sem se dar conta de que essa 'tal gente de bons costumes' não afeta a organização social do país, nem fere o princípio do direito democrático, nem o princípio da lei.
São cidadãos comuns que se indignam com o poder monocrático de alguns que compõem o caldo de uma cultura moldada pelo desastroso quadro político que destroça essa República.
São cidadãos cansados e cujo único direito é de espernear e gritar contra os que afrontam a sua cidadania. 
É perigoso intitular de 'patrulheiros da moral' a reação natural de cobrar o respeito daqueles que têm a obrigação de preservar a Lei e a democracia.
m.americo

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